CINEMA

Cinema da Fundação recebe mostra Bergman 100 anos

Seis filmes dirigidos pelo cineasta e um documentário mostram seu lugar na história do cinema mundial

Ernesto Barros
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Ernesto Barros
Publicado em 10/07/2018 às 5:35
FJ Cines/Divulgação
Seis filmes dirigidos pelo cineasta e um documentário mostram seu lugar na história do cinema mundial - FOTO: FJ Cines/Divulgação
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O cinema sofreu dois grandes golpes em 30 de julho de 2007: num único dia, perdemos Ingmar Bergman e Michelangelo Antonioni, dois cineastas que mudaram a face da Sétima Arte. Mais velho que Bergman seis anos, o centenário do cineasta italiano foi comemorado em 2012. Agora, em 2018, é o centenário de Bergman, mais precisamente no próximo sábado, dia 14. Durante todo este mês, o mundo vem lembrando a carreira do maior diretor de cinema e teatro da Suécia – o Brasil, inclusive, com uma mostra itinerante de seus principais filmes. No Recife, as duas salas do Cinema da Fundação, no Derby e no Museu do Homem do Nordeste, em Casa Forte, vão exibir seis obras-primas dirigidas pelo cineasta e um documentário comemorativo do seu centenário, a partir desta quinta (12) até a quarta-feira (18) da semana que vem.

Para um cineasta que praticamente filmou por quase 60 anos – dirigiu 56 filmes –, o recorte pode ser pequeno. Mas, apesar disso, os seis filmes em questão são aqueles que ganharam maior aclamação da crítica e do público ao longo de toda a sua carreira, como também aqueles que marcaram os maiores picos de sua criatividade no cinema. Antes mesmo de escrever roteiros e passar à direção, com o longa-metragem Crise, em 1946, Bergman teve uma carreira paralela de dramaturgo. Entre 1944 e 1985, quando se aposentou do teatro, encenou nada menos que 170 peças. Foi em 1944, com 26 anos, que ele escreveu o primeiro roteiro (Tormenta, dirigido por Alf Sjöberg) e tornou-se o mais jovem diretor de teatro a assumir o Teatro Municipal de Helsinborg. A partir de 1957, ano chave de sua carreira – quando deu ao mundo as obras-primas O Sétimo Selo e Morangos Silvestres –, Bergman também realizou o seu primeiro filme para a TV, que manteve-se presente até o seu último trabalho, Sarabanda, em 2013, um epílogo da vida do casal Marianne e Johan (Liv Ullmann e Erland Josephson), de Cenas de um Casamento.

Como Bergman mostrou em Fanny e Alexander, que ele considerava o seu testamento, o cinema causou uma forte impressão desde a sua mais tenra infância. O teatro de sombras e a lanterna mágica foram, como para o alter ego Alexander, seus primeiros brinquedos de menino. “Quando fiz 10 anos, deram-me de presente meu primeiro projetor de película, que tinha uma chaminé, uma lâmpada e seu ruído. O primeiro filme que ganhei era um curta na cor sépia e nele se via uma garota dormindo num campo, que depois acordava, se desesperava e saia pelo lado direito da tela. Isso era todo o filme”, contou o cineasta na biografia Lanterna Mágica.

Apesar do trabalho intenso - uma marca de sua vida –, a carreira de Bergman ficou restrita à Suécia por cerca de 10 anos. Só a partir de 1954 é que seus filmes começaram a ganhar o mundo. Um dos primeiros países a descobrir o talento dele foi o Brasil, quando Noites de Circo foi descoberto durante o Festival Internacional de Cinema de São Paulo, realizado em fevereiro daquele ano. No ano anterior, o lançamento de Monika e o Desejo passou em branco na França. Só a partir de 1958, quando Bergman foi para Cannes com O Sétimo Selo é que seu nome ganhou o mundo. Em 1958, quando Monika e o Desejo foi redescoberto em Paris, os críticos-cineastas da Cahiers du Cinéma colocaram o filme nas alturas, como contou o crítico-pesquisador Antoine de Baecque no livro Cinefilia.

A partir dessa época, Bergman criou uma espécie de companhia de atores e técnicos, que trabalharam com ele durante dezenas de anos. O ator Gunnar Björnstrand foi escalado em 23 filmes. Em estilo e temática, Bergman trouxe para o cinema questões sobre religião – era filho de um pastor luterano de Uppsala, onde nasceu – e relacionamentos entre homens e mulheres, uma das suas maiores obsessões. Além de ter casado cinco vezes – pais de nove filhos –, o cineasta manteve longos relacionamentos com suas atrizes, entre elas Harriet Andersson, Bibi Anderson e Liv Ullmann, com quem teve uma filha e realizou 10 longas-metragens. Essa mostra é uma boa chance de se adentrar no planeta Bergman, ou Bergmanorama, como falava a crítica francesa.

PROGRAMAÇÃO

O Sétimo Selo (Det Sjunde Inseglet, 1957)
Talvez o mais imitado e parodiado filme do cineasta, esta parábola sobre a existência ou não de Deus é certamente o mais conhecido dos seus trabalhos para o cinema. Max von Sydow, ator regular de Bergman até o começo dos anos 1970, é um cavaleiro medieval do século 14 que, após 10 anos de combate, volta para casa. Nesse longo caminho entre a guerra, a peste e a miséria, o cavaleiro Antonius Block desafia a morte para uma partida de xadrez: se ganhar, fica livre; se não, morre. A partida de xadrez entre o cavaleiro e a morte, e suas discussões filosóficas, é um dos momentos maiores da carreira do cineasta. Prêmio Especial do Júri no Festival de Cannes de 1957.

Morangos Silvestres (Smultronstället, 1957)
Realizado logo após O Sétimo Selo, Morangos Silvestres mostra que Bergman tentava mudar a direção de suas questões com a religião. Neste filme, Bergman faz uma intensa jornada humanística pela memória de um homem idoso, um professor que volta à antiga universidade para receber um prêmio honorário. O professor Isak Borg (interpretado pelo lendário diretor Victor Sjostrom) viaja acompanhado da nora (Ingrid Thulin), mas é constantemente interrompido pelo passado e por imagens enigmáticas (como um homem sem rosto), fruto de sonhos e distorções de sua memória. É um dos mais queridos filmes do cineasta e modelo de estudo de personagem.

Quando Duas Mulheres Pecam (Persona, 1966)
Um dos mais fascinantes e complexos filmes da história do cinema, Persona desafiou espectadores e continuar a desafiar aqueles que o assistem com sua variedade de elementos. O filme é uma pedra angular do cinema moderno, com sua exploração sobre identidade. Livre em sua dimensão criativa, Bergman utiliza-se de sua experiência teatral, da psicologia e de técnicas visuais experimentais para fazer uma quebra cabeça sobre a relação de duas mulheres, uma atriz que deixou de falar (Liv Ullmann) e sua enfermeira (Bibi Anderson). A imagem da película queimando marcou época e também foi imitada dezenas de vezes.

Gritos e Sussuros (Viskningar och Rop, 1972)
A dor pode ser expressada em termos visuais? Esta é a pergunta que Bergman faz neste filme que se tornou uma obra-prima instantânea. De acordo com o cineasta, a cor vermelha foi escolhida para expressar a alma feminina, mas os críticos e estudiosos acreditam que a cor representa também o sofrimento, a morte e o sangue. Trata-se de um filme sobre a morte e, como tal, ritualizado nos mínimos detalhes. As irmãs Karin (Ingrid Thulin) e Maria (Liv Ullmann, que aparece também como a mãe delas) assistem ao lento desvanecimento da irmã Agnes (Harriet Anderson), que agoniza no leito de morte vítima de câncer. O filme conquistou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro e o Oscar de Melhor Fotografia (Sven Nykvist).

Sonata de Outono (Höstsonaten, 1978)
Primeiro e único encontro entre Ingrid Bergman, a atriz sueca que se tornou um patrimônio de Hollywood, e de Ingmar Bergman, o mais famoso cineasta do seu País. O filme também foi o último para o cinema da atriz, que interpreta uma pianista famosa que visita a filha (Liv Ullmann), depois de anos de ausência. As duas mulheres, apesar de reencontro civilizado, em pouco tempo passam a limpo as dores do passado, em que a filha acusa a mãe de abandono, embora ela tenha cuidado de outra filha doente. O encontro entre Ingrid e Liv resultou num verdadeiro duelo de atuação.

Fanny e Alexander (Fanny och Alexander, 1982)
Maior produção da carreira do cineasta, Fanny e Alexander é também seu último filme para o cinema (embora Bergman tenha feito também uma versão em seis partes para a TV sueca). De alguma maneira, Bergman esperou a vida inteira para fazer o filme que é um testamento e tentativa de biografia sobre a sua família e sua infância. Como o menino Alexander, como Bergman contou na sua biografia, Lanterna Mágica, desde cedo ele teve contato com cinema. Ele revê seu passado marcado pelo rigor da formação luterana, que tentou exorcizar durante toda a vida. Ganhou 4 Oscar em 1983: Melhor Filme Estrangeiro, Melhor Fotografia, Melhor Direção de Arte e Figurino.

Bergman - 100 Anos (Bergman - A Year in Life, 2018), de Jane Magnusson.
Nos passos das comemorações do centenário do cineasta, dois documentários foram lançados no último Festival de Cannes. O primeiro a chegar por aqui é este, que terá pré-estreia mundial no dia 14, quando Bergman faria 100 anos. Experiente no universo do cineasta, Jane Magnusson escolheu o ano de 1957 para situar o primeiro momento em que o cineasta conquistou o mundo, com o lançamento de O Sétimo Selo e Morangos Silvestres. Naturalmente, o filme cobre a vida inteira do cineasta, por meio de seus filme e suas maiores obsessões, como o relacionamento com as mulheres.

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