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Um Arco sem triunfo

Pernambuco não pode perder um empreendimento que é reconhecido como estruturador para a economia e fundamental para a organização territorial da região metropolitana que está associada à qualidade de vida dos cidadãos e à diminuição de gases poluentes.

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Publicado em 19/08/2021 às 11:45
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Por Alexandrina Sobreira de Moura, especial para o blog de Jamildo

A organização do território em áreas urbanas sempre apresentou dicotomias. Entre planejadores e as agendas políticas dos governos. Entre definir uso da ocupação do solo e atender demandas sociais por habitação. Entre viabilidade de crescimento econômico e a defesa da sustentabilidade socioambiental. Entre argumentos legais que envolvem instituições públicas, privadas e da sociedade.

O Arco Metropolitano do Recife foi pensado no âmbito da Fundação de Desenvolvimento da Região Metropolitana do Recife (Fidem) na década de 1990, para integrar cidades, por uma malha rodoviária que poderia viabilizar a organização territorial e a qualidade de vida.

Após anos de debates, em esferas políticas e técnicas, intensificaram-se os problemas de mobilidade, segurança, ausência de obras de infraestrutura que passaram a ser entraves para um estado mais competitivo. Fator relevante para o resgate da construção do Arco Metropolitano foi a necessidade de interligar o Complexo de Suape, no Cabo de Santo Agostinho, ao polo automotivo de Goiana.

Em maio de 2014, com a promessa do Governo Dilma de financiar as obras, o governador João Lyra Neto ((PSB) acerta com o ministro dos transportes, César Borges, executar o Arco Metropolitano em duas etapas. O primeiro trecho teria edital lançado de imediato, abrangendo o Eixo Sul que vai de Suape, em Ipojuca, no Litoral Sul até às proximidades da BR-408, na altura de São Lourenço da Mata. A segunda etapa que tem início na BR 408, em São Lourenço da Mata, seguindo até Goiana, ficou sem previsão, tendo em vista as críticas relativas ao trecho que passaria por dentro da Área de Proteção Ambiental Aldeia-Beberibe.

De fato, vários setores da sociedade e os órgãos de gestão ambiental em Pernambuco conhecem a legislação que proíbe a supressão de vegetação de preservação permanente. A Política Florestal Estadual, Lei 11.206 de 31 de março de 1995, que regula a matéria, abre algumas exceções, desde que não exista no Estado nenhuma outra alternativa de área de uso para os objetivos da supressão. Na região, projeto social do INCRA para assentamentos rurais, na década de 1980, devastou 2000 hectares na Mata da Pitanga.

A APA Aldeia-Beberibe, criada pelo Decreto Estadual 34.692/2010, já havia sido classificada, em 2002, como área de extrema importância biológica para a conservação da biodiversidade pelo Atlas da Biodiversidade de Pernambuco, elaborado pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente (SECTMA). Há de se considerar que, por lei, a APA protege mananciais hídricos, incentiva restauração florestal e integra três refúgios da vida silvestre que são Unidades de Conservação de Proteção Integral.

Além disso, o Decreto Estadual n.47.556 de 2019 determinou a criação de corredores ecológicos que fortalecem elos entre as unidades de conservação, contribuindo para manutenção de recursos hídricos e cobertura vegetal. Todas as ações se inserem em leis que criaram os Sistemas Nacional (2000) e estadual (2009) de Unidades de Conservação. Some-se que a APA dispõe de um Conselho Gestor, órgão colegiado paritário para garantir, sobretudo, proteção e conservação da diversidade biológica e cultural e disciplinar uso e ocupação do solo.

Nesse momento, valorizar o meio ambiente não significa polarizar com iniciativas econômicas. O arcabouço jurídico ambiental está pleno de instrumentos econômicos de gestão ambiental que conjugam uma pluralidade de aspectos que permitem conciliar agendas que são do Estado, embora as inciativas venham de diversos segmentos da sociedade. Há de se considerar de forma positiva o elenco de instituições que se envolveram para garantir a viabilidade do empreendimento consoante as normas vigentes.

Ressalte-se o papel do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco que adotou medida cautelar em processo licitatório da Agência de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco (AD Diper). Problemas sérios foram enumerados, destacando que o correto é obter a licença prévia para depois elaborar os projetos de engenharia, conforme alerta o Tribunal de Contas da União. O teor da deliberação muito bem fundamentada é de 3 de agosto de 2021.

O Ministério Público de Pernambuco, em 18 de junho de 2021, representado por três promotores de justiça de São Lourenço da Mata, de Camaragibe e de Abreu e Lima considerou princípios de desenvolvimento sustentável previsto na Agenda 21 lançada na Rio 92, as resoluções do Conama, a Lei de Política Nacional de Meio Ambiente (1981), leis estaduais e endereçou recomendações à Agência Estadual de Meio Ambiente relacionadas ao futuro processo de licenciamento ambiental do Eixo Norte ou Lote 1 do Arco Metropolitano. Seguiram cópias para a AD Diper, o Fórum Socioambiental de Aldeia e o TCE-PE.
A iniciativa do Fórum de Aldeia, fundado em 2003, questionando os processos de licitação, se deu em reuniões com a Assembleia Legislativa (ALEPE), a CPRH e o Ministério Público de Pernambuco, formalizando um documento consensual entregue ao governador João Lyra em 2014 para que solicitasse ao DNIT estudos de alternativas locacionais para contornar a APA Aldeia Beberibe.

Se começamos ressaltando dicotomias que marcam tantos processos decisórios, vê-se que a construção do Arco Metropolitano vem sendo moldado por uma pluralidade de instituições governamentais e seus órgãos de controle e pela participação de diversos segmentos da sociedade civil. Há um sentido de urgência compartilhado em diversas esferas.

Pernambuco não pode perder um empreendimento que é reconhecido como estruturador para a economia e fundamental para a organização territorial da região metropolitana que está associada à qualidade de vida dos cidadãos e à diminuição de gases poluentes. Conciliar interesses, mediar conflitos, mitigar, evitar riscos de danos ao erário público é possível, tendo em mente que a defesa do meio ambiente é um dos princípios da ordem econômica nacional previstos na Constituição.

Alexandrina Saldanha Sobreira de Moura é pesquisadora da Fundação Joaquim Nabuco, professora do Mestrado em Gestão Pública da UFPE e ex-secretária executiva de Meio Ambiente de Pernambuco (1999-2006)

 

 

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