Falta Bolsonaro na CPI. Por Ricardo Leitão

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jamildo

Publicado em 24/05/2021 às 16:40
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Por Ricardo Leitão, em artigo enviado ao blog

Na condição de imbrochável, incomível, imorrível e de pior presidente da história do Brasil, Jair Bolsonaro – com tantos predicados – está obrigado a se explicar à CPI da Covid.

Sendo também invencível, nada deve temer.

Seus feitos serão respeitados. Nos 15 meses do pandemicídio no Brasil, ninguém mais contribuiu para a tragédia, que se aproxima dos 16 milhões de infectados e 500 mil mortos. A maior crise sanitária do século, para alguns um genocídio.

Durante o primeiro mês de depoimentos à comissão do Senado, o presidente não foi.

O primeiro ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, entregou à CPI cópia de carta sua, entregue a Sua Excelência, em que requer a Bolsonaro providências urgentes para conter a pandemia.

A carta é de março de 2020, um mês depois da confirmação do primeiro de caso da covid-19 no País. O presidente não fez nada e passou a chamar a infecção de “uma gripezinha”.

O depoimento de 14 horas do penúltimo ministro da Saúde, o general Eduardo Pazuello, escancarou ainda mais a incúria.

Apesar das mentiras e das tentativas patéticas de proteger Bolsonaro, o ex-ministro foi incapaz de responder perguntas objetivas, como as seguintes:

O que explica a negligência na aquisição e distribuição de vacinas?

Por que o presidente contestou a eficácia dos imunizantes? Por que foi minimizada a gravidade da pandemia?

Por que o governo receitou remédios, como a cloroquina, ineficazes contra a covid-19?

Por que boicotou o isolamento social e o uso de máscaras?

Por que foi lerdo no atendimento às pessoas prestes a morrer por asfixia no Amazonas?

Por que não promoveu campanhas educativas de massa e não realizou testagens em larga escala?

Por que foi permanentemente incapaz de coordenar ações com os governadores, tratados como adversários políticos?

O depoimento do general Pazuello foi considerado pela CPI tão insuficiente e mentiroso que ele deverá ser novamente convidado a comparecer à comissão.

Se isso acontecer, é provável que compareça, embora seja improvável que vá acrescentar algo relevante ao que já disse.

Quem tem mais – e muito – a dizer é Jair Bolsonaro.

Os senadores sabem disso, divergem apenas sobre o melhor momento para convidar o presidente.

Estão no seu autoritarismo, na sua incompetência, na sua insensibilidade diante dos milhões de infectados e mortos as causas que transformaram em maior obra de seu desgoverno centenas de caixões enterrados em covas rasas e pessoas asfixiadas por falta de oxigênio hospitalar.

Por respeito ao cargo que ocupa, Bolsonaro está obrigado a se apresentar e se explicar à CPI.

Descrentes dizem que é mais fácil um elefante albino bater continência para um jacaré cor de rosa.

Dessa forma, Sua Excelência vai se escudando do fato de que uma CPI não pode convocar um presidente.

Nunca ocorreu.

Caso ocorra, Bolsonaro pode até recorrer à Justiça, alegando que a iniciativa da comissão é inconstitucional.

O desgaste político será inevitável. Contudo, melhor arrostá-lo do que enfrentar o bombardeio, transmitido em rede nacional do rádio e televisão, dos senadores da oposição.

A “gripezinha” se transformou em um dos maiores obstáculos para o principal projeto político de Bolsonaro: a reeleição.


Observadores da evolução dos cenários eleitorais não têm dúvidas de que a inépcia do governo no combate ao pandemicídio é uma das principais causas do crescimento de Luiz Inácio Lula da Silva nas pesquisas.

Ser o principal candidato anti-Bolsonaro é o maior trunfo de petista.

Fortalecem ainda seu nome outras crises, que se arrastam sem solução, como a estagflação; o desemprego; a degradação ambiental; a tensão nas Forças Armadas e o isolamento internacional do Brasil.

Acuado e cada vez mais agressivo, Bolsonaro já demonstrou incontestável incapacidade de solucionar qualquer uma delas.

A perspectiva da derrota no próximo ano faz dele uma ameaça cada vez maior à democracia. Então, vale tudo, desde apoio ostensivo a militantes que pedem a volta da ditadura militar até a exigência do voto impresso em 2022 – reiterada tentativa de tumultuar, desde já, o processo eleitoral.

A CPI vai se estender por três meses, no mínimo. Seu prazo pode ser ampliado.

Sob o peso de mais acusações e sem defensores na comissão, Bolsonaro pode até querer contestar os ataques e exigir uma acareação com seus detratores.

Quem?

Uma sugestão: de um lado, Sua Excelência imbrochável, incomível e imorrível, como gosta de se definir; do outro, rostos dos 500 mil mortos e cenas de UTIs superlotadas.

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