Amparo 60

Ramonn Vieitez explora melancolia e transitoriedade em nova exposição

Em Um Lugar Calmo Para Minhas Certezas, o artista trabalha com a natureza e novas mídias

João Rêgo
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João Rêgo
Publicado em 29/03/2019 às 12:47
Filipe Jordão/JC Imagem
Em Um Lugar Calmo Para Minhas Certezas, o artista trabalha com a natureza e novas mídias - FOTO: Filipe Jordão/JC Imagem
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Melancolia e transitoriedade. As obras da nova exposição do pernambucano Ramonn Vieitez, intitulada ironicamente de Um Lugar Calmo Para Minhas, trazem um pouco de cada uma dessas coisas. A mostra, com curadoria de Ton Martins, marca o retorno do artista ao Recife após três anos, e tem abertura hoje, às 19h, na galeria Amparo 60.

Se em 2016, na sua famosa série Assasinos, Ramonn concebe um minimalismo sugestivo através das máscaras usadas pelos seus modelos, agora o recurso é transportado para a totalidade do quadro. Não há, como antes, fundos negros ou ambientes urbanos. A tela é ocupada por plantas com colorações vibrantes que contrastam com a desolação de homens posicionados entre elas. O artista encontra na natureza novas formas de reinventar a dimensão enigmática das suas obras.

Esse procedimento surge, conta Ramonn, de “um olhar simbolista para o cotidiano”. Ação simples que, ainda segundo ele, não nasce a partir de uma visão “fotográfica”, mas de um processo de criação que enxerga na natureza uma fonte de inspiração.

Um exercício similar ao que o cineasta experimental Michael Snow traz para o cinema com o filme Wavelength (1967). O diretor posiciona uma câmera frente a um cômodo, durante 45 minutos, para ressignificar imagens do cotidiano através do aparelho audiovisual. Mas, enquanto o norte americano tem no registro cinematográfico contextos e limites bem traçados, Ramonn dispõe na pintura de um universo infinitamente mais possibilitador.

A realidade não é capturada e transfigurada no novo. Pelo contrário, ela é, precipuamente, concebida pela ótica criativa do artista, sem nunca deixar de parecer natural.

É dessa forma que as árvores em pinturas como Cry baby (Devil man) tornam-se violetas. E, mesmo em tom vibrante, consegue remeter a sentimentos de solidão e melancolia.

Experimentação

Um dos pontos fortes na exposição são os trabalhos inéditos do artista com outras mídias. Cactos cultivados em seu jardim, por exemplo, ganham nova vida ao receberem interferências com poliuretano, resina e tinta acrílica. Nasce a obra Bloom. “É a transformação de uma matéria em outra. O cacto morreu, mas não chegou ao fim. Ele se junta a outras coisas e se torna algo novo”, explica, Ramonn.

A peça, vale ressaltar, mesmo que resulte em algo novo no acervo do artista, surge de algo fundamental no seu trajeto como pintor. “O trabalho foi formado com a tinta seca que comecei a juntar do meu ateliê. Mesmo sendo um objeto, a base continua sendo algo que vem das pinturas” conta.

Além de Bloom, a exposição traz obras de dimensões maiores como SATVRNVS e Uma Flor Especial a Ser Cultivada – todas concebidas através do mesmo processo criativo.

Outra novidade é o trabalho com gravuras, criadas através de impressões a jato de tinta sobre papel alumínio. Um suporte incapaz de absorver a matéria, sendo necessário transferi-la para outro corpo. Algo efêmero e transitório, sempre presentes nas obras de Ramonn.

O título da exposição talvez não traduza isso de cara, mas nunca teve essa intenção. O nome Um Lugar Calmo Para Minhas Certezas surge justamente dessa ironia. “A frase é muito contraditória. Ela parece inferir certeza, mas quando você observa as obras não é bem assim”, conta Ramonn, que chegou a esse nome, junto a Ton, através dos trabalhos da pintora paulista Vânia Mignone, de quem o artista recebeu várias influências.

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