ameaças à democracia

Luiz Fux promete que STF vai reagir às ameaças de Bolsonaro

Com suor, perseverança e coragem, disse o presidente do STF

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Jamildo Melo

Publicado em 08/09/2021 às 14:48 | Atualizado em 08/09/2021 às 16:12
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Em um discurso na abertura da sessão do STF, nesta quarta-feira, o presidente da Suprema Corte defendeu a instituição dos ataques feitos pelo presidente Bolsonaro, neste domingo.

Numa das primeiras críticas, sem citar o militar, chamou-o de falso profeta do patriotismo.

"Quem promove o discurso do nós contra eles quer o caos", disse.

"Ninguém fechará esta corte. Vamos defendê-la com suor, perseverança e coragem", disse. "Não nos cansaremos de pregar fidelidade à Constituição", afirmou.

"Jamais aceitaremos ameaças à independência do STF ou intimidações às suas funções".

Fux também disse que não vai tolerar desprezo às decisões judiciais, em uma resposta direta a Bolsonaro, que na Paulista disse que não iria cumprir ordens de Alexandre de Moraes.

Nesta hora, o presidente do STF apontou os riscos da atitude do presidente. "Esta atitude é um atentado à democracia e crime de responsabilidade, que deve ser tratado pelo Congresso"

Fux dirigiu-se diretamente aos brasileiros. "Povo brasileiro, não caia na narrativa falsa de falsos inimigos da nação", em referência ao ataque pessoal ao ministro Alexandre de Moraes, que cuida do inquérito das Fake News e vai tocar o TSE no ano das eleições, sendo já de antemão atacado pelas alas radicais de direita.

Noutra crítica indireta a Bolsonaro, Fux ironizou. "Verdadeiros patriotas não fecham os olhos aos verdadeiros problemas do País".

Em outro momento, ele conclamou aos líderes que se dediquem aos problemas do Brasil, como desemprego e mortes pela pandemia, que já chega aos 580 mil mortes.

Veja abaixo a integra da fala de FUX

 

Senhores magistrados brasileiros de todas as regiões do país, desembargadores e ministros dos tribunais superiores, Senhor procurador-geral da República, Senhores advogadas e advogados, Cidadãos brasileiros,

O Brasil comemorou, na data de ontem, 199 anos de sua independência.

Em todas as capitais e em diversas cidades do país, cidadãos compareceram às ruas. O país acompanhou atento o desenrolar das manifestações e, para tranquilidade de todos nós, os movimentos não registraram incidentes graves.

Com efeito, os participantes exerceram as suas liberdades de reunião e de expressão – direitos
fundamentais ostensivamente protegidos por este Supremo Tribunal Federal.

Nesse ponto, é forçoso enaltecer a atuação das forças de segurança do país, em especial as Polícias Militares e  a Polícia Federal, cujos membros não mediram esforços para a preservação da ordem e da incolumidade do patrimônio público, com integral respeito à dignidade  dos manifestantes.

Destaque-se, por seu turno, o empenho das Forças Armadas, dos governadores de Estado e dos demais agentes de segurança e de inteligência pública, que monitoraram em tempo real todas as manifestações, permitindo assim o seu desenrolar com ordem e paz.

De norte a sul do país, percebemos que os policiais e demais agentes atuaram conscientes de que a democracia é importante não apenas para si, mas também para seus
filhos, que crescerão ao pálio da normalidade institucional que seus pais contribuíram para manter.
Este Supremo Tribunal Federal também esteve atento à forma e ao conteúdo dos atos realizados no dia de ontem. Cartazes e palavras de ordem veicularam duras críticas à Corte e aos seus membros, muitas delas também vocalizadas pelo Senhor Presidente da República, em seus discursos em Brasília e em São Paulo.

Na qualidade de chefe do Poder Judiciário e Presidente do Supremo Tribunal Federal, em nome do colegiado, impõe-se uma palavra de patriotismo e de respeito às instituições do país. Nós, Ministras e Ministros do STF, sabemos que nenhuma nação constrói a sua identidade sem dissenso.

A convivência entre visões diferentes sobre o mesmo mundo é pressuposto da democracia, que não sobrevive sem debates sobre o desempenho dos seus governos e de suas instituições.


Nesse contexto, em toda a sua trajetória nesses 130 anos de vida republicana, o Supremo Tribunal Federal jamais se negou – e jamais se negará – ao aprimoramento institucional em prol do nosso amado país.

No entanto, a crítica institucional não se confunde – e nem se adequa – com narrativas de descredibilização do Supremo Tribunal e de seus membros, tal como vem sendo gravemente difundidas pelo Chefe da Nação.

Ofender a honra dos Ministros, incitar a população a propagar discursos de ódio contra a instituição do Supremo Tribunal Federal e incentivar o descumprimento de decisões judiciais são práticas
antidemocráticas, ilícitas e intoleráveis, em respeito ao juramento constitucional que fizemos ao assumirmos uma cadeira na Corte.

Infelizmente, tem sido cada vez mais comum que alguns movimentos invoquem a democracia como
pretexto para a promoção de ideais antidemocráticos. Estejamos atentos a esses falsos profetas do patriotismo, que ignoram que democracias verdadeiras  não admitem que se coloque o povo contra o povo, ou o povo contra as suas instituições.

Todos sabemos que quem promove o discurso do “nós contra eles” não propaga democracia, mas a política do caos.  Em verdade, a democracia é o discurso do “um por todos e todos por um, respeitadas as nossas diferenças e complexidades”.

Povo brasileiro, não caia na tentação das narrativas fáceis e messiânicas, que criam falsos inimigos da nação. Mais do que nunca, o nosso tempo requer respeito aos poderes constituídos. O verdadeiro patriota não fecha os olhos para os problemas reais e urgentes do país.

Pelo contrário, procura enfrentá-los, tal como um incansável artesão, tecendo consensos mínimos entre os grupos que naturalmente pensam diferentes. Só assim é possível pacificar e revigorar uma nação inteira.

Imbuído desse espírito democrático e de vigor institucional, este Supremo Tribunal Federal jamais
aceitará ameaças à sua independência nem intimidações ao exercício regular de suas funções.
Os juízes da Suprema Corte – e todos os mais de 20.000 magistrados do país – têm compromisso com a sua independência, assegurada nesse documento sagrado que é a nossa Constituição, que consagra as aspirações do povo brasileiro e faz jus às lutas por direitos empreendidas pelas gerações que nos antecederam.

O Supremo Tribunal Federal também não tolerará ameaças à autoridade de suas decisões. Se o desprezo às decisões judiciais ocorre por iniciativa do Chefe de qualquer dos Poderes, essa atitude, além de representar um atentado à democracia, configura crime de responsabilidade, a ser analisado pelo Congresso Nacional. Num ambiente político maduro, questionamentos às decisões judiciais devem ser realizados não através da desobediência, não através da desordem, e não através do caos provocado, mas decerto pelos recursos, que as vias processuais oferecem.

Ninguém, ninguém fechará esta Corte. Nós a manteremos de pé, com suor, perseverança e coragem.
No exercício de seu papel, o Supremo Tribunal Federal não se cansará de pregar fidelidade à Constituição e, ao assim proceder, esta Corte reafirmará, ao longo de sua perene existência, o seu necessário compromisso com o regime democrático, com os direitos humanos e com o respeito aos poderes e às instituições deste país.

Em nome das Ministras e dos Ministros desta Casa, conclamo os líderes do nosso país a que se dediquem aos problemas reais que assolam o nosso povo: a pandemia, que ainda não acabou e já levou 580 mil vidas brasileiras.

Devemos nos preocupar com o desemprego, que conduz o cidadão ao limite da sobrevivência biológica; a inflação, que corrói a renda dos mais pobres; e a crise hídrica, que se avizinha e que ameaça a nossa retomada econômica.

Esperança por dias melhores é o nosso desejo e o desejo de todos. Mas continuamos firmes na exigência de narrativas e comportamentos verdadeiramente democráticas, à altura do que o povo brasileiro almeja e merece.

Não temos mais tempo a perder.

Ministro Luiz Fux

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