ESQUENTA MUIÉ

Aos 96 anos, mestre Sebastião Biano lança o seu primeiro álbum solo de pífano

Pifeiro que já tocou para Lampião e influenciou a Tropicália e Manguebeat mantém o mesmo entusiasmo de quando aprendeu a tocar com o seu pai

Alef Pontes
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Alef Pontes
Publicado em 11/08/2015 às 7:30
Rafael Pimenta/Divulgação
Pifeiro que já tocou para Lampião e influenciou a Tropicália e Manguebeat mantém o mesmo entusiasmo de quando aprendeu a tocar com o seu pai - FOTO: Rafael Pimenta/Divulgação
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É preciso muito otimismo para, aos 96 anos de idade, lançar seu primeiro trabalho solo. E isso o pifeiro Mestre Biano tem de sobra. O último remanescente da Banda de Pífanos de Caruaru, a mais conhecida representante do gênero, que influenciou importantes movimentos culturais como a Tropicália e o Manguebeat, lançou no último mês o disco Sebastião Biano e seu Terno Esquenta Muié.

Com nove décadas dedicadas ao pífano, o hoje um senhorzinho – que entre seus feitos já tocou para o icônico chefe do cangaço Lampião e seu bando e encantou os baianos Gilberto Gil e Caetano Veloso, nos anos 1970 –, Sebastião Biano revive sua trajetória ao lado seu maior companheiro de jornada e histórias (são muitas delas), no álbum.


Foi ainda nas brincadeiras da infância, aos cinco anos, enquanto acompanhava seu pai no roçado. em Mata Grande (AL), que teve seu primeiro contato com a música. Por acaso, como diz, sempre alegre. Agora já são 91 anos de toques e amizade com o pífano (ou pife), que toca com a mesma alegria de quando menino. “Do mesmo jeito que eu me criei, com meu pai e meus irmãos. E até hoje o pife é minha brincadeira predileta”, conta Seu Biano, com empolgação.

“Ir no mato cortar um instrumento e tocar é, sem saber ler nem ter partitura, só de pensamento, é uma coisa muito interessante. E eu, graças a Deus, sei o que é viver disso! Quando a pessoa nasce pra isso é essa alegria mesmo”, emenda.

Segundo ele, a música surgiu em sua vida da mesma maneira que segue até hoje: como uma brincadeira. E a inspiração sempre veio do cotidiano no universo rural. “Às vezes eu tirava música no canto de um pássaro ou na zoada de uma máquina. O ritmo era marcado pelo chocalho do boi”, relembra. “Naquela época, não existia isso de música ou ritmo, a gente chamava de toque”.
 
E foi assim que surgiram músicas capazes de influenciar a história da música brasileira, como A Briga do Cachorro com a Onça, Novena e Pipoca Moderna, clássicos do repertório das bandas de pífanos, que são lembradas no disco.
Esta última, inspirada em uma máquina de fazer pipoca que viu em Caruaru, chegou a atuar no surgimento do tropicalismo, quando Gil a conheceu, em maio de 1967, na Capital do Agreste. A música foi gravada no álbum Expresso 2222 (1972) e depois recebeu letra de Caetano, sendo registrada mais uma vez em Joia (1975). No movimento Manguebeat , ela ganhou corpo na rabeca de Siba Veloso, no álbum de estreia da Mestre Ambrósio.


Com 18 faixas, o álbum Sebastião Biano e Seu Terno Esquenta Muié foi lançado na última semana pelo Selo Sesc. O título do trabalho vem do nome que era dado aos conjuntos que costumam acompanhar os pífanos. Nesse caso, o “esquenta” é garantido por Renata Amaral (baixo e voz), Filpo Ribeiro (viola, rabeca, marimbau e voz) e o ex-Mestre Ambrósio Eder “O” Rocha (zabumbateria e voz). Além deles, a trupe conta ainda com o pífano de Júnior Kaboclo. Para engrossar o toque, Naná Vasconcelos participa nas percussões e André Magalhães no piano. 

Além das já citadas A Briga do Cachorro com a Onça, Novena e Pipoca Moderna, músicas como Encontro com Lampião, Pife de Girimim e Caroço de Xerém se revezam com os muitos causos e lembranças de Seu Biano para formar um fino registro, que se confunde com a própria memória do pífano. “Já são 91 anos de histórias e eu tenho fé em Deus de chegar muito adiante, até onde não der mais, sempre com o pife”, finaliza Sebastião.


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