Cinema

Simião Martiniano é um teimoso até fora do cinema

O Camelô do Cinema está internado no HC há 17 dias, mas faz planos para novos filmes

Mateus Araújo
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Mateus Araújo
Publicado em 30/01/2015 às 6:48
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O Camelô do Cinema está internado no HC há 17 dias, mas faz planos para novos filmes - FOTO: NE10
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Simião Martiniano, o cineasta-camelô, tem dois filmes na agulha para serem filmados em 2015. Vai dirigir um roteiro próprio e depois dar as ordens na criação de um amigo, que o convidou desde o ano passado. Mas só fará tudo isso quando deixar de ser teimoso e obedecer às ordens médicas no tratamento de um problema no estômago que o levou ao internamento no Hospital das Clínicas, na Cidade Universitária, desde o dia 12. Não quis usar sonda como complemento da alimentação, ainda que seja preciso; nem sequer tomou anastesia para fazer a endoscopia. “Ele é teimoso demais”, reclama a filha Soni Moema.

Num quarto pequeno, de quatro leitos, no prédio do hospital-escola, Simião, o diretor de cinema marginal, espera o resultado da segunda endoscopia que fez ontem. Há 17 dias nas Clínicas, o senhor de 79 anos (81 anos no registro de nascimento, mas, segundo ele, os dois anos a mais foram acrescentados pelo padrasto, político no interior de Alagoas que, na época, queria um voto a mais) está magro e visivelmente abatido. Desde dezembro ele estava com dificuldade para se alimentar, não conseguia comer direito. “A gente já tinha notado ele mais magro, mas não tinha dito nada que estava sentindo dificuldade de comer. Só no início deste mês ele falou”, conta Soni, que se divide com o filho e dois irmãos para cuidar do pai no hospital. 

“Levei ele ao médio e o doutor solicitou um exame. Disse que era preciso trazê-lo para o hospital. Primeiro, fomos para a Restauração, onde fez uma endoscopia. No mesmo dia ele veio para cá. Hoje (ontem) fez uma segunda endoscopia e estamos aguardando o resultado.” O diagnóstico deve sair em até dez dias, segundo Soni. 

Nascido em União dos Palmares, Alagoas, Simião Martiniano mora na comunidade Socorro, em Jaboatão dos Guararapes, com a esposa e uma neta. Ele chegou em Pernambuco aos 27 anos, e ficou mais conhecido após o documentário biográfico Simião Martiniano, o camelô do cinema, dos cineastas pernambucanos Hilton Lacerda e Clara Angélica. Hoje aposentado, o artista ganhou fama por fazer, a duras penas e sem bons equipamentos, filmes que unem gêneros estrangeiros a elementos do Nordeste brasileiro, de maneira autoral e experimental – e ainda vendê-los no camelódromo no Bairro de São José. “Tenho umas fitas aí na bolsa pra vender. Já vendi uma, semana passada, aqui no hospital”, se apressa o diretor e exímio vendedor.

A obra de Simião é composta por oito longas: O herói trancado (1999); A rede maldita (1991); O vagabundo faixa preta (1992); A mulher e o mandacaru (1994); Traição no Sertão (1996, originalmente filmado em super-8, em 1979); A moça e o rapaz valente (1999); A valise foi trocada (2007); e, o mais recente, O show variado (2010). Todos eles, um flerte subversivo de ação, romance e melodrama. 

“Você tem que obedecer os médicos, Simião. Senão não vai melhorar”, alerta a dona de casa Carmencita Gomes de Araújo, que nas décadas passadas foi alavancada de vizinha a atriz das fitas de Simião. Embora doente, o diretor não perde o bom-humor e disposição: “Olha, você traz umas novinhas para mim?”, brinca o cineasta-camelô. “Sim. Mas tem que obedecer o médico”, responde Carmencita, em visita ao amigo. 

Cheio de planos, Simião aguarda a melhora como rocha. Inquieto, clama: “preciso de um projetor e um telão. Alugar tá caro. Quando eu sair, quero voltar a fazer a exibição dos filmes na rua”. Foi sempre assim. E, se não teimar, logo, logo voltará a ser. 

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