Carnaval 2017

Manoel Gilberto, médico e compositor, dá o diagnóstico do frevo

Ele venceu o festival Frevança por quatro vezes seguidas

JOSÉ TELES
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JOSÉ TELES
Publicado em 05/02/2017 às 9:39
Foto: Ricardo Labastier/JC Imagem
Ele venceu o festival Frevança por quatro vezes seguidas - FOTO: Foto: Ricardo Labastier/JC Imagem
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"Dizem que o povo não gosta de frevo, quem não gosta de frevo é a prefeitura, não prestigia, e inclusive se nega a cumprir a lei, que obriga a realizar concursos carnavalescos. Quando era vereador do Recife, fiz uma lei que obriga as emissoras de rádio a tocar pelo menos dois frevos, esta também não é obedecida. Vou ver se reúno alguns compositores, ainda sou presidente da associação de compositores, para ver se pressionamos a prefeitura. Ela tem tudo para fazer o concurso, teatro, orquestra, maestro. Nem precisa dar prêmios. O que o compositor quer é a gravação. Se fizesse um concurso e o disco fosse distribuído nas emissoras de rádio, em serviço de som as músicas ficariam conhecidas. Não sei por que não fazem", o desabafo é do médico e compositor Manoel Gilberto de Holanda Cavalcanti, autor de, entre várias outros, os frevos-­canções Menina de Hoje, e Às Cinco da Manhã e Vai Pegar Fogo (com José Menezes).

 Menina de Hoje foi sucesso num dos mais concorridos anos para os compositores de frevo. No auge da gravadora Rozenblit, que produziu, em 1959, para o Carnaval do ano seguinte, um dos mais robustos suplemento do seu catálogo, incluindo aí os álbuns clássicos do gênero Capiba 25 anos de Frevo e O Que eu Fiz e você Gostou, com músicas de Nelson Ferreira, interpretados por Claudionor Germano. "Eu fui falar com Nelson Ferreira e mostrei a música. Disse que queria mudar um pouco esses temas de Carnaval, de pierrô, arlequim. Ele elogiou, e gravou com Raimundo Santos. Uma coisa que não gosto de frevo é este negócio de choro. Carnaval, e a gente chorando", conta Manoel Gilberto, que fez parte de uma geração que renovou o frevo no início da década de 1960.

 Nomes como Gildo Branco, René Barbosa, Edson Rodrigues, Geraldo Costa, e até o maestro José Menezes, que então era mais conhecido por frevos instrumentais, como Freio Óleo, e assina com Aldemar Paiva o primeiro frevo­canção da Rozenblit, Boneca (também interpretado pelo onipresente Claudionor Germano). Médico da turma de 1958, neste mesmo ano Manoel Gilberto teve frevo gravado pela extinta Chantecler, Não Sei Porquê, parceria com o maestro Zé Menezes, seu mais constante arranjador:

 "Mas tive arranjos de todos eles. Clóvis Pereira, Edson Rodrigues, de Duda, que considero um gênio. Uma vez levei um frevo para ele fazer o arranjo. Disse que depois voltaria. Ele me mandou esperar, e fez na hora", diz o compositor, que é chamado de médico dos músicos: "Nunca cobrei consultas que fiz com eles". Ele começou a tocar na banda de música de Carpina, aos dez anos. Queria ser saxofonista, mas o pai não deixou. Passou para a bateria e reuniu conhecimentos musicais suficientes para compor.

 Na escola, tornou-­se especialista em paródias (cantarola uma de um frevo de Antônio Maria): "Os colegas gostavam muito e ficavam pedindo mais. Depois pensei comigo, se sei um pouco de musica, se sei fazer letra, posso compor. Antes de ser gravado, tinha umas poucas composições, tocadas na Rádio Jornal e interpretadas por um cantor amigo, Gilberto Fernandes. Mas um frevo­-canção não é fácil de fazer. Começa com um frevo puro, que é a introdução, depois entra a canção, a voz, tem o intérprete, ganhei o Frevança quatro vezes seguidas, com Claudionor Germano cantando, minhas músicas".

 

 Manoel Gilberto se elegeu duas vezes deputado estadual e vereador, entre os anos 70 e 90. Desde então não concorreu mais a cargos eletivos, mas continua clinicando, nos dois expedientes, e compondo, mesmo que não tenha mais ilusões quanto a voltar a repetir os sucessos que emplacou até os anos 80. "Nunca vivi de música, mas cheguei a ganhar um bom dinheiro com Menina de Hoje, não lembro quanto. Tocou muito, e não só aqui, no Nordeste também. Naquele tempo a Rozenblit pagava. as orquestras tocam quando vai terminando a madrugada, mas recebo quase nada. Meu último pagamento de direitos autorais foi de 281 reais, não dá nem vontade de ir pegar. Mas não me preocupo comigo e, sim, com os outros compositores. Tenho músicas feitas, mas não tem onde gravar".

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