Justiça

Julgamento de ex-PM que matou menor no Ibura acontece nesta quarta-feira

Julgamento acontece dois anos e três meses após assassinato de Mário Andrade de Lima, de 14 anos

Margarette Andrea
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Margarette Andrea
Publicado em 10/10/2018 às 7:15
Foto: Felipe Jordão/JC Imagem
Julgamento acontece dois anos e três meses após assassinato de Mário Andrade de Lima, de 14 anos - FOTO: Foto: Felipe Jordão/JC Imagem
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Nesta quarta, dia 10 de outubro, a filha caçula da diarista Joelma Andrade de Lima, 36, completa 7 anos de idade. Mas não é só a vida de sua menina que a mãe quer comemorar. Champanhe e fogos de artifício já estão prontos para festejar um momento aguardado há mais de dois anos: a condenação do homem que tirou da família o filho mais velho, Mário Andrade de Lima, de 14 anos. O sargento reformado Luiz Fernando Borges, 52, vai a júri popular a partir das 9h, na 2ª Vara do Tribunal do Júri, no terceiro andar do Fórum Desembargador Rodolfo Aureliano, na Ilha Joana Bezerra, área central do Recife. Se for condenado, pode pegar mais de 30 anos de prisão.

O julgamento, coordenado pelo juiz Jorge Luiz dos Santos Henrique, iria acontecer no dia 24 de setembro, coincidentemente dia em que Mário faria 17 anos, mas foi adiado, sob alegação de que o advogado particular do acusado não havia sido intimado. Joelma chegou a fazer um bolo para distribuir no local. Dois ônibus foram mobilizados para levar familiares e amigos ao fórum. “Foi horrível desmarcarem. Passei mal. Tive uma sensação de raiva, de impunidade, de que a justiça não é perfeita. Mas respirei fundo e levantei a cabeça”, declara Joelma, que vai ficar cara a cara com o assassino confesso pela primeira vez.

O bolo de Mário acabou no aniversário da mãe de Joelma, Maria Eloi, que faz aniversário no mesmo dia do neto. Aliás, são sucessivas as coincidências de datas nessa história, fato que acaba marcando mais cada acontecimento. O adolescente foi enterrado no dia em que começaria no trabalho de jovem aprendiz, em 27 de julho de 2016. “Eu não entendo o que Deus quer mostrar para mim com isso”, tenta decifrar Joelma.

Se o bolo de Mário não teve sabor de festa, hoje a mãe espera que o bolo da caçula tenha um gosto diferente. “Eu espero a condenação máxima, para me livrar um pouco da dor, pois vou ter cumprido minha luta a favor do meu filho, provando que ele era um menino bom e de família”, desabafa, com a firmeza de sempre. “E mostrar a outras mães que não temos que ter medo e sim lutar pelos nosso filhos”. Ela conta que a filha mais velha tem tido problemas de depressão, pede para se juntar ao irmão e vive desenhando ela, Mário e Deus. Joelma perdeu o emprego e, com apoio de movimentos sociais, trabalha com um fiteiro em casa e segue na batalha.

O CRIME

Mário foi executado a tiros na Avenida Dois Rios, no bairro do Ibura, Zona Sul do Recife, depois da bicicleta em que estava com um amigo de 13 anos colidir com a moto do ex-PM e ferir o pé dele. O mais novo fugiu e levou três tiros, mas sobreviveu, ao se fingir de morto. Segundo testemunhas, Mário levou uma coronhada e foi executado. “Um rapaz chegou a pedir para ele não fazer aquilo, mas ele o ameaçou também”, conta Joelma. O ex-PM alegou pensar se tratar de um assalto e chegou a ligar para o 190 (número de emergência policial). Ele foi expulso da corporação e está preso em Igarassu, no Grande Recife.

“Não há a menor chance de o réu não ser condenado”, afirma, a advogada Jacqueline Martins, que atua na acusação como voluntária junto com Camila Antero. O promotor de acusação é Guilherme Castro. “É um caso explícito de execução de um jovem negro, pobre e periférico e esperamos que ele pegue mais de 30 anos de prisão”. Luiz Fernando é acusado de homicídio consumado, com a qualificação de motivo torpe, e homicídio tentado.

SEM ADIAMENTO

Jacqueline explica que não há mais possibilidade de se pedir adiamento. “Mas, se houver uma segunda escusa, defensores públicos assumem o processo e têm dez dias para vistas, então o júri terá que ser remarcado”, esclarece. “Protelar um julgamento é um mecanismo de desarticulação, mas é legal. O que não pode é baixarmos a cabeça. A luta de Joelma continua e vai além da perda de um filho, é uma luta contra o racismo, o genocídio do povo negro, um sistema que mata”.

Mário tinha planos de abrir um negócio. Ele ajudava a mãe a vender gás de cozinha, fazia bicos numa lanchonete e cursava o 8º ano em uma escola pública. Pouco antes de morrer, escreveu uma música retratando a realidade da periferia e homenageando a mãe. “Assim que terminou de escrever ele veio até a mim e disse: Mainha, eu fiz uma música pra senhora e eu vou ficar famoso com ela e aí vamos mudar de vida. Ainda tive a chance de ouvir ele cantar para mim antes de partir”. 

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