BALANÇO

Fernando Pessoa e a língua portuguesa foram protagonistas da Fliporto 2015

Evento teve boas conversas, mas alguns debates foram mornos. Estimativa de público ainda não foi divulgada

Diogo Guedes
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Diogo Guedes
Publicado em 16/11/2015 às 5:18
Fliporto/Divulgação
Evento teve boas conversas, mas alguns debates foram mornos. Estimativa de público ainda não foi divulgada - FOTO: Fliporto/Divulgação
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Depois de três dias de debates, a Festa Literária Internacional de Pernambuco encerrou na domingo (15/11) a sua 11ª edição. Compacto, com um formato reduzido por conta da dificuldade de captar recursos e apoiadores, o evento reuniu bons debates, ainda que algumas vezes mornos, sobre a obra do homenageado, Fernando Pessoa, e a língua portuguesa. Entre os destaque da programação, estiveram a abertura, com a sobrinha de Fernando Pessoa, a escritora Manuela Nogueira, e a conversa entre o escritor catalão Javier Cercas e o jornalista brasileiro Eric Nepomuceno.

Um bom público compareceu à maioria das mesas, mas quase nenhuma delas ficou completamente tomada. Além disso, mesmo com um orçamento igual ao de 2014, cerca de R$ 1,1 milhão, a Fliporto contou com um dia a menos de programação. Ao contrário de anos anteriores, a organização da festa literária não divulgou no domingo a sua estimativa de público.

“Acredito que a Fliporto se consolidou na sua 11ª edição. O formato compacto, dentro do Colégio São Bento, foi importante. Dentro do momento (econômico) atual, garantimos a continuidade e a resistência do evento”, comentou Antonio Campos, presidente do conselho cultural da feira. Segundo ele, o tema e o homenageado da próxima edição devem ser anunciados em fevereiro de 2016, logo após o Carnaval.

As mesas do congresso principal da Fliporto deste ano, salvo honrosas exceções, podem ser resumidas em dois temas: a obra de Fernando Pessoa e, numa só visão, a cultura lusitana e a língua portuguesa. Com uma larga presença de pesquisadores e escritores de Portugal, a festa tornou-se uma celebração da relação com o país europeu. Assim, o poeta que foi “dramaturgo de si mesmo”, como apontou o músico, escritor e ator português Sérgio Godinho, e o seu idioma foram dissecados por diversos ângulos.

Na abertura, um dos principais momento do evento, ele foi visto de um ponto de vista íntimo através da sobrinha Manuela Nogueira, que conviveu com ele até os dez anos de idade. “Tenho muito honra de viajar para falar sobre meu tio e encontrar gente interessada na obra dele”, revelou, em uma abertura afetuosa. “Ele não era um homem sério. Com crianças, era de uma paciência infinda e cheio de humor.”

Para o pesquisador lusitano Arnaldo Saraiva, Pessoa foi adotado sem dificuldade pelo Brasil (Manuela reafirmou que o Brasil o valorizou antes mesmo do seu país de origem) também porque escrever em um “português clássico, cheio de classe”. O tradutor americano Richard Zenith, responsável por levar O Livro do Desassossego para o idioma inglês, comentou que, apesar do seu sotaque lusitano, seu primeiro contato com o português e com Pessoa se deu justamente no Brasil, quando morava em Florianópolis. “Ele escrevia em inglês, mas o inglês dele era demasiadamente poético. Ele era muito tímido, aprendeu o idioma mais através de leituras de Shakespeare do que no uso cotidiano”, comentou Zenith.

Outro bom encontro aconteceu entre o escritor e jornalista Mario Prata e o escritor português Miguel Sousa Tavares, no sábado, quando falaram sobre a relação entre Brasil e Portugal – com leveza, eles brincaram com as particularidades de cada um dos países, com direito até a piadas bem dosadas. Apesar dessas boas conversas, foi uma Fliporto de debates por vezes mornos, algumas vezes com mais reverências do que novidades.

Talvez a melhor participação tenha sido a do escritor catalão Javier Cercas, até porque o tema da sua mesa fugia dessa celebração quase total do português e de Pessoa. Na conversa com Eric Nepomuceno, ele falou sobre seu mais recente livro, O Impostor, em que conta a história real de um espanhol, Enric Marco, que fingiu por décadas ter sido um sobrevivente dos campos de concentração e um opositor do franquismo. A revelação de que tudo era mentira foi um escândalo na Espanha. “Para o livro, percebi que não precisava inventar nada, não fazia sentido fazer uma ficção sobre uma ficção ambulante", comentou sobre a obra, que ele define como um “romance sem ficção". “Com a minha escrita, tento mostrar que o passado é responsável por formar o presente. Hoje, vivemos uma ditadura do presente. e o que aconteceu ontem já não importa mais. Acham que só freaks (estranhos) como eu podem se interessar pela história”, provocou. “Afinal, uma mentira, assim como um romance, é construído de pequenas verdades.”

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