“Aos noventinha, meu querido, nem tudo são flores”. Esta foi uma das primeiras frases da atriz Geninha da Rosa Borges, ao ser procurada pela reportagem, para a matéria sobre os seus 90 anos – completados nesta quinta-feira (21). Modéstia, pura modéstia. Apesar de se lamentar da idade, a dama do teatro pernambucano celebra a vida com alegria e muita disposição. Uma vida inteira dedica aos palcos e aos inúmeros personagens que deu à luz em cena. A Deus, Geninha fez um pedido – ou um acordo, como ela diz. “Pedi a ele que deixasse eu completar meus 90 anos, e ter minha festa. Depois disso ele já pode pensar em me levar.”
Entre as coxias e os camarins do imponente Teatro de Santa Isabell, Geninha se sente em casa. Todos a respeitam, a cumprimentam. Caminhando pelo lugar, bem vestida, maquiada e cheias de anéis e colares, vez ou outra, um funcionário lhe dá um abraço, grita seu nome. A atriz foi diretora do teatro por 18 anos. "Esse lugar é um dos mais importantes da minha vida. É meu porto seguro. O Santa Isabel e o Teatro de Amadores de Pernambuco são meus portos seguros."
TALENTO
Geninha defende a tese de que teatro é dom. Estudar as técnicas é por puro aperfeiçoamento. Talvez ela seja o próprio exemplo da sua afirmação. Desde pequena, ainda no Colégio de São José, no Recife, a atriz representava e declamava versos e poemas, para encanto das irmãs Doroteias, dos padre, bispos e professores. Valdemar de Oliveira descobriu Geninha em uma dessas apresentações, e logo surgiu o convite para que a jovem de 19 anos ingressasse no recém-criado Teatro de Amadores de Pernambuco (TAP). Na estreia, a atriz integrava o elenco da peça Primeirose.
Aos noventinha, meu querido, nem tudo são flores.
Geninha da Rosa Borges.
Entre os seus 80 papéis, qual o mais marcante? A senhora é rápida na resposta: Yerma. Na peça com texto do espanhol Federico García Lorca, a atriz viveu a protagonista que dá nome à montagem. E não só isso. Uma mudança no destino tirou Valdemar de Oliveira da direção do espetáculo e fez Geninha se dividir entre atriz e diretora. “No leito de morte, doutor Valdemar pediu para que eu dirigisse a peça, desse continuidade ao trabalho dele. E foi um desafio. Foi minha primeira direção. Me dediquei, e deu tudo certo.”
Se Yerma sofria por ser estéril, sofreria ainda mais se conhecesse Geninha. A capacidade da atriz em dar vida a gentes imaginadas apenas nos textos levaria a personagem à mais profunda inveja que se pode imaginar. Geninha sabe da sua competência, mas teima em ser modesta. “A gente ganha esse destaque também porque faz novela, aparece no Sudeste.” Ela fez duas participações em novelas nacionais, e no cinema participou de filmes como O coelho sai, Baile perfumado e Parahyba, mulher macho – quando foi perguntada pela diretora Tizuka Yamasaki se era a Greta Garbo do Nordeste.
Confira abaixo um vídeo exclusivo com Geninha declamando o poema Para ser grande, de Ricardo Reis, heterônimo de Fernando Pessoa.
Geninha da Rosa Borges tem uma alegria e um bom humor contagiantes. As lembranças da vida permitiriam que a entrevista rendesse dias de conversa. Ela é feliz. E está sempre aberta a trocar experiências. A vida foi doce com Geninha. E para a sorte da arte brasileira, e felicidade da atriz, Deus atendeu ao seu pedido, e hoje Geninha chega aos seus 90 anos, com reconhecimento e respeito por onde passa. Amigos, ela tem e faz questão de lembrá-los sempre. “O teatro me deu muitos amigos. E esses eu guardo com muito carinho.”
Leia a matéria completa no Caderno C desta quinta-feira (21).
