Motivação dos incêndios de ônibus ainda é mistério

Publicado em 27/11/2019 às 8:43 | Atualizado em 08/05/2020 às 15:04
Dois ônibus foram completamente queimados, um parcialmente e outras seis tentativas aconteceram entre os dias 25 e 29/11. Foto: Artur Souza/JC Imagem
FOTO: Dois ônibus foram completamente queimados, um parcialmente e outras seis tentativas aconteceram entre os dias 25 e 29/11. Foto: Artur Souza/JC Imagem
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Dois ônibus do Conorte (empresa Itamaracá) foram completamente queimados. Cada um custa R$ 300 mil  

 

A motivação para que alguns ônibus que operam o Sistema de Transporte Público de Passageiros da Região Metropolitana do Recife (STPP) estejam sendo incendiados ainda é um mistério. Mas há duas possibilidades para os atos. Especula-se que um deles seja uma reação de traficantes à interferência da Força Nacional no município de Paulista, onde está sendo desenvolvido o Em Frente Brasil, projeto-piloto de segurança pública do governo federal que tem conseguido reduzir homicídios e o tráfico na região. O outro seria uma reação orquestrada contra a retirada dos cobradores dos ônibus e o acumulo de função pelos motoristas – já são 126 linhas operando assim, o que representa 32% do sistema. Oito ocorrências de incêndio foram registradas em pouco mais de 24 horas em Paulista, Olinda, Recife e Jaboatão dos Guararapes. Dois coletivos foram completamente consumidos pelo fogo e um terceiro parcialmente. Os outros cinco atos foram tentativas. Não houve feridos, mas com exceção de um episódio, em todos os outros havia passageiros e operadores (motoristas e cobradores) nos coletivos.

Dois suspeitos de envolvimento nos incêndios teriam sido detidos no fim da tarde desta terça-feira (26), após procurarem unidades de saúde com queimaduras. Pelo menos um deles foi autuado em flagrante. A ousadia dos atos – pelo menos dois deles foram tentados durante o dia, em pleno horário comercial – silenciou a Secretaria de Defesa Social (SDS), os gestores e os operadores do sistema de transporte metropolitano. Apenas notas oficiais foram repassadas, sem resposta à principal pergunta sobre os episódios: qual a motivação para os incêndios? A SDS garantiu ter criado uma força-tarefa envolvendo a operação policial em todas as suas esferas (polícias investigativa, repressiva e científica) e a Secretaria de Desenvolvimento Urbano – responsável pela gestão do STPP – para enfrentar as queimas. Mas não repassou mais informações.

 

 

“Ainda é muito cedo para conectar os casos ou dizer qualquer coisa. Estamos buscando imagens de câmeras externas aos locais dos incêndios que possam ter flagrado a aproximação dos autores. No caso que estamos investigando é mais difícil porque o ônibus que foi parcialmente queimado estava estacionado no terminal, aguardando uma nova viagem, sem ninguém no interior. De repente o fogo começou”, desconversou o delegado do Ibura, Alessandro Orico, que investiga a queima parcial de um ônibus da Vera Cruz, Linha 134 – Lagoa Encantada/TI Tancredo Neves, às 20h15 de segunda-feira. O delegado de Paulista, Guilherme Kerth, também não tinha muitas informações para repassar.

A expectativa para a prisão dos envolvidos é grande porque há muitas imagens circulando das tentativas de incêndio flagradas pelas câmeras dos ônibus que foram alvo – cada coletivo tem, por determinação do Conselho Superior de Transportes (CSTM), quatro câmeras internas. Uma delas, inclusive, é voltada para a rua, registrando o movimento externo ao veículo. Em uma das tentativas, praticada contra o ônibus da empresa Cidade Alta (que integra o Consórcio Conorte), linha 1909 (TI Pelópidas/TI Joana Bezerra), no corredor da PE-15, em Paulista, é possível ver com clareza as feições de três dos cinco rapazes que abordam o coletivo, obrigam os passageiros e operadores a descer e tentam tocar fogo. O ato não é consumado porque uma viatura da Polícia Militar passa no momento e eles fogem.

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Das oito ocorrências relacionadas pela SDS, duas delas aconteceram de dia: uma às 16h30 da segunda-feira e outra na tarde de ontem, no Loteamento Suassuna, em Jaboatão dos Guararapes. “Estamos todos muito assustados. Há o medo de algo mais grave, atingindo um operador ou um passageiro. E o medo da destruição dos coletivos, que são investimentos altos. Por isso, a determinação é de garantir a operação, mas havendo qualquer episódio, recolhemos a frota para evitar o pior. Acredito que seja algo além de briga de sindicatos. Acho, realmente, que tem relação com o crime organizado, o tráfico de drogas”, afirma um dos empresários do setor, sem se identificar.

Por nota, o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros (Urbana-PE) afirmou ter acionado e subsidiado a SDS com as informações operacionais necessárias e que aguarda a investigação policial. O dia de ontem foi de reuniões na sede da Urbana-PE, na Ilha do Leite, no Recife, e na SDS, em Santo Amaro. O próprio secretário Antônio de Pádua comandou a reunião que criou a força-tarefa policial. Os representantes dos rodoviários – Benilson Custódio, atual presidente do sindicato, e Aldo Lima, presidente eleito da entidade – também repudiaram os incêndios. Aldo Lima, inclusive, foi eleito tendo como principal bandeira a luta contra a retirada dos cobradores e a dupla função dos motoristas.

Custo pelo ônibus queimado é do empresário, mas pesará no cálculo da tarifa no próximo aumento. Foto: Arthur Borba/JC Imagem

MEDO E PÂNICO ENTRE OS PASSAGEIROS E OPERADORES

O fato de os incêndios contra alguns ônibus da Região Metropolitana do Recife não terem deixado feridos não minimiza o impacto da violência dos atos. O medo predominou e continua predominado entre todos. Em depoimentos e áudios feitos por operadores e passageiros que presenciaram as investidas isso é evidente. Os relatos são de pânico e fortalecem a insegurança de quem precisa utilizar o sistema de transporte público, seja como passageiro ou como operador. Nas imagens, é possível ver as pessoas descendo desesperadas dos coletivos.

“Foi tudo muito rápido. Eu parei o ônibus para um passageiro e, de repente, um rapaz apareceu. Ele estava armado e gritava o tempo todo para que as pessoas descessem, para que eu abrisse as três portas do veículos. De repente apareceram outros quatro e já começaram a jogar combustível no coletivo, enquanto os usuários corriam como podiam”, relatou o motorista do ônibus totalmente queimado na PE-15, na noite de segunda-feira.

Há relatos, inclusive, de que no primeiro incêndio, na madrugada de segunda, um dos criminosos quis que o cobrador ateasse fogo ao veículo. Em uma das tentativas, praticada contra um dos ônibus da Empresa Metropolitana, a cobradora chegou a ser atingida pela gasolina que três homens jogaram. “Nossa sorte é que eu consegui arrancar com o veículo, que estava todo sujo de combustível, antes de eles atearem fogo. Cheguei no TI do Barro e fui direto para a garagem”, contou o condutor de um dos coletivos que por pouco não foi incendiado em Areias.

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