Raniel, ex-Santa Cruz, relembra abuso de álcool, drogas e drama pessoal; veja
Cria da base do Santa Cruz, Raniel já passou pelo Cruzeiro, São Paulo, Santos e atualmente defende o Vasco
ESTADÃO CONTEÚDO
Raniel, atacante com passagens por Santa Cruz, São Paulo e Santos, se abriu sobre seus dramas pessoais nesta sexta-feira.
O jogador, atualmente no Vasco, falou que teve de lidar, entre outras coisas, com a dependência química e ausência dos pais durante sua infância e adolescência.
Ainda muito cedo, com a morte de seu pai, sua mãe o deu para a vizinha, que já tinha outros três filhos. Dione, como é chamada, passou a criá-lo "sem mesmo questionar", como contou o atleta.
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"Não gosto de julgar os pais que abandonam seus filhos, porque não sei o que se passava naquele momento" comenta o atacante.
"Eu sou pai também e, por mais que eu tente, nunca vou sentir a gravidade da situação como a minha mãe sentiu ao perder meu pai, o tamanho das dificuldades que ela enfrentava, as incertezas todas, pra ter chegado ao ponto de me abandonar", relatou Raniel.
Segundo o atacante, a casa de Dione não oferecia nenhum luxo e era difícil sustentar seus quatro filhos. Foi no futebol que Raniel, assim como muitos outros jovens, encontrou uma possibilidade de melhorar sua vida e ascender socialmente.
"O pessoal do clube dizia que eu tinha talento. Só precisava manter a cabeça no lugar. Não consegui", relatou em texto publicado no site The Players Tribune.
Com 14 anos, Raniel cedeu ao mundo das drogas. De usuário, passou até a comercializar e traficar. No Santa Cruz, seu primeiro time como profissional, e já com 17 anos, foi pego no exame antidoping para cocaína. O sentimento nesse momento foi de "medo, vergonha e desemprego."
"Eu estava com a minha avó quando a TV deu a notícia da minha suspensão. Ela ficou tão mal, tão arrasada. Achei que eu fosse perder ela também. Isso me machucou mais do que a própria punição. Ver ela ali chorando na frente da televisão acabou comigo", contou.
Eu me senti caindo de vez mais no abismo e que ele não tinha fundo, que eu desceria pra sempre até morrer. Mas o Santa Cruz estendeu a mão e me resgatou. O clube me manteve no elenco mesmo eu não podendo jogar", completou Raniel.
BONS E MAUS MOMENTOS
No Cruzeiro, Raniel conta ter vivido uns dos melhores momentos e chegou a largar o álcool por um período. "Eles viam que eu estava querendo superar o meu passado e me ajudaram ao máximo."
Mas na sequência, os pesadelos de sua vida voltaram a atormentá-lo. Após deixar Belo Horizonte, em direção ao futebol paulista, Raniel teve de lidar com duas hospitalizações: sua e de seu filho, que quase o fizeram se afundar de vez nas drogas.
Em 2020, Felipe, de apenas nove meses, teve de ser internado, por conta de uma parada cardíaca. Revezando na UTI com a sua esposa, o atacante se utilizou da bebida para tentar esquecer os problemas da vida.
"Bebia, bebia, bebia até cair e bebia mais um pouco deitado. Só parava depois de desmaiar. Eu queria me destruir. Eu via que a qualquer momento algo grave ia acontecer comigo. E eu desejava que acontecesse, porque aquele abismo em que eu caí depois do antidoping no Santa Cruz ficou rasinho perto desse."
Com seu filho recuperado e sem sequelas, uma trombose quase fez com que o jogador perdesse sua carreira e corresse risco de vida "Uma provável complicação da covid", como relatou Raniel, fez com que ele tivesse de ser operado às pressas. Nessa hora, ele confessa que chegou até a questionar Deus.
"Fizeram a cirurgia. Me recuperei e tentei voltar a treinar, mas não dava. A trombose tinha criado uma fibrose enorme na minha perna, encurtado um tendão, e eu mal conseguia colocar o calcanhar no chão.
Sem poder fazer o que eu amo, que é jogar bola, e bebendo cada vez mais, eu percebi que podia perder não só a minha carreira, mas também meus filhos e a minha família."
VIRADA
Raniel conta que foi nesse momento que decidiu nunca mais se entregar à bebida, e carregar essa marca consigo.
A tatuagem, estampada em seu rosto (07-12-20) simboliza a data em que ele deixou de beber, a maior de suas conquistas, dentro e fora do esporte.
Contratado no início do ano pelo Vasco, o jogador ganhou uma nova oportunidade de fazer o que ama, após passar por todas as dificuldades em 2020 e 2021, e tem o objetivo de trazer o clube de volta à Série A.
Contratado principalmente por conta do técnico Zé Ricardo, Raniel está pronto para demonstrar o que dele se espera. "Estou pronto para viver o melhor ano da minha vida. Mas, não importa o que aconteça nem quantos gols eu marque na temporada, eu finalmente me sinto em paz. Você não precisa sentir pena de mim".
"Apenas me conhecer. Eu sou Raniel, camisa 9 do Vasco, tenho 25 anos, três filhos e uma esposa incrível. E desde 07-12-20, não boto uma gota de álcool na minha boca" relata Raniel.