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Cícero Belmar relança o romance 'Rossellini Amou a Pensão de Dona Bombom'

A obra ficcionaliza a passagem do cineasta italiano Roberto Rossellini pelo Recife

JC Online
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Publicado em 05/05/2019 às 8:44
Foto: Carlos Lima/Divulgação
A obra ficcionaliza a passagem do cineasta italiano Roberto Rossellini pelo Recife - FOTO: Foto: Carlos Lima/Divulgação
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O escritor e jornalista Cícero Belmar já mantinha uma curiosidade particular em relação ao Recife dos anos 1950. A cidade era uma espécie de capital com hábitos interioranos, com as atividades comerciais se encerrando às 21h, após a última sessão do Cinema São Luiz. Os homens, depois de compromissos e até de visitarem as namoradas, partiam para as casas de meretrício no Bairro do Recife. Ao conversar com o pesquisador Liêdo Maranhão sobre essa vida noturna, Belmar teve um espanto: descobriu não só que o cineasta italiano Roberto Rossellini havia visitado o Recife como também que ele havia caído na farra por aqui. Era o mote perfeito para ceder ao desejo de escrever um romance sobre o período.

Publicado originalmente em 2005 e esgotado há algum tempo, o livro Rossellini Amou a Pensão de Dona Bombom ganha agora uma segunda edição. A obra , definida pelo autor como uma “declaração de amor ao Recife” será lançada na próxima terça (7/5), às 18h, na Câmara Municipal do Recife. A entrada é gratuita.

O romance parte de um evento real e de pesquisas no arquivo público para criar uma trama também de ficção sobre a passagem do cineasta por aqui. “Li numerosos jornais, fiz muitas anotações. Encontrei matérias nos jornais de 1958 dizendo que Rossellini veio filmar Geografia da Fome (livro do médico pernambucano Josué de Castro). Mas o assunto morreu quando ele partiu de volta para a Europa. Voltei a falar com Liêdo, que não sabia me dizer o que aconteceu para o diretor ter desistido da filmagem”, conta Belmar, autor de obras como Umbilina e sua Grande Rival e Aqueles Livros Não me Iludem Mais e integrante da Academia Pernambucana de Letras (APL). “Ninguém, absolutamente ninguém, sabia dizer a razão da desistência. Aí, eu entendi que, se eu quisesse, poderia inventar o motivo. Ou seja, somente a ficção poderia me dar uma resposta.”

A união entre história e ficção foi uma influência também de Rossellini, que costumava misturar atores com gente do povo nos seus filmes. “Ele, de fato, esteve num bar localizado numa travessa da Rua do Rangel e a dona da pensão se chamava dona Bombom. Era um bar, digamos, mais organizado, seleto, reservado. É exatamente o bar e a travessa da rua que descrevo no romance. Mas a dona Bombom que eu criei não é a cópia fiel da proprietária. Eu a inventei parecida com um bombonzinho”, explica Belmar.

Rossellini foi ao bar acompanhado de Aloísio Magalhães e conversou com duas mulheres enquanto bebia. “Inclusive uma delas achava engraçadíssimo ouvir o gringo falar, sem entender uma palavra de italiano ou francês”, continua Belmar. Não houve nada entre eles, mas a liberdade criativa do romance transformou as duas em mulheres belíssimas – precisavam ser, segundo o autor, para encantar um diretor que foi casado com Ingrid Bergman e teve um caso com Marilyn Monroe.

CANDOMBLÉ

Os cenários do Recife, o cineasta italiano e as meretrizes são personagens fundamentais do romance, mas Belmar também dedica um bom espaço para falar do candomblé e do esoterismo nos anos 1950. Em entrevistas para a pesquisa do livro, ele soube que alguns quartos das prostitutas tinham bonecas de Oxum, imagens de São Jorge e estátuas de Iansã. “Nas conversas fiquei sabendo que eram mais do que uma proteção. As mulheres tinham uma religiosidade, como qualquer cidadã, mas a religião de origem afro era a que estava mais acessível, a que as aceitava sem cobranças. A Igreja Católica, no Recife, não permitia que ‘mulheres da vida fácil’ entrassem no templo para se sentar ao lado das famílias tradicionais. Ou que comungassem. Se alguma igreja permitia, era raro. O Recife era conservador ao extremo”, relata o escritor. Além disso, o livro dialoga com a tradição de assombrações no Recife, citando aparições como a Galega de Santo Amaro.

A ideia de republicar Rossellini Amou a Pensão de Dona Bombom, conta Belmar, veio de conversas com seu afilhado, Gabryel, de 17 anos, sobre a capital pernambucana descrita no livro. “Gabryel ficou encantado com a cidade, que é dele. Eu emprestei o único exemplar que tinha para ele ler. O garoto ficou apaixonado”, revela Belmar. O interesse inesperado fez o próprio autor bancar essa segunda edição do romance, impressa na Cepe.

Sempre ativo na literatura, Belmar terminou recentemente a escrita de um novo livro de contos. “Se tudo der certo, sairá em 2020, pela Cepe. Também quero publicar um infantil que escrevi no final do ano passado e que li num encontro do Sesc”, revela o autor.

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