Entrevista

Arnaldo Antunes preocupado com o ódio e intolerância

Ele acha que o Brasil, um país mestiço, deveria dar o exemplo

JOSÉ TELES
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JOSÉ TELES
Publicado em 11/04/2016 às 6:59
foto: divulgação/Márcia Xavier
Ele acha que o Brasil, um país mestiço, deveria dar o exemplo - FOTO: foto: divulgação/Márcia Xavier
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No momento político do Brasil em que as marchas acontecem quase semanalmente, contra e a favor do governo, numa terra extremamente musical, esta é uma crise sem trilha sonora. Não que faltem as canções. No show que Arnaldo Antunes apresentou no Teatro Guararapes (leia comentário ao lado), a plateia responde às canções leves e românticas, como Velha Infância, ou Socorro. Mas não se deixa levar quando ele canta: "Eles não pegam em armas/só em canetas e papéis/mas matam mais com suas leis/que atiradores cruéis".

São versos das primeira estrofe, do reggae Óbitos, canção do novo disco de Arnaldo Antunes. A faixa, antecipa ele, foi escolhida para ser o terceiro clipe do álbum. É uma parceria com Péricles Cavalcanti, que também dirige o clipe, no qual Brás, filho de Arnaldo, é um dos atores: "Tem a ver com o que a gente está vendo acontecer no momento político no Brasil. Ficou legal porque ao mesmo tempo em que é uma música que fala de um assunto barra pesada, o clipe é otimista, uma visão de superação", diz Arnaldo, que faz disso um conceito do álbum Já É.

Ele diz que não se sente compelido a fazer crônicas imediatas do cotidiano o que, de resto, com raríssimas exceções, não se faz mais. Tom Zé gravou e lançou músicas com assuntos que haviam acabado de acontecer, com boa repercussão na imprensa, mas que o povo não cantou: "Me sinto livre pra falar sobre qualquer assunto. Poderia ser mais presente este olhar do cronista muito atual. Não faço, mas acho que pode acontecer também", comenta Arnaldo que, coincidentemente, no clipe de Põe Fé Que Já É, toca na ferida da intolerância, e ódio, que são destilados a todo o momento nas redes sociais.

O clipe é um desfile de pessoas, dos mais variados matizes, tudo junto, misturado e em plena harmonia. Um alerta que se antecipou ao acirramento da intransigência que tomou conta do país: "Eu acho lamentável esta polaridade, este ódio todo que a gente vê muito na internet, principalmente. A convivência com a diversidade, como dizia naquela música, misérias são diferenças", comenta Arnaldo, citando Miséria, um dos seus sucessos com os Titãs. Sem enveredar pela política partidária, ele fez da música um alerta para o retrocesso em que o planeta entrou, curiosamente, 50 anos depois que a geração do paz e amor surgiu nos Estados Unidos:

"Acredito que a coisa está muito intolerante, não só no Brasil, mas no resto do mundo. De todos os lados. No lado político, no lado religioso, esta coisa do estado islâmico. A Europa se voltando para a direita, por causa dos refugiados de guerra. Cada vez mais sinto falta desta positividade, o convívio com as diferenças, o Brasil deveria ser um exemplo disso, porque é um país mestiço por natureza. Eu fico cabreiro com este momento".

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