Hip hop

Mach-Hommy é o nome do rap underground norte-americano

Longe dos holofotes, uma importante movimentação de rappers vem mudando a cara do hip hop. Conheça Mac-Hommy, um dos pioneiros a encabeçar essa lista

João Rêgo
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João Rêgo
Publicado em 03/01/2020 às 17:40 | Atualizado em 08/07/2020 às 14:30
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Longe dos holofotes, uma importante movimentação de rappers vem mudando a cara do hip hop. Conheça Mac-Hommy, um dos pioneiros a encabeçar essa lista - FOTO: Reprodução
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Talvez não seja anterior ao surgimento de alguns projetos mas Some Rap Songs (2018), do rapper Earl Sweatshirt, já é um marco no hip hop recente. Pela autoralidade, concisão, produção lofi detalhista e lírica direta, o disco se tornou um clássico instantâneo em meio a um mar de superproduções recicladas.

Um marco também por alcançar o “mainstream” (muito entre aspas) e consolidar processos importantes e inovadores de uma certa cena underground bastante prolífica. Isso porque a porta vem sendo aberta há um certo tempo. Em 2016, por exemplo, o rapper haitiano de Nova Jersey, Mach-Hommy, estreava com HBO [Haitian Body Odor] – disco de 18 músicas produzidas por nomes como August Fanon, Roc Marciano e Knxwledge, o principal cientista sonoro dentro das tendências recentes do rap underground.

As características já estavam ali: o lirismo posudo de rimas complexas dava lugar à lírica direta e intimista, da sutileza política à confissão sincera de vivências e problemas pessoais. O foco está no que é dito, e não especificamente da forma (mesmo que ela seja minunciosamente bem-executada). Para acompanhar, os beats são na sua maioria lofi, construídos na repetição cíclica – como inspiração maior estão J Dilla, Madlib, MF Doom e sua criação conjunta, o clássico Madvillainy.

Os samples vão do soul, jazz a instrumentais mais melódicos, o que não necessariamente adiciona dimensões melosas ou românticas às canções. O flow e a presença da própria voz do rapper é o bastante para criar novos campos semânticos; de mais fragilidade expositiva até a auto-afirmação que é comum ao gênero.

É assim que Mach-Hommy estreia, sobretudo, de maneira independente; sua liberdade artística é o que torna tudo interessante, porque sem ela nada aconteceria da mesma forma.

Essa autenticidade é o que permeia tanto seu fazer artístico como também quem o rapper costuma trabalhar em conjunto. Aparecendo, inclusive, na recente mixtape do próprio Earl Sweatshirt, Feet of Clay (2019), na sombria 4N.

Seu principal parceiro é o também rapper independente Tha God Fahim. Apesar de nas suas (raras) entrevistas para a Billboard descrever o rapper como seu oposto na forma de entender processos, suas pulsões artísticas partem do mesmo ponto inicial: a autenticidade.

Não é muito difícil traçar paralelos, mesmo que gerais, entre a sequência de Fahim, Tha Dark Shogunn Saga, e o que Mach vem construíndo recentemente. Os dois inclusive se juntaram no álbum conjunto Wide Berth (2018), que encarna e aprimora quase todas as características que os dois vinham compartilhando.

A ascensão de Mach dentro do meio vem sendo construída sem nunca abdicar dos seus métodos autorais. Dentre várias características, a face sempre coberta por um pano, a postura fechada e enigmática, a comercialização própria das suas produções, além do bloqueio (infelizmente) de sites transcreverem as letras das suas músicas. O rapper haitiano inclusive chamou a atenção do rapper e também empresário, Jay-Z.

Entender artistas como Mach é olhar também para uma importante movimentação que vem acontecendo no hip hop longe dos grandes holofotes.

A distribuição independente com as possibilidades do mundo digital vem sendo quase infinitas; como exemplo máximo, talvez, o que fez o grupo de hip hop Brockhampton em 2017, lançando três álbuns independentes em sequência.

Desse meio surgem aos montes rappers talentosos com capacidade de gerar seu próprio conteúdo de forma autoral e longe de qualquer castração contratual. Earl, como uma porta mais mainstream, vem colaborando aos montes com nomes bastante interessantes, por exemplo.

Podemos citar desde MIKE, Navy Blue a Tha God Fathim, Mavi, Your Old Droog; cada um com suas particularidades artísticas e, ainda melhor, também trabalhando entre si. Por trás, ovrkast, o interessante Alchemist, além do gênio Knxwledge são alguns dos nomes que sustentam as produções.

Novo projeto

Antes do ano terminar, Mach-Hommy fez um caminho contrário. Se antes a porta que deixou entre-aberta foi derrubada por Earl, o rapper haitiano se deixar influenciar por alguns dos seus processos (cada vez mais comum nos lançamentos recentes do rap): a concisão.

Wap Konn Jòj!, título do disco disponível nas plataformas digitais, tem apenas seis canções – uma com menos de um minuto, além de outra com pouco mais que isso (contando, inclusive, com participação do próprio Earl Sweatshirt).

As características seguem as mesmas: os versos fortes e diretos com uma produção lofi – que ganha outra roupagem a partir dos nomes que vão participando do projeto. De Your Old Droog, Tha God Fathim, Earl, e o principal deles, o rapper Quelle Chris.

Chiney Brush, composição conjunta dos dois, abre o disco quase como um resumo das proposições artísticas que Mach vem trabalhando todos esses anos; uma agressividade lírica sempre carregada de intimismo e, sobretudo, uma busca incessante por nunca parecer semelhante a qualquer coisa já feita.

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