Urbanismo

Rio Beberibe agoniza sem obra de revitalização

Projeto de drenagem e retirada de palafitas das margens do curso d'água está parado e sem prazo de conclusão

Do JC Online
Cadastrado por
Do JC Online
Publicado em 29/10/2015 às 7:02
Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
FOTO: Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Leitura:

O projeto era grandioso. Contemplava a retirada de 28 mil famílias ao longo de 13 quilômetros das duas margens do Rio Beberibe e do Rio Morno, nos municípios do Recife e de Olinda. Previa a dragagem e o alargamento do curso d´água para implantação de novas vias. Tinha o selo do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal. Foi inaugurado com pompa, em maio de 2012, pelo então governador Eduardo Campos, em uma cerimônia realizada à beira do rio. Três anos depois, o PAC Beberibe é apenas mais uma obra que ficou pelo caminho e que o poder público não consegue, sob o impacto da maior crise financeira da história recente do País, tirar do lugar onde ela empacou.

Oficialmente, de acordo com o governo do Estado, a dragagem do rio foi concluída. Mas ela só é perceptível em um trecho de aproximadamente dois quilômetros entre os bairros de Salgadinho, em Olinda, e Campina do Barreto, no Recife. O mato alto e os escombros das casas que foram removidas nas margens dão a exata dimensão de como o tempo passou e a obra não evoluiu. A montanha de areia retirada do fundo do rio também continua na área da Marinha do Brasil em frente à Praia Del Chifre, em Salgadinho, Olinda. Com um detalhe: a areia é altamente contaminada pelos resíduos do rio.

Os mais prejudicados? Os de sempre. Na área do Beberibe, quem sofre é a população ribeirinha, que nutriu a esperança de sair de dentro da lama e ir para um lugar mais digno. Em março deste ano, em uma reportagem sobre o andamento das obras, o JC encontrou a faxineira Eulina Tenório morando em uma palafita construída, engenhosa e perigosamente, em cima do rio, no bairro de Beberibe, na Zona Norte do Recife. Sete meses depois, ela continua no mesmo lugar, e cada vez mais descrente de que conseguirá levar os dois filhos para uma moradia decente. “Desde que essa obra começou a gente só ouve conversa. Já recebi até uma documentação da prefeitura, como se eu tivesse preferência para ir morar em algum dos habitacionais, mas não adiantou de nada”. A batalha diária de Eulina e dos dois filhos, de 14 e 12 anos, para se equilibrar sobre as tábuas mal-arrumadas da casa não tem previsão para terminar.

Outra pessoa ouvida na mesma reportagem de março também foi localizada. A doméstica Maria José da Conceição continua vivendo com os pés dentro do rio e em companhia nem um pouco recomendável. “Não posso nem pensar em deixar comida em um lugar que não seja dentro da geladeira, pois os ratos chegam rapidinho para pegar o que tiver. Sobem pelo fogão e pela mesa, é assustador”, diz, relatando que uma vizinha tem uma filha cadeirante, o que torna as saídas da garota praticamente impossíveis. “Quando ela precisa de atendimento médico, a gente tem que mobilizar várias pessoas para que ela saia de casa.”

À medida que se avança em direção à nascente do Beberibe, no município de Camaragibe, o rio vai estreitando e a grande quantidade de moradias irregulares nas duas margens dá a dimensão do trabalho que as prefeituras do Recife e de Olinda ainda têm pela frente. O projeto inicial do PAC Beberibe previa a construção de 12 habitacionais, num total de 1.692 moradias.

Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Leito do rio está assoreado, mas o Estado afirma que já drenou o rio - Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Pontilhão improvisado de pedestres liga os dois lados do rio - Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Mato e lama obstruem o leito do rio - Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
O acúmulo de lixo nas margens é outro problema - Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
No lado do Recife, várias casas já foram demolidas. Mas as obras de requalificação empancaram - Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Casas continuam sendo demolidas para construção de uma avenida beira-rio no lado do Recife - Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Casas continuam sendo demolidas para construção de uma avenida beira-rio no lado do Recife - Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
O rio está poluído e assoreado - Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
O rio, em alguns trechos, mais parece um canal - Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem
Palafitas resistem em ambos os lados do rio, no Recife e em Olinda - Foto: Sérgio Bernardo/JC Imagem

Segundo a Prefeitura do Recife, três conjuntos foram entregues, para um total de 488 famílias. Outras 70 unidades habitacionais, relativas aos conjuntos de Dois Unidos e Porto da Madeira, deverão ser entregues até o final do ano. As obras dos conjuntos da Linha do Tiro e da Campina do Barreto, na Zona Norte, estão paralisadas desde o final de 2014. De acordo com a prefeitura, as obras do habitacional da Campina do Barreto serão retomadas no mês de novembro. Já o conjunto de 224 apartamentos que está sendo construído na Linha do Tiro só ficará pronto em 2016. Outros habitacionais do programa, como os de Água Fria e Porto da Madeira, também serão entregues apenas no ano que vem.

DRAGAGEM CONCLUÍDA, SEGUNDO GOVERNO 

A Secretaria de Desenvolvimento Econômico do governo do Estado informou que o projeto de renaturalização do Rio Beberibe teve sua etapa de dragagem concluída. Originalmente, seriam retirados 700 mil metros cúbicos de areia da calha do rio, mas o valor final foi de 1,5 milhão. A última dragagem do rio foi realizada em 1982.

Ainda segundo a secretaria, o serviço atual alcançou mais de 95% da extensão prevista, entre desassoreamento e alargamento da calha, para dar maior vazão ao fluxo da águas. O valor investido nessa etapa foi de R$ 63 milhões, com recursos do PAC Dragagem.

Entre os pontos positivos da obra destacados pelo governo está a proteção contra inundações causadas pelas chuvas. Uma das reclamações mais comuns dos moradores é a perda de objetos e muitas vezes das próprias moradias no período do inverno.

Ainda de acordo com o órgão, será preciso uma nova licitação para finalizar a obra do PAC Beberibe, o que levará em conta as famílias que ainda ficaram na área ribeirinha. A secretaria afirma que está estudando propostas para a destinação dos resíduos da dragagem do rio, mas que ainda não há previsão para o início do processo.

“A maior parte dos resíduos, composta por areias e argilas retiradas do rio, já secas, deverá ser aplicada em ações nobres como aterro e revitalização de outras áreas. Já a parcela que exige descarte será destinada a aterros”, diz, em nota, a assessoria da secretaria de Desenvolvimento Econômico.


Últimas notícias