FIG 2017

Fênix, Ava e Não Recomendados: pop de altíssima voltagem em Garanhuns

Apresentações do Palco Pop confirmam a volta da vocação do festival para apostar no novo

Bruno Albertim
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Bruno Albertim
Publicado em 27/07/2017 às 15:21
Rodrigo Ramos / Cultura PE
Apresentações do Palco Pop confirmam a volta da vocação do festival para apostar no novo - FOTO: Rodrigo Ramos / Cultura PE
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Fosse o Brasil um país que de fato celebra e aproveita seus talentos, o pernambucano João Fênix não apenas estaria num outro cânone como teria provocado um pequeno tumulto diante do show que realizou na noite da última quarta, abrindo os trabalhos do Palco Pop do 27º Festival de Inverno de Garanhuns. Contralto pop de singularíssimo e metálico timbre andrógino, celebrado e dirigido por nomes como Gerald Thomas, Gringo Cardia e até o próprio Ney Matogrosso com quem sua voz, vez ou outra, é comparada, Fênix apresentou o show de seu último disco, De volta ao começo.

Fênix acabara de chegar do Rio onde, semana passada, concorreu na categoria de Melhor Cantor do Brasil no Prêmio da Música Brasileira – o prêmio acabou ficando com Lenine (!). Eram pouco mais de 18h quando o pernambucano radicado entre o Rio de Janeiro e os Estados Unidos subiu ao palco, acompanhado do maestro e violonista Jaime Além, o mesmo que, por décadas, emprestou seu talento à banda da baiana Maria Bethânia. Havia menos gente que os dedos das duas mãos reunidas diante do palco. Bastou o cantor começar a soltar a voz, gente começou a migrar do vizinho Parque Euclides Dourado. Em alguns acordes, mais de uma centena de pessoas estava diante da cena. A esfinge tem seus encantos.

No repertório,  versões eletrizantes de “Arrumação”, de Elomar ; “Língua do P”, de Gilberto Gil  e a sua já antológica versão de Cálice, de Chico Buarque. Logo depois, a carioca Ava Rocha e o grupo-espetáculo promoveram uma pequena revolução naquele palco. Revolução, sim: apresentações como o que se viu ali confirmam que o Festival de Inverno de Garanhuns, sublinhando a frase de Belchior, o homenageado do evento, voltou a acreditar que “o novo sempre vem”.

O público, de letras na ponta na língua e eletricidade no corpo, já passava de algumas centenas quando a carioca Ava Rocha assumiu o palco com sua performance caudalosa, aguda, xamanicamente pop. O show de afiada narrativa toca em tensões contemporâneas e, com uma sonoridade de várias camadas e dissonante, guitarras e baterias que vão do roquenrroll mais cru ao mais atmosférico fez também, como manda o pop, o povo simplesmente quebrar o corpo e cantar as letras.

Logo depois, o mundo (pelo menos naquela rua) veio abaixo com apresentação do grupo-espetáculo Não Recomendados: mistura de cabaret, musical off-brodway e opereta rock, o show criado no interior de São Paulo pelo trio de atores cantores Caio Prado, Daniel Chaudon e Diego Moraes reprocessou temas da MPB como Punk da Periferia, Cálice e o libelo gay Rubens (do repertório da finada Cássia Eller) para, com uma cenicidade eletrizante, triturar o machismo e a homofobia.

“O machismo, além das atrocidades que promove, também, o estímulo ao nosso trabalho. O inimigo estimula”, disse, no camarim, Caio Prado, autor da canção Não Recomendados, recentemente gravada por Johnnie Hooker, Almério e Liniker especialmente para a apresentação que farão no Rock in Rio.

FAFÁ MOLHADA

Lá na Praça Dominguinhos, principal palco do festival, o público se contava aos milhares para uma noite especialmente dedicada à música do Pará. Arthur Spíndola botou a praça pra dançar miudinho seu samba de acento amazônico. Ao lado mestre Pinduca, a cantora Lia Sophia, uma das grandes novas damas da canção nacional, mostrou-se também rainha do carimbo. E depois, estrelíssima, Fafá de Belém apresentou uma versão mais simplificada do show em que, amparada apenas pelas cordas dos músicos Manoel e Felipe Cordeiro, repassa  a carreira com ênfase na musicalidade do Pará. Com os Cordeiro, pai e filho, impedidos de sair da Ilha da Madeira onde se apresentaram, devido a problemas climáticos que fecharam o trânsito aéreo, o show foi feito com dois músicos substitutos de última hora – ensaiados pela internet. Fafá abriu a noite numa versão minimalista e matadora de “Foi assim”. Armou-se de um guarda-chuvas e desfilou durante o show pela passarela a céu aberto para mais perto do público. Depois da arrebatadora Abandona, ainda mais contundente apenas na voz e cordas, Fafá largou o abrigo. Sem guarda-chuvas, cantava tão molhada como o público para quem a chuva era apenas um detalhe naquele vendaval de canções.

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