CRÍTICA

Trash - a esperança vem do lixo estreia no Brasil

Coprodução internacional explora cenário de miséria do País

Ernesto Barros
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Ernesto Barros
Publicado em 08/10/2014 às 6:00
Universal Pictures/Divulgação
Coprodução internacional explora cenário de miséria do País - FOTO: Universal Pictures/Divulgação
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Em 2001, a pesquisadora e crítica de cinema Ivana Bentes escreveu um ensaio em que cunhou a expressão “cosmética da fome” - em oposição à “estética da fome”, de Glauber Rocha – para definir um grupo de filmes brasileiros ambientados na favela ou em cenários marcados pela pobreza, exemplificados em filmes como Cidade de Deus, Central do Brasil e Eu tu eles, que visavam não uma reflexão crítica, como Glauber pensava, mas o espetáculo do cinema bem feito e bonito de ver.

Depois de ponto culminante com Tropa de elite, Tropa de elite 2, Cidade dos homens e Última parada 174, o mais novo exemplar da “cosmética da fome” ganhou sotaque inglês com a realização de Trash - A esperança vem do lixo, uma coprodução entre o Brasil, a Inglaterra e a Alemanha, que estreia nesta quinta-feira (9/10) em circuito nacional depois de encerrar o Festival do Rio, na noite desta terça-feira (7/10). Durante o festival, produtores e cineastas brasileiros criaram o movimento Rio: Mais Cinema, Menos Cenário para criticar abusos com o dinheiro público.

Trash é outro título que pode figurar na lista do movimento. Apesar de filmado no Rio, a produção preferiu evitar cenários conhecidos e construiu um lixão especialmente para o filme, que tem direção do inglês Stephen Daldry, de Billy Elliot e As horas. Mal comparando, Trash é o nosso Quem quer ser um milionário?, em que o miséria da Índia era o pano de fundo de uma história sobre um jovem favelado que supera a pobreza ao ganhar uma bolada num programa de TV.

No caso de Trash, a imaginação do escritor Andy Mulligan transforma três crianças faveladas em anjos da justiça. O que eles conseguem fazer é digno da atuação do ministro Joaquim Barbosa no Supremo Tribunal Federal, que mandou os acusados no escândalo do mensalão à prisão. Falado a maior parte em português, com medalhões do cinema brasileiro – Wagner Moura e Selton Mello –, e de todo o esforço de produtora paulista 02, nem por isso Trash sai da lista de filmes cujo “olhar estrangeiro” parece fazer do Brasil um lugar propício às fábulas mais absurdas.

Geralmente, fala-se em liberdade poética quando uma realidade é deixada de lado para, liricamente, expressar um recorte de uma situação complexa. Nessa metonímia, um lixão, onde a população vive sob o tacão da polícia e tem apenas uma missão católica como proteção, tenta representar o todo de um lugar. Na verdade, o filme evita citar o Rio, já que a história original não cita especificamente a cidade onde a ação se passa, apesar de que, pelos nomes dos personagens, eles parecem filipinos ou latino-americanos.

Raphael (Rickson Tevez), Gardo (Eduardo Luís) e Rato (Gabriel Weistein) se envolvem numa grande aventura quando encontram uma carteira em um lixão. Além de alguns reais, eles ficam intrigados com uma carta e um documento de um tal de José Ângelo (Wagner Moura). Nem mesmo o truculento policial Frederico (Selton Mello) é capaz de demover Raphael da ideia de seguir o mistério por trás do achado. Numa missão religiosa, eles enganam um padre (Martin Sheen) e uma assistente social (Rooney Mara) e conseguem decifrar um código com a ajuda de um presidiário (Nelson Xavier).

Exótico e fantasioso, Trash se apoia na emoção fácil dos melodramas e na pretensa malandragem dos pixotes brasileiros, que Daldry dirige com a mesma competência dos meninos de Billy Elliot e Tão forte e tão perto.

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