tributo

Hamilton de Holanda toca Jacob do Bandolim à sua maneira

Bandolinista toca hoje com SaGrama no Quartas Musicais

JOSÉ TELES
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JOSÉ TELES
Publicado em 10/10/2018 às 13:26
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Bandolinista toca hoje com SaGrama no Quartas Musicais - FOTO: foto: Divulgação
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O bandolinista carioca Hamilton de Holanda e o SaGrama tocam juntos, hoje, às 20h, no Teatro de Santa Isabel, dentro da programação do projeto Quartas Musicais, do Conservatório Pernambucano de Música. Uma parceria vitoriosa, apresentada pela primeira vez no Festival de Inverno de Garanhuns de 2018. O repertório é dividido entre obras de Hamilton de Holanda e do SaGrama, acrescidas de composições de Sivuca e Pixinguinha, entre outros, autores. Talvez Jacob do Bandolim, já que acaba de chegar às lojas a caixa Hamilton de Holanda Toca Jacob do Bandolim (Deckdisc). No centenário de Jacob do Bandolim, completado em 12 de fevereiro de 2018, Hamilton de Holanda resolveu homenageá-lo gravando quatro discos com composições do mestre. Não é simplesmente um mestre reverenciando outro, trilhando seus diversos caminhos, nem tampouco todos os discos foram mandado às lojas ao mesmo tempo.

No dia 13 de agosto de 1969, uma quarta-feira, Jacob do Bandolim sofreu um infarto fulminante quando ia chegando em sua casa, em Jacarepaguá (RJ). Quarenta minutos antes, aconteceu um episódio emblemático. Ele se despediu de Pixinguinha, a quem tinha ido visitar para definirem as composições que o bandolinista gravaria num que disco dedicado à música do autor de Carinhoso. “O que há de mais estranho é que olhamos em volta e não encontramos um substituto no mesmo tom para este artista admirável que vem do tempo em que o rádio começava e, como todo compositor da época teve que ter emprego para sustentar suas cordas de vida”. O comentário, no Jornal Tribuna da Imprensa, é do compositor pernambucano Fernando Lobo, amigo de Jacob Pick Bittencourt.

Quase meio século depois, não se pode afirmar que tenha surgido um bandolinista igual, até porque comparações deste tipo são sempre imprecisas. No entanto, obviamente, desde 1969 surgiram grandes bandolinistas na música brasileira, para citar uns poucos nomes, Marcos César, no Recife, Armandinho Macedo, em Salvador (que apareceu para o Brasil, no mesmo 1969, ganhando um prêmio no Programa Flávio Cavalcanti), e o carioca Hamilton de Holanda. Este último sem dúvida, o bandolinista mais conhecido da MPB, e dos mais atuantes. Aos 42 anos, ele ostenta uma produção gravada que ultrapassa três dezenas de discos (estreou em 1997). Falecido aos 51 anos Jacob gravou menos álbuns (o grosso de sua obra está nos 78 rotações), em compensação acumulou um acervo de composições imenso, a maior parte inédita, tanto dele, quanto de terceiros, com ênfase no chorinho, mas passando pela valsinha, modinha, maxixes, tangos, baiões, frevos.

CONTEXTOS

Hamilton interpreta a música de Jacob do Bandolim em diferentes contextos. O primeiro deles, Jacob 10ZZ, foi lançado em 23 de abril, Dia Nacional do Choro. Em agosto, foram lançados Jacob Bossa, Jacob Black e Jacob Baby. Os quatro foram reunidos na caixa, lançada semana passada, com selo da Deckdisc. Um projeto ousado, sobretudo porque o chorinho é reduto de tradicionalistas, com viés à ortodoxia, como foi o próprio Jacob do Bandolim, que malhava Delicado, de Waldir Azevedo, e achava que o choro começava e terminava em Pixinguinha. Mas respeitava talentos. Não poupava elogios ao bandolinista recifense Luperce Miranda nem ao violonista Canhoto da Paraíba. Talvez não aprovasses os atrevimentos de Hamilton de Holanda, que leva a sua música a percorrer outras searas mas, certamente, louvaria o talento do conterrâneo.

Porém Hamilton, embora procure inovar, ao mesmo tempo não permite que os temas se distanciem demais do habitat natural. Jacob 10ZZ tem título enigmático, o “dez” é o número de cordas do bandolim com que foi gravado, e que pertenceu a Jacob. O instrumento foi cedido a Hamilton de Holanda pelo Museu Jacob do Bandolim, e não era tocado desde 1969. O approach é jazzístico, e a música é executada por um trio formado pelo bandolinista, com Guto Wirti (contrabaixo acústico) e Thiago da Serrinha. Ou seja, instrumentos que não são muito comuns ao chorinho. Nem tudo no Jacob 10ZZ é assinado pelo homenageado. Naquela Mesa, um clássico da MPB, é do filho, Sergio Bittencourt (falecido em 1979), que fez uma bela celebração ao pai e emplacou um grande sucesso em 1972, com Elizeth Cardoso, não por acaso, uma descoberta de Jacob do Bandolim. A faixa que fecha o disco, Serenata Jacarepaguá, é do próprio Hamilton de Holanda. Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio, é onde Jacob viveu a maior parte dos seus 51 anos.

TRAVA-LÍNGUA

O Voo do Besouro, do russo Rimsky Korsakov (1844/1908), está para a música erudita assim como o choro Escadaria, de Pedro Raimundo, para os tocadores de oito baixos. Ambos são espécie de trava-línguas, que testam a habilidade e intimidade do músico com o instrumento (quando tocava na Rádio Jornal, no Recife, nos anos 50, Sivuca usava O Voo do Besouro para levantar a plateia no auditório). Jacob do Bandolim criou seu próprio trava-língua, O Voo da Mosca (do LP Primas e Bordões, 1962). O tema está em Jacob Baby, quarto disco da caixa Hamilton de Holanda Toca Jacob do Bandolim. A novidade nesse álbum é os choros serem tocados em andamento moderatto. Hamilton de Holanda faz a mosca voar lentamente, assim como também em Doce de Coco ou Assanhado (presentes em todos os quatro discos).

Geralmente música para criança é tocada ou cantada, em andamento allegro ou vivace. Este tem a música mais suave da caixa, com Hamilton tocando bandolim, cavaquinho e bouzuki grego. Todas composições de Jacob. Em busca de raízes afro nem Jacob, Hamilton de Holanda aproxima-se da transgressão em Jacob Black, com o violão de Rafael dos Anjos e a percussão de Tiago da Serrinha e Luiz Augusto, que dão outra cara a 11 clássicos, e um tema de Hamilton que dá nome ao CD. Em Jacob Bossa, o Hamilton Trio (com Guto Wirti, contrabaixo, e Marcelo Caldi, piano e acordeom), mexe-se com a bossa nova e com o choro. Projeto de sete fôlegos, Jacob não recebeu homenagem melhor no ano do seu centenário.

 

 

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