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Arnaldo Antunes: entre o samba e o rock, ele prefere os dois

Novo disco tem apenas uma faixa que não é inédita

JOSÉ TELES
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JOSÉ TELES
Publicado em 04/07/2018 às 10:19
Fofo - Márcia Xavier/Divulgação
Novo disco tem apenas uma faixa que não é inédita - FOTO: Fofo - Márcia Xavier/Divulgação
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Nos anos 90, virou modismo o samba rock, uma variação do samba que, em sua época (anos 60), chamava-se de sambalanço, rótulo que deram ao inusitado samba de Jorge Benjor. Samba rock foi uma tirada do baiano Gordurinha (Waldeck Artur de Macedo) na letra de Chiclete com Banana, sucesso com Jackson do Pandeiro (com a mulher de Jackson, Almira Castilho, entrando na parceria). Nem foi a única a ser feita no forró. Em 1960, o alagoano Luiz Wanderley gravou o forrock Carolina (Cláudio Paraíba/João Barone). A saudável tendência nacional à antropofagia cultural. Rstuvxz - Rock Samba, de Arnaldo Antunes (Rosa Celeste), não é um disco de samba rock, e sim de samba e rock. Não a aglutinação de ritmos, mas justaposição dos dois.

O título do álbum é explicado por Arnaldo: “O nome do disco é RSTUVXZ, pela coincidência de R ser a letra inicial de rock e S a de samba. E, na sequência, o que mais vier, até o Z. O apelido, é claro, fica sendo Rock Samba”. O TUVXZ, ou o que mais vier, pode ser, por exemplo, De Trem de Carro ou a Pé, faixa meio lambada, meio samba-reggae, que agrupa um time de autores na assinatura, Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown, Marisa Monte, Pedro Baby e Pretinho da Serrinha.

Veterano do rock and roll, Arnaldo Antunes não é nenhum neófito no terreiro do samba. Ele lembra de participar de uma jam, no Aeroanta, em São Paulo, nos anos 80, de clássicos do samba com roupagem de rock. Uma roda de samba punk rock com Branco Mello, Akira S, Pamps (do Smack), Helcio Aguirra e Paulo Zinner (do Golpe de Estado). Além de cantar samba como convidados em especiais de TV, já dividiu palco com Elza Soares, uma brodagem com os Demônios da Garoa, que estão no DVD Ao Vivo Lá em Casa (com Arnaldo participando de um DVD do grupo), a parceria com Paulinho da Viola e Marisa Monte em Talismã:

“Há tempos venho alimentando a ideia de gravar um disco atritando sambas e rocks. Pensei, há algum tempo atrás (inspirado na ideia de lado A e lado B dos antigos vinis), num álbum que apresentasse uma sequência de rocks de um lado e uma de sambas do outro. A ideia tinha algo que lembrava um disco não muito conhecido do Gil, de 1978, Antologia do Samba-Choro, em que, de um lado reunia gravações originais de Germano Mathias e do outro releituras de seus sambas por Gil, numa pegada mais pop”. O projeto, no entanto, foi sendo adiado.

Arnaldo decidiu fazer finalmente o disco, lançado às vésperas de pegar a estrada com os Tribalistas. Deu-lhe vontade de cantar rocks “mais pesados, rápidos e berrados”, ao mesmo tempo alternar as faixas com sambas. Um projeto que adjetiva como bipolar: “Acentuando seus contrastes, mas também suas possíveis afinidades. Em vez de separá-los em blocos, preferi expor os curto-circuitos das transições, revezando faixas dos dois gêneros”, explicou em texto escrito, por ele, para o disco, que começa com um samba de gênero modificado, feminino, A Samba, com uma sonoridade que lembra os sambas de Fred Zeroquatro, na Mundo Livre S/A, e abrindo alas para algumas das grandes mulheres sambistas, Jovelina Pérola Negra, Dona Ivone Lara, Alcione, Clara Nunes, Elza Soares ou Clementina de Jesus. Nos vocais de apoio, Anelis Assumpção e Liniker.

TRIBALISTAS

A produção foi entregue a Curumim, que toca há anos com Arnaldo Antunes, e criou vinhetas entre as faixas dando a liga ente o samba e o rock, o primeiro deles, Se Precavê, parceria com Marcelo Fromer (o Titã, falecido em 2001), que estava nos arquivos de Arnaldo. Também composta há tempos, com o ex-Titã Paulo Miklos, é Céu Contra o Muro. Assinada por ele, Marcelo Jeneci e Ortinho, Pense Duas Vezes Antes de Esquecer, é a única não inédita no álbum. Já foi gravada pelos dois primeiros, agora ganha uma terceira, e mais pesada, versão.

A presença dos tribalistas é forte no álbum, nas parcerias com Marisa Monte e Carlinhos Brown, e Cézar Mendes (um quarto tribalista, mas apenas nas composições. Não é de palco). Um disco, por sinal, de muitas parcerias. Das 13 faixas, três foram compostas apenas por Arnaldo Antunes. André Lima, Brás Antunes (filho de Arnaldo) e Márcia Xavier, assinam músicas com ele. Desistiu de mim tem a mão da portuguesa Carminho, mais Cézar Mendes e Marisa Monte.

Rstuvxz foi gravado no Canto da Coruja, um estúdio em um sítio, perto de Piracaia, interior de São Paulo, com a banda que acompanha Arnaldo Antunes há alguns anos: André Lima (teclados), Betão Aguiar (baixo, violão), Chico Salém (guitarra, violão, guitavaco), Curumin (bateria, percussão, programações de ritmo) e Edgard Scandurra (guitarra, violão, violão de 12). Tocam também no disco, Fernando Catatau (guitarra), Leo Mendes (guitarra, violão), Rodrigo Campos (cavaquinho) e Ricardo Prado (sanfona).

O sambão para valer do disco é Também pede Bis (um samba de quadra, parceria com Cézar Mendes), que ficaria bem na voz de Paulinho da Viola, num repertório que nunca se apega à ortodoxia do gênero, em Quero Ver Você (com Brás Antunes), a citação a It’s Only Rock ‘n’ roll (But I Like It), dos Rolling Stones. Na faixa derradeira, nem samba nem rock, uma canção de ninar, Orvalhinho do Mar (com Márcia Xavier). Mais uma vez Arnaldo Antunes equilibra ousadia com acessibilidade.

 

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