Literatura

O mundo que Cícero Dias viu

Autobiografia do artista plástico é lançada

Do JC Online
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Do JC Online
Publicado em 18/09/2011 às 6:37
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É grandiloquente alguém tomar para si a certeza de ter visto o mundo. Mas em se tratando do artista plástico pernambucano Cícero Dias (1908-2003), é possível concordar com o tanto da megalomania contida na frase. Seu mundo foi o século 20 de Hitler, da Paris ocupada, das rupturas necessárias do modernismo, de Pablo Picasso, de André Breton, do maracatu e da terra molhada da zona rural onde nasceu. Imagens que ficaram pintadas em sua memória – e na sua arte – com tintas fortes: verde canavial, vermelho sangue-de-boi e azul céu sertanejo. Sim, compostas cores tropicais, porque antes de tudo ele foi um menino de engenho.
Eu vi o mundo é a autobiografia do homem que sonhava em ser escritor – desejo que a pintura, vaidosa, não “permitiu” –, publicada agora pela Cosac Naify. O título da obra é também a metade do nome de batismo do seu trabalho mais famoso, Eu vi o mundo... Ele começava no Recife, exposto em 1931, em meio ao furor da arte moderna. Mas o público de então não era tão “moderno” para as cenas de erotismo que o artista evocava, e o trabalho acabou sofrendo depredação.
O desejo de fazer um livro memorialista era antigo em Dias. O processo de reunir as lembranças foi interrompido com a sua morte. Por isso, o jornalista e amigo do artista, Mario Hélio Gomes, sugeriu que sua mulher, a francesa Raymonde, continuasse a história onde ele havia parado. A segunda parte do livro, escrita por ela, tem um título que descreve bem o que foi a relação dos dois: Nós vimos o mundo. Altamente afetuoso, seu texto faz um contraponto interessante às memórias do pintor, dando informações que, por falta de tempo, não foram esmiuçadas.
Quem entrevistou o artista, não esquece a simbiose que ele vivia com a mulher. Dias, falastrão, sempre disposto a uma dose a mais, um homem que não se importava com as regras da idade, ônus cruel para quem viu o mundo; Raymonde, segura e atenta a regras e horários. Os dois eram Dionísio e Apolo na forma de um casal.
A edição da Cosac Naify para as memórias de Dias segue o padrão de capricho que cerca o catálogo da editora. A pesquisa para o livro resultou em notas que contextualizam personagens e passagens históricas mencionadas pelo artista. Um índice onomástico também integra a obra. As imagens que acompanham esta edição são raras: entre fotos de família de acervos pouco visitados, estão os desenhos feitos por Cícero para o balé Maracatu de Chico Rei, com argumento de Mário de Andrade. Os desenhos do figurino integram, pela primeira vez, a edição de um livro.

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