Denúncia

Na prisão domiciliar e na campanha eleitoral

Justiça investiga irregularidades no cumprimento de pena de presa que apoiou campanha de esposa do secretário de Ressocialização

Jorge Cavalcanti
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Jorge Cavalcanti
Publicado em 01/10/2014 às 11:14
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Justiça investiga irregularidades no cumprimento de pena de presa que apoiou campanha de esposa do secretário de Ressocialização - FOTO: NE10
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A 1ª Vara de Execuções Penais (VEP) do Estado investiga a denúncia de que uma detenta descumpriu as regras da prisão domiciliar, violando o perímetro monitorado por tornozeleira eletrônica, para participar da campanha eleitoral de Mônica Ribeiro, eleita vereadora de Olinda em 2012 e esposa do secretário-executivo de Ressocialização, Romero Ribeiro. Ele é o responsável pela gerência do sistema prisional de Pernambuco, a quem está vinculado o Centro de Monitoramento Eletrônico de Reeducados (Cemer). Condenada a 17 anos de prisão por planejar um homicídio, Elide Silva Santos deveria cumprir parte da pena em casa para tratar a sequela de uma cirurgia nos membros inferiores, chamada de osteotomia. Mas desrespeitou as exigências, sem que a Seres tenha comunicado as infrações à Justiça para a revogação do benefício.

Na denúncia encaminhada pelo Ministério Público de Pernambuco (MPPE) à 1ª VEP, há duas fotografias anexadas como prova do engajamento da detenta na campanha eleitoral. Em uma delas, a candidata Mônica Ribeiro aparece ladeada pelo marido secretário e por Elide Silva. A imagem foi postada nas redes sociais da condenada, ex-presidente do Sindicato dos Taxistas de Olinda e ligada à Força Sindical. “Olinda será bem representada e o Estado tem um secretário à altura de seu cargo. Obrigada meus amigos por me darem essa força e incentivo para superar tudo o que aconteceu em 2012 na minha vida”, escreveu ela, numa mensagem postada no dia 15 de setembro de 2012, poucos dias antes da eleição, agradecendo a visita do casal a sua residência.

A condenação de Elide Silva ocorreu em outubro de 2007, quatro anos depois do crime. Mas o mandado de prisão contra ela só foi expedido em janeiro de 2012, quando a sentença transitou em julgado e já não havia mais possibilidade de recurso. Ela foi presa na condição de foragida e, meses depois, já estava na prisão domiciliar, período da visita do casal Ribeiro. A investigada pela 1ª VEP foi condenada por ter planejado o assassinato de Gevanil Ferreira de Souza, no dia 3 de março de 2003. À época, a vítima era presidente do Sindicato dos Taxistas de Olinda, cargo cobiçado por Elide Silva. Segundo a acusação, ela e um amigo contrataram dois homens para executar Gevanil. Depois do crime, Elide Silva assumiu a presidência da entidade.

FORA DE CASA - Depois da eleição de Mônica Ribeiro para o primeiro mandato na Câmara de Olinda pelo PDT, a mãe de Gevanil procurou o MPPE e denunciou que Elide Silva descumpria a prisão domiciliar rotineiramente. E que chegou a ser vista por conhecidos em atos de campanha da esposa do secretário-executivo de Ressocialização. Romero Ribeiro era figura sempre presente aos eventos. Os promotores Marcellus Ugiette e Eliane Gaia ouviram o relato da mulher e o enviaram ao juiz da 1ª VEP, Luiz Rocha. “Noticiam que a detenta estaria supostamente fazendo campanha política em benefício do Cel. PM. Romero Ribeiro, secretário-executivo de Ressocialização, e sua esposa Mônica Ribeiro, então candidata a vereadora de Olinda, nos termos do depoimento”, escreveu o magistrado, no Procedimento de Controle Administrativo, de caráter investigatório.

Umas das primeiras ações do juiz foi pedir ao centro de monitoramento da Seres o histórico da detenta. Violações de perímetro e uso errado do equipamento, como mantê-lo descarregado por mais tempo do que o permitido, foram registrados por meio da tornozeleira eletrônica. Mas a 1ª VEP desconhecia as infrações até então. Elide Silva não poderia sair da residência, mas circulou até pela Avenida Conde da Boa Vista, no Recife.

OUTRO LADO - “Conhecer, eu não a conheço. Tiro fotografia com muita gente. Muito menos minha esposa sabe quem ela é.” Foi assim que o secretário-executivo de Ressocialização, no cargo há três anos e dez meses e recém-aposentado da Polícia Militar como coronel, respondeu à pergunta da reportagem se conhecia a detenta Elide Silva Santos. Em uma das duas fotografias anexadas a denúncia do MPPE à Justiça, o casal Ribeiro aparece junto da condenada por homicídio.

Ribeiro não soube responder porque as violações de perímetro cometidas pela presa durante a prisão domiciliar não foram avisadas à 1ª Vara de Execuções Penais. “Não tenho conhecimento disso. Todas as violações das cerca de 30 mil saídas (monitoradas por tornozeleira eletrônica) são comunicadas. Isso está parecendo coisa orquestrada”, retrucou.

Ao ser indagado sobre quem poderia ser o autor da orquestração, o responsável por gerenciar o sistema prisional preferiu não responder. A declaração do secretário diverge do que aponta o relatório do centro de monitoramento da Seres em mãos do juiz Luiz Rocha. “A violação da área de inclusão é notória”, diz um trecho dele. O JC ligou ontem para a Câmara de Olinda para falar com a vereadora. Mas foi informado que não havia ninguém no gabinete.
Após a denúncia feita pelo Ministério Público, a Justiça cancelou o benefício dado à detenta e ela retornou ao regime fechado, na Colônia Feminina de Abreu e Lima.

A revelação de que a Justiça investiga a participação em campanha eleitoral de uma sentenciada por homicídio, desrespeitando a prisão domiciliar, vem à tona seis dias após o JC comprovar com a divulgação de um vídeo que, no Complexo Prisional do Curado eram os detentos que transportavam as caixas de munição, com direito a acesso livre ao depósito de armas dos agentes penitenciários.

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