Música/Entrevista

Fresno reinventa-se em novo disco, sem renegar o passado

Caetano Veloso participou de uma faixa, produzida por Kassin, no disco da Fresno

JOSÉ TELES
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JOSÉ TELES
Publicado em 04/12/2016 às 10:22
foto: divulgação
Caetano Veloso participou de uma faixa, produzida por Kassin, no disco da Fresno - FOTO: foto: divulgação
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O Hangar 110, casa de shows, no bairro do Bom Retiro em São Paulo, foi uma das última a fazer historia na cidade, como ponto para onde convergiam fãs de punk e hardcore. Pelo Hangar 110 passaram bandas como a a inglesa Exploited, a americana Agnostic, e a irlandesa Front Stiff Little Fingers. Por lá também surgiu uma cena de bandas novas paulistas, fazendo uma nova linha, hardcore, com letras. Entre outras, NX0, COM 22, Hateen e a gaúcha Fresno.
O produtor Rick Bonadio, dotado de faro aguçado para o sucesso, foi conferir as bandas do hangar 110. Contratou NX Zero, Fresno, CPM 22, bandas de forte apelo para adolescentes, que estouram país afora, levando-a a criar a gravadora Arsenal, a última das independentes bem sucedidas comercialmente no Brasil. A Fresno é uma das pouca bandas daquela leva, rotulada de Emo rock, que continua na estrada, com um imenso séquito de fãs. Atualmente formado por Lucas Silveira (vocal), Thiago Guerra (bateria), Gustavo Mantovani (guitarra) e Mario Camelo (teclado) o grupo acaba de lançar um mais um disco de estúdio, A Sinfonia de Tudo o Que Há, um álbum em que renova a sonoridade a banda, com protelação de Caetano Veloso, e do produtor Kissin.
Lucas, vocalista da Fresno converso sobre o disco, o rótulo “emo”, Rick Bonadio, sobre o grupo, hoje formado por trintões, e sua relação com o mercado e com os fã.

Espero que as pessoas ouçam o disco com profundidade, sem pensar no rótulo.


JORNAL DO COMMERCIO – Recentemente o Marco Alemão, do Hangar 110 anunciou que vai fechar a casa em 2017. O que representou o hangar 100 para você e sua geração? 
LUCAS - Foi por muito tempo uma casa pra gente, um celeiro de toda uma cena musical, da musica alternativa, influenciada pelo hardcore, pelo punk rock. O hangar fomentou esta cena, que não tinha lugar em outras casas de shows. A cena acabou numa coisa muito grande, como estouro do CPM22. Um lugar que nunca perdeu a cara underground, nunca se abriu só pra bilheteria, o fechamento da casa foi muito triste.
JC – E qual o papel de Rick Bonadio naquela cena, já que muitas banda foram contratadas por ele
Lucas - O papel de Bonadio na cena musical é nenhuma. Ele teve papel no mercado da música popular brasileira. Porque descobriu muitos artistas, Os Mamonas desde o começo. Com internet, no final dos anos 90, muita coisa estava popularizada muito antes de ser descoberta por uma caça talentos de gravadora. Quando Bonadio pegou a Fresno, a gente já havia, por exemplo, chegado sozinho no Recife, pela Internet. Ele conseguiu fazer um trabalho bom com as bandas, mas não era o produtor do hardcore, do rock, de um som alternativo. Ele trabalhava o rádio, que muito sazonal, enquanto a gente forma uma banda é pra vida inteira.
JC – Embora Caetano Veloso já tenha participado de discos de muita gente, foi surpresa ele cantar com a Fresno. Para vocês também?
Lucas – A gente vai ter orgulho pra sempre, pela admiração que tenho pela carreira inteira do Caetano, fui crescendo e enxergando genialidade na obra dele. Foi aumentando a vontade de um dia realizar este feito até então surreal pra gente, Caetano contando com a Fresno. Quem não conhece a Fresno pode estranhar, mas quem acompanha a história da banda vai ver que faz sentido, Não é a primeira vez que nos aproximamos da MPB, já gravamos antes com Lenine. A gente sempre visou derrubar esta barreira que existe entre o que é a MPB, o que é rock, que clássico, o que é que é novo. Caetano é um cara importante da música brasileira, sabe o peso que a participação dele tem, ele aceitar foi uma bênção muito grande. A participação dele é numa das músicas mais experimentais do disco, uma das mais loucas. Deu falatório, não só pela participação como por ter uma sonoridade diferente do eu se costuma ouvir da Fresno.
JC – E como Kassin entrou no disco, vfoi convidado pra produzir?
Lucas - Ele é um grande produtor, mas o disco foi produzido por mim. Kassin participou do processo da gravação com Caetano Veloso, feita no estúdio dele. Kassin é um amigo, temos muita coisa em comum, é um parceiro meu, conversamos muito sobre música.
JC – Este novo álbum é diferente, tem arranjos sinfônicos, feitos pelo maestro Lucas Lima, sem tantas guitarras, qual o conceito do trabalho
Lucas Silveira - O grande lance deste disco, depois de termos feito, como bandas, sete álbuns de estúdio, DVD, e tal é o momento musical, não só do Fresno, como do Brasil. Hoje se pede que se faça um trabalho diferente.É importante para nos tornar motivados a estar no momento atual, sem repetir o passado. Este disco a motivação de fazer coisa nova, uma sonoridade livre. Acho que o rock clássico é um negocio que acabou muito cheio de regras, tem que botar guitarra, tem que ter um solo, assim ou assado, acaba ficando careta. Tem que fugir as regras, não se obrigar a usar muitas guitarras só porque é rock. Procuramos experimentação, outros timbres, outras coisas, sem seguir padrão imposto não sei por quem A gente. É muito fácil ser careta, fazer o que já se fez. Buscar timbres diferentes foi um grande desafio dentro do rock já tão surradora, a gente buscou trazer coisa que nunca tinha usado antes.
JC - Vocês foram enquadrados na categoria Emo, uma música para teenagers, já passam dos 30 anos, ainda chamam a Fresno de banda Emo, vocês se incomodam?
Lucas - Nenhum artista gosta de ser rotulado. A indústria cria rótulos para que o publico entenda. Quando este fenômeno surgiu pegou a molecada que tava com 14 ou 15 anos, muito forte. Ao mesmo tempo em que os adultos não entendiam. É feito hoje. Eu estou com 33 anos, de repente conheço um cara de que nunca ou vi falar, e quando vou lá ver. ele está com vinte milhões de visualizações. Estão fico me vigiando para não falar nada, dizer que aquilo é horrível, que não sei o que é. Em cada geração tem alguém que vai se comunicar na linguagem de determinado público, ressoar de uma maneira muito grande para este público. E não cabe a gente dizer que é ruim. Deve-se reconhecer que é algo que tem uma importância grande para um publico de agora. Este rótulo serve pra própria mídia.Um rótulo pode ser pejorativo, quando é colocado de uma maneira pejorativa. Então de repente a gente faz trabalho que é resumido num rótulo. Espero que as pessoas ouçam o disco com profundidade, sem pensar no rótulo.
JC - O dilema de uma banda que tem um publico teen, é que eles crescem a adquirem novos gostos, passam a gostar de outras coisa, como é isso com a Fresno?
Lucas - A faixa etária que segue a banda, a gente consegue ver, tem subido bastante, o que é um desafio muito grande. Naturalmente, o teu fã na adolescência vai conhecer outras bandas. O que acontece em 90% dos casos é o cara acompanhar uma banda como adolescente, quando fica mais velho ou rejeita, como uma coisa vergonhosa, ou lembra com saudosismo, não quer ouvir nada de novo. Feito o cara que vai ao show do Roupa Nova e quer ouvir, Dona, A Viagem, e não sei que mais. O grupo tem muita coisa nova, mas o publico não quer saber. Com o Fresno a gente percebe que o nosso público quer saber do nosso disco novo. Não só envelheceu com a gente como quer ouvir também as músicas novas. Isto nos mantém inspirado, com muita energia, pra gravar o que a gente é hoje.

 

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