CINEMA

Exposição revela Godard, o artista das rupturas

Mostra, em cartaz no Rio, destaca o trabalho mais recente do diretor francês, um dos mais difíceis e complexos criadores contemporâneos

Diogo Guedes
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Diogo Guedes
Publicado em 12/05/2013 às 5:54
Ana Andrade/Divulgação
FOTO: Ana Andrade/Divulgação
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Jean-Luc Godard não é um artista fácil, palatável – na verdade, em um mundo que cada vez mais valoriza o que é imediato e simples, o cineasta francês faz questão de trazer a complexidade para o centro da sua obra. Fora do campo da sua produção, ele não é nada diferente disso: Godard não se relaciona, mas, sim, joga com os outros, testa limites, propõe situações impossíveis para qualquer um. JLG, sigla pela qual ele mesmo se chama no seu filme JLG por JLG, é uma esfinge que constrói esfinges, que desafia o todo tempo seu público, e esse é o aspecto da sua vida e obra que a mostra Expô(r) Godard, em cartaz no Oi Futuro Flamengo, no Rio de Janeiro, evidencia em seus espaços.

Com curadoria dos franceses Dominique Païni e Anne Marquez, colaboradores do Centro Georges Pompidou, na França, a exposição fica no local até 30 de junho, com uma programação de debates e mostras de filmes. Nos três andares que habita – além da área externa do Oi Futuro, ocupada por cartazes –, a reunião de trabalhos privilegia um olhar sobre a produção recente do autor, feita nos últimos 30 anos. É o período em que Godard mergulha ainda mais fundo na poética da imagem e contamina seu cinema com linguagens contemporâneas, como o vídeo e a mixagem. Com a mostra, é possível entender que o hermetismo da obra do cineasta francês é do tamanho da sua importância para a história tanto do cinema quanto das artes.

Ana Andrade/Divulgação
Cartaz feito por Godard para os filmes Historie(s) du cinéma na mostra Expô(r) Godard - Ana Andrade/Divulgação
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Página de um dos livros de recortes e colagens de Godard sobre o cinema - Ana Andrade/Divulgação
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Página de um dos livros de recortes e colagens de Godard sobre o cinema - Ana Andrade/Divulgação
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Still de um dos vídeos de Godard presentes na exposição - Ana Andrade/Divulgação
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Still de um dos vídeos de Godard presentes na exposição - Ana Andrade/Divulgação
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Sala que mostra a importância do som nos filmes de Godard, com cartazes e a sonoridade do diretor - Ana Andrade/Divulgação

 

O relato que existe por trás dessa mostra diz bastante sobre a forma de criar de Godard, personalidade inquieta, iconoclástica e radical. Em 2003, junto com Païni, JLG decidiu finalmente encarar um desafio antigo que tinha proposto: pensar como expor o cinema em um museu. “Desde o início, eu já sabia que o projeto nunca se realizaria completamente”, conta Païni, que já havia feitos mostras sobre a produção de diretores como Hitchcock, Jean Cocteau e Antonioni – três dos preferidos do francês. As conversas entre o autor e o curador começaram ali, mas foram sempre conturbadas. “Foi um processo muito romântico. Quem conhece Godard sabe que ele, depois de conviver por algum tempo com alguém, sempre inventa rupturas”, explica o crítico francês.

“Ele é um artista e um intelectual das negativas”, sintetiza Païni. “Toda sua obra foi desenvolvida contra alguma coisa. Ele precisa ter diante dele um inimigo”. O problema é que, ao perceber isso, o curador francês decidiu não assumir o papel de frustrador das expectativas de JLG: passou a tornar possível, com muita dificuldade, os pedidos mais esdrúxulos do diretor. “É algo impressionante a tristeza de Godard quando ouve um ‘sim’”, revela Païni.

Depois de pegar grandes quantias de dinheiro do Pompidou e de parceiros e de mudar diversas vezes os planos da exposição que faria, o cineasta, na véspera do prazo, rompeu com o curador e fez a mostra sozinho, em 2006. “O prazer dele era o de dizer que o recusamos: ele queria a encenação da recusa. A minha morte como curador estava no roteiro da sua exposição”, conta Païni.

Travel(s) in utopia era o título da mostra, um registro da visão crítica de Godard em relação à profusão de imagens e à morte do cinema, em um formato irreproduzível em outros locais. Além disso, ele fazia no centro um retrato (injustamente perverso) da mostra que realmente queria fazer, com belas e complexas maquetes, junto a uma acusação à direção do Pompidou.

Confira o texto dos curadores para a mostra:

"Além de 50 anos de carreira cinematográfica e de uma centena de filmes, em plena atividade artística e sempre inatingível, virtuose da esquiva e do duplo presente na atualidade artística, Godard permanece uma figura indispensável do cinema passado e contemporâneo. Sua obra e sua personalidade compõem um quadro em movimento, cujo traço mais constante é sua reflexão sobre os poderes e os deveres do cinema. Seu pensamento sobre a História e sobre a arte enquanto testemunho de nosso tempo é relançada a cada novo filme e declinada sob inúmeras formas, graças à televisão, que abre seu cinema a novas propostas filosóficas e plásticas. A partir de meados dos anos 1970 até hoje, Godard desenvolve uma obra abundante englobando uma grande diversidade de práticas que podemos considerar fazerem parte de uma vasta produção multimédia evolutiva que se metamorfoseia através de múltiplos suportes (livros, trilhas sonoras, colagens, instalação...) Até seu último filme, no qual usa a técnica de 3D, ele continua a experimentar. Segundo ele, cada obra deve colocar em crise os limites do cinema e esgotar todas as possibilidades" Dominique Païni e Anne Marquez, curadores.

Leia a matéria completa no Jornal do Commercio deste domingo (12/5).

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