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Crítica: Christina Aguilera encontra sua voz em 'Liberation'

Cantora lança seu primeiro disco em seis anos e aposta em tom confessional

Márcio Bastos
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Márcio Bastos
Publicado em 18/06/2018 às 21:04
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Cantora lança seu primeiro disco em seis anos e aposta em tom confessional - FOTO: Reprodução
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Pela maior parte dos anos 2000, Christina Aguilera ocupou o panteão da música pop e seu status de diva parecia inabalável. No entanto, desde 2010, quando lançou o álbum Bionic, sua carreira saiu dos trilhos. Com vendas modestas comparadas com seus primeiros trabalhos e sem hits, ela se tornou alvo de memes nada elogiosos e após uma tentativa de surfar na sonoridade do momento com Lotus (2012), ficou mais conhecida pela nova geração como uma das juradas do The Voice americano, garota propaganda de marca de biscoito e por participações em faixas de artistas como Maroon 5 e Pitbull. Novamente focada da música, ela lançou Liberation, seu primeiro disco de inéditas em seis anos, um manifesto de independência artística e pessoal.

A carreira de Christina ou Xtina, para os fãs, começou na infância, quando integrou o elenco do Mickey Mouse Club, programa de variedades da Disney que revelou, na mesma época, Britney Spears e Justin Timberlake. Seu primeiro disco, em 1999, quando ela tinha 18 anos, é reflexo de um momento em que o pop adolescente com produção de suecos como Max Martin começava a dominar o mundo. Com hits como Gennie in a Bottle e What a Girl Wants, atingiu o topo das paradas e vendeu mais de 14 milhões de cópias.

Em seguida, lançou um álbum em espanhol (Mi Reflejo), abraçando suas raízes latinas (seu pai é equatoriano) e um disco natalino, seguindo as instruções da gravadora. Em 2002, surpreendeu com Stripped, disco em que rompia com a imagem virginal e fabricada e abraçava suas maiores influências, o r&b e a soul music, com baladas marcantes, a exemplo de Beautiful, além de flertar com o rock e hip hop. O disco solidificou sua posição como uma das maiores vozes de sua geração e abordou temáticas como feminismo, violência contra a mulher, além de experiências amorosas e familiares da americana.

Seu talento e versatilidade conquistaram admiradores como Mick Jagger, Etta James, Patti Smith, Herbie Hancock e Elton John. Suas acrobacias vocais se tornaram referências para novatas como Ariana Grande, Kelly Clarkson e Demi Lovato, que, aliás, realizou o sonho de cantar com a diva em Fall In Line, uma das melhores faixas do Liberation.

Mais do que qualquer uma de suas contemporâneas, Christina foi a maior aprendiz da escola Madonna de reinvenção de imagem e som. Back to Basics (2006) mesclou influências dos anos 1920 aos anos 1950.

Em Bionic, se continuou seu projeto de experimentação com uma sonoridade futurista, inspirada no eletropop, com colaborações de artistas da cena alternativa, como Le Tigre, Peaches e a então indie Sia (hoje um fenômeno pop). O projeto, no entanto, foi massacrado por comparações (injustas) a Lady Gaga e coincidiu com um período turbulento na vida pessoal, que culminou com o fim de seu casamento.

NO CONTROLE

O lançamento de Liberation demorou – e muito. Foram seis anos de espera, mas o resultado compensa. O disco dialoga com o Stripped pelo conteúdo confessional. A faixa-título, com inspirações orquestrais, é produzida por Nicholas Brittle, indicado ao Oscar pela trilha de Moonlight (2016). Ela é seguida pelo interlude Searching for Maria, no qual a cantora, cujo nome completo é Christina Maria Aguilera, canta trecho da música de A Noviça Rebelde.

A canção introduz Maria, produzida por Kanye West (que também assina o hip hop experimental Accelerate) e com sample da faixa homônima cantada por um jovem Michael Jackson. Nela, Xtina reflete sobre os últimos anos e como se sentiu desconectada consigo. “Você consegue ouvir na minha voz/ Que eu estou tentando fazer uma escolha?/(...) Você me calou minha boca/ Me fez sentir imprestável, esgotada/ Estou cansada dessas maquiagens/ Porque elas não vão esconder os cortes profundos”, canta.

Sick of Sittin’, em que reafirma a versatilidade de sua voz cantando à la Janis Joplin, ela dispara o que só pode ser entendido como uma “matação” para o The Voice. As mensagens de empoderamento, tão caras à americana desde o Stripped, são enfatizadas no interlude Dreamers, com várias garotas (entre elas a filha de 3 anos da artista) verbalizando suas ambições, como ser cientista, jornalista, cantora e presidente. Em seguida, em Fall In Line, dueto com Demi Lovato, Christina compartilha sua experiência de combate ao machismo.

“Você não deve a eles sua alma e seu corpo/ Toda a juventude no mundo não vai te impedir de envelhecer/ E toda a verdade em uma menina é muito preciosa para ser roubada”, enfatiza.

A cantora experimenta ainda com o dancehall na divertida Right Moves, com participação das jamaicanas Keida e Shenseea. O r&b sensual pauta as sensuais Pipe, com XNDA, e Like I Do, com produção de Anderson Paak e vocais do rapper GoldLink.

O vocal cheio de nuances de Christina Aguilera brilha nas baladas Twice, Masochist, Unless It’s You e Deserve, na qual revela seu padrão auto-sabotagem no amor. Aguilera pode até não figurar na briga pelo primeiro lugar nas paradas, mas com Liberation, Xtina reforça sua singularidade e força artística, qualidades que muitos de seus contemporâneos não podem ostentar.

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