SURTO

''Todos estão de cabelo em pé'', diz responsável por estudo de doença de Chagas

'Desde as primeiras confirmações, não conseguíamos compreender por que o surto havia ocorrido', afirmou a coordenadora do Serviço de Referência em Doença de Chagas da Fiocruz PE

Cinthya Leite
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Cinthya Leite
Publicado em 05/06/2019 às 12:00
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'Desde as primeiras confirmações, não conseguíamos compreender por que o surto havia ocorrido', afirmou a coordenadora do Serviço de Referência em Doença de Chagas da Fiocruz PE - FOTO: Foto: Cinthya Leite/JC
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Um balanço divulgado nessa terça-feira (5) pela Secretaria Estadual de Saúde (SES) revela que, entre os 77 participantes de um evento religioso realizado em abril, na cidade de Ibimirim, no Sertão de Pernambuco, expostos à microepidemia de doença de Chagas, 62 fizeram coleta de sangue para análise, realizada pelo Laboratório Central de Pernambuco (Lacen-PE), no Recife, e pelo Laboratório da 6ª Regional de Saúde, com sede em Arcoverde e que congrega 13 municípios do Sertão, incluindo Ibimirim.

Até o momento, foram confirmados 27 casos de doença de Chagas – todos em tratamento. Entre eles, 22 tiveram diagnóstico laboratorial (seis não manifestaram sintomas da enfermidade). Do total de pacientes com confirmação de Chagas, nove foram internados no Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc), em Santo Amaro, área central do Recife. Três já receberam alta, e os demais estão estáveis, com boa evolução do quadro clínico.

Diante disso, a coordenadora do Serviço de Referência em Doença de Chagas da Fiocruz PE, Virgínia Barros de Lorena, relata como tem sido colaborar com a investigação de um surto como esse, sem precedentes no Estado.

Confira a entrevista:

JC – Diante deste surto, qual o papel do Serviço de Referência em Doença de Chagas da Fiocruz Pernambuco?

Virgínia Barros de Lorena – O trabalho tem sido auxiliar o Lacen-PE, que tem todo o mérito no diagnóstico destes casos. Primeiramente, pensou-se em febre tifoide, depois em leptospirose e em malária, cujo teste rápido deu positivo na maioria das amostras. Só que ele dá reação cruzada com Chagas. E por causa dessa positividade, foi feita análise na lâmina, com uma técnica que pode tanto detectar malária quanto Chagas. Foi assim que acidentalmente se encontrou o Trypanosoma cruzi. 

 JC – Todas as amostras passam pelo serviço? 

Virgínia – Estamos recebendo especialmente os testes de pacientes que têm sintomas e continuam com o diagnóstico laboratorial negativo. Além disso, hoje (ontem, dia 4) recebemos amostras de pessoas sem sintomas, mas já apresentaram positividade no diagnóstico laboratorial. São pessoas (do surto) que foram recrutadas ou estão indo voluntariamente ao Hospital Universitário Oswaldo Cruz para ter assistência médica.

 JC – Foi surpresa identificar amostras positivas de pacientes assintomáticos?

Virgínia – A gente tem feito PCR (técnica capaz de identificar a presença do DNA do agente causador da doença em amostras de sangue) desses pacientes sem sintomas para aumentarmos a chance de diagnóstico precoce, pois eles foram expostos (à microepidemia) e não sabem se estão doentes. Na fase aguda, sintomas podem se manifestar ou não. Então, já imaginávamos que esses casos apareceriam. 

 JC – Algum detalhe deste surto chama muito a sua atenção? 

Virgínia – O surto. Apenas ele já é um alerta. Desde as primeiras confirmações, não conseguíamos compreender por que ele havia ocorrido. Na verdade, todos que trabalham com Chagas ainda estão de cabelo em pé. 

JC – Acredita na ocorrência de transmissão oral? 

Virgínia – Não dá para ser uma contaminação vetorial porque nos relatos ninguém diz ter visto o barbeiro. Os pacientes também não têm o chagoma (sinal da fase aguda da doença e que corresponde ao inchaço no local da picada). Entre o universo de 77 pessoas, 27 estarem contaminadas e nenhuma ter visto o barbeiro? Provavelmente foi alimentar. O grande problema é: será que há outras pessoas expostas a esses alimentos (possivelmente contaminados com o inseto)? É preciso considerar todas as hipóteses. 

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