Cerâmica popular brasileira

Livro celebra legado de Mestre Manuel Eudócio

Escrita por Bruno Albertim, obra traz textos analíticos sobre o artista

Márcio Bastos
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Márcio Bastos
Publicado em 03/12/2019 às 14:03
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Escrita por Bruno Albertim, obra traz textos analíticos sobre o artista - FOTO: Divulgação
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Manuel Eudócio Rodrigues formou, junto a Vitalino, Dona Ernestina e Zé Caboclo, o quarteto seminal do pólo artístico que se estabeleceria no Alto do Moura, em Caruaru, e cuja influência foi fundamental no imaginário estético da cerâmica popular brasileira. Falecido em 2016, o mestre ganha o primeiro livro dedicado à sua obra, uma edição amplamente ilustrada e com análises ensaísticas de seu trabalho assinadas pelo jornalista e crítico Bruno Albertim. A publicação será lançada nesta quinta-feira, às 19h, na Sobrado 7, localizada no RioMar Shopping.

Projeto idealizado pela galerista Lurdinha Vasconcelos, que atuou como marchande de Manuel Eudócio, em parceria com a artista Ana Veloso, o livro ajuda a preencher uma lacuna histórica em relação à obra do artista. Apesar do reconhecimento incontestável a nível nacional, faltava um volume robusto que destrinchasse o legado do mestre, que foi condecorado como um dos Patrimônios Vivos de Pernambuco. A publicação traz um material consistente nos textos de Albertim e nas imagens originais de Eudes Santanna. A produção executiva é de Carol Silveira e 2abad Design, que também assina o projeto gráfico, feito por Gisela Abad, com a participação de Sandy Oliveira e Talita Lima.

Nascido no Alto do Moura, ele aprendeu, com a avó, louceira, técnicas para moldar o barro. Trabalhou ainda cedo na roça com o pai, mas sem deixar de lado a confecção de brinquedos com o massapé. Influenciado por Vitalino, começou a vender suas obras na feira de Caruaru e a se dedicar mais ao ofício artístico. Aos poucos, consolidou traços próprios, especialmente o colorido, que marcou suas obras.

“Assim como seus contemporâneos, a princípio ele não percebia a dimensão artística e estética daquilo que fazia, não desconfiava que aquilo era arte. As trocas com Vitalino são importantes para sua profissionalização. Mas, muita gente acha, erroneamente, que Vitalino, por ser mais velho, foi mestre de Eudócio. Ele, no entanto, era mais uma espécie de conselheiro. Cada um já tinha uma linguagem consolidada e se influenciaram mutuamente: Vitalino trabalhando mais com o barro cru e Eudócio com a profusão de cores. Inclusive, Vitalino passou a pintar os olhos de suas figuras de branco por sugestão do amigo mais novo”, pontua Bruno Albertim.

RECONHECIMENTO E AFIRMAÇÃO

O jornalista e escritor reforça ainda que o entusiasmo de figuras como a arquiteta Lina Bo Bardi em relação à cerâmica popular brasileira ajudou a consolidar os nomes dos primeiros mestres do Alto do Moura no circuito da arte. Neste contexto, Mestre Manuel Eudócio, que produziu metodicamente até a sua morte, teve um papel crucial na construção de um imaginário nordestino graças às suas representações de cenas e manifestações culturais do seu entorno.

“Mais do que um artista, Eudócio é um criador de arquétipos. Ele cristalizou algumas cenas que se tornaram clássicas não apenas para o desenvolvimento da cerâmica popular, mas para a própria ideia do que é ser nordestino. O Nordeste, até os anos 1930, não era entendido como região. Então, a partir desse recorte, começa-se a tentar entender o que seria essa cultura historicamente forjada pela cana-de-açúcar, como aponta Gilberto Freyre, que, junto a outros nomes, como Lula Cardoso Ayres, enxerga na cerâmica popular um dos elementos mais importantes para a construção dessa identidade. Com sua observação atenta das manifestações populares, como o Reisado, do qual participava, Eudócio reforça a construção desse pertencimento à região e também ajuda a preservar esse legado. Seu impacto estético foi tão grande que esses imaginários contaminaram o imaginário coletivo e as imagens continuam a ser copiadas e reproduzidas”, analisa.

Sua herança é celebrada por seus filhos, que também são artistas e mantêm em funcionamento a casa onde Eudócio viveu e produziu, em Caruaru, onde guardam seu acervo de mais de 200 obras.

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