HOMENAGEM

Espécie de rã é descoberta em Goiás recebe nome de 'Cora Coralina'

Recentemente, a escritora foi homenageada em uma espécie de peixe, uma flor e uma estrada

Thalis Araújo
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Thalis Araújo
Publicado em 10/07/2020 às 0:00 | Atualizado em 10/07/2020 às 0:10
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Rã foi encontrada em um milharal no interior de Goiás - FOTO: REPRODUÇÃO

Uma nova espécie de rã foi descoberta por pesquisadores da Unicamp, em Campinas (SP). Eles descobriram o anfíbio, de 1,5 cm, com um canto intenso, em um milharal no interior de Goiás. A descoberta viabilizou um resgate histórico da literatura brasileira. É que a rã recebeu o nome da poetisa Cora Coralina. A escritora descreveu sapos no mesmo ambiente em "Poema do Milho". A família de Cora informou ao G1 que ela gostava, realmente, de apreciar a cantoria deles.

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"São homenagens que mexem com a gente. Lá em Goiás, a casa dela fica à beira do Rio Vermelho. No rio, tem uma porção de sapos e eles cantam a noite inteira. É diferente de tudo o que é sapo. Ficam a noite inteira, e agora essa rãzinha no meio do milho. Acho formidável. Se ela estivesse viva, estaria com 130 anos e, no entanto, ainda é homenageada. É mais do que bacana", disse a filha da escritora, Vicência Bretas, de 90 anos.

A descoberta da Pseudopaludicola coracoralinae foi realizada em parceria com a Unesp de Rio Claro e a Universidade Federal de Uberlândia. O feito se tornou conhecido com a publicação do estudo na revista especializada em ciência da classificação de espécies, European Journal of Taxonomy, no dia 3 de julho.

Felipe Andrade é apaixonado por anfíbios. Ele idealizou a viagem em busca dessa nova espécie enquanto fazia seu doutorado em biologia animal pela Unicamp, que foi concluído em outubro de 2019.

"Comecei a rodar a região rural e cheguei no milharal. Dias antes caiu um temporal e formou essa poça no meio do milharal. Era o ambiente perfeito. O milharal estava na altura do joelho, a plantação era nova. Esses bichos gostam de ambientes abertos, não esperava encontrar no meio do milharal. [...] É algo fantástico, é uma sensação ímpar", contou.

Os pesquisadores identificaram variações no canto dos machos e diferenças moleculares que confirmaram a novidade, num trabalho junto com a colega Isabelle Haga e orientado por Luis Felipe Toledo, que é professor da Faculdade de Biologia e da pós-graduação em Campinas.

"Era uma população de mais de 100 indivíduos (rãs). Originalmente era cerrado, mas naquele local o cerrado virou plantação. É uma espécie menos exigente do que outras espécies do cerrado, mais resistente à mudança de ambiente. É possível que ele ocorra em outras cidades", afirma o orientador do estudo.
A nova rã é muito parecida com as outras a olho nu. Uma espécie considerada críptica. Dependem de estudos genéticos para fazer a diferenciação.

Resgate de Cora Coralina

O local da descoberta motivou a homenagem à escritora Cora Coralina. Andrade conta que queria dar o nome de uma mulher à nova espécie de rã. "Pesquisei um pouco e vi que a Cora é uma pessoa do estado e do interior ainda, uma pessoa que cresceu no campo, veio pra São Paulo e depois retornou, porque gostava muito da região. A gente estuda Cora nas aulas de português, desde pequeno. Gosto muito da poesia dela, pela simplicidade com que ela conta a vida na área rual", recorda.

Os coautores do estudo, segundo ele, aceitaram a homenagem de primeira. "Sua obra foi um divisor de águas para a poesia brasileira, amplamente reconhecida, um símbolo. Passou por muitas dificuldades na vida e, mesmo assim, conseguiu publicar a sua obra e unir as duas coisas: a poesia brasileira e a biodiversidade brasileira", destaca.

Quem foi Cora Coralina?

Ana Lins dos Guimarães Peixoto, mais conhecida como Cora Coralina, nasceu em 1889 e morreu em 1985, em Goiás. Sua paixão pela escrita surgiu ainda na adolescência, mas só conseguiu publicar seu primeiro livro aos 75 anos de idade, em 1965, o "O Poema dos Becos de Goiás e Estórias Mais". A obra de Cora foi mais reconhecida nos seus últimos anos de vida.

De acordo com Vicência Bretas, Cora foi homenageada também em uma espécie de peixe, uma flor, uma estrada e, agora, na rã do milharal de Goiás.

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