MARIA DA PENHA

Lei permite concessão de medida protetiva pela polícia e gera polêmica

O novo texto da Lei Maria da Penha prevê que delegados e policiais possam conceder medida protetiva a vítimas de violência doméstica quando o município não for sede de comarca

AMANDA RAINHERI
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AMANDA RAINHERI
Publicado em 18/05/2019 às 8:03
Felipe Ribeiro/ JC Imagem
A instituição garante que, durante todo o processo, a identidade da mulher será preservada e que o apoio também se estende aos filhos - FOTO: Felipe Ribeiro/ JC Imagem
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Juliana (nome fictício) tinha 26 anos quando foi agredida pela primeira vez pelo ex-namorado, no Agreste do Estado. Era o início de um ciclo de violência que só seria rompido 18 meses depois, quando a vítima procurou a delegacia para prestar queixa contra o agressor. A jovem entrou com pedido de medida protetiva em junho do ano passado, mas nunca recebeu retorno. Foi obrigada a mudar para outro município, para se esconder. Assim como ela, outras mulheres enfrentam dificuldades para conseguir proteção judicial contra os agressores. Na tentativa de agilizar o processo em municípios que não têm sede de comarca, uma lei foi sancionada esta semana, dando à polícia o poder de conceder medidas protetivas.

A medida passou pela Câmara dos Deputados em agosto de 2018 e foi aprovada no Senado em abril. A sanção presidencial foi dada na última segunda-feira. A alteração no texto da Lei Maria da Penha prevê a possibilidade de o agressor ser afastado do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima pelo delegado, quando o município não for sede de comarca, ou pelo policial, caso não haja delegado disponível no momento da denúncia. Antes, a medida protetiva só podia ser aplicada por um juiz. A nova lei diz ainda que a autoridade judicial deve ser comunicada da decisão em até 24h. O magistrado tem esse mesmo prazo para decidir se revoga ou mantém a decisão.

Dos 184 municípios pernambucanos, 34, além do distrito de Fernando de Noronha, não são sedes de comarcas. A maior parte, está localizada no Sertão. “A mudança vem para atender mulheres que estão mais distantes dos centros urbanos e dos serviços. O desafio é fazer com que todas conheçam e cobrem esse direito”, defende Sílvia Cordeiro, secretária da Mulher de Pernambuco.
Para a delegada Ana Elisa Sobreira, titular da Delegacia da Mulher, a lei é positiva. “Foi uma mudança importante. Nos casos de emergência, pode salvar vidas. Lembrando que esse é apenas um dos vários tipos de medida protetiva que existem. Outras, que determinam a distância em que o agressor pode ficar da vítima, por exemplo, continuam sendo concedidas somente pelo juiz.”

Nos municípios em que existe comarca, a delegacia precisa fazer o pedido ao juiz, em um prazo de 48h. “Muitas vezes, a vítima precisa voltar para casa para aguardar e lá acaba se deparando com o agressor. Agora, nos municípios que se enquadram na lei, temos a possibilidade de agilizar a tomada de decisões e afastar imediatamente o acusado”, argumenta a delegada. O Departamento de Polícia da Mulher já começou a expedir orientações às delegacias do Estado.

POLÊMICA

A decisão divide opiniões e não é vista com bons olhos pelo Poder Judiciário. “A violência doméstica é uma violação grave dos direitos humanos e merece total atenção, mas não podemos violar outros direitos e garantias. A partir do momento em que a gente admite que se entre na casa de alguém sem autorização judicial, estamos abrindo espaço para outras subversões à ordem jurídica. Respeitamos o trabalho das polícias e reconhecemos sua importância. Somos um sistema que trabalha em conjunto, mas um poder não pode invadir a esfera do outro”, argumenta Francisco Tojal, juiz da Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher do Cabo de Santo Agostinho.

A alteração na lei também é vista com preocupação pelo Instituto Maria da Penha (IMP). “A autoridade policial não pode restringir o direito de ir e vir do cidadão. Se ela não tem essa atribuição, isso pode acabar abrindo brecha para um pedido de inconstitucionalidade. A lei é bastante nova e não tem necessidade de sofrer alterações pontuais. Isso pode acabar enfraquecendo a legislação. O que as mulheres precisam é que o poder público esteja mais sensibilizado para a implementação da lei”, avalia Conceição de Maria, superintendente-geral do IMP.

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