Biografia

Ângela Maria ganha minuciosa e volumosa biografia

Cantora não interferiu no livro do escritor carioca Rodrigo Faour

JOSÉ TELES
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JOSÉ TELES
Publicado em 01/11/2015 às 9:22
Foto: Divulgação/Thiago Antunes
Cantora não interferiu no livro do escritor carioca Rodrigo Faour - FOTO: Foto: Divulgação/Thiago Antunes
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"O erro de muitos bons cantores tem sido a adesão à bossa nova. Considero que a bossa nova é uma espécie de pintura moderna: não agrada ao grande público, pois está dirigida para uma determinada camada social. A bossa nova, como muitas outras inovações tende a desaparecer muito cedo", a afirmação é da cantora Ângela Maria, em entrevista à Revista do Rádio (edição de 14 de maio de 1960). Sem saber, a Sapoti (apelido que lhe foi dado pelo presidente Getúlio Vargas), estava criando um cisma na música popular brasileira. Quem não aderiu à bossa nova passou a ser cafona (ou brega, a partir do anos 1970).

Isto foi há 55 anos. A bossa nova continua aí, e Ângela Maria também, gravando e fazendo shows, na medida que os seus 86 anos permitem. Ela ganhou uma biografia de 840 páginas (incluindo fotos, filmografia e discografia), o suficiente para contar suas idas e vindas, encontros e desencontros, sucesso e ostracismo, em 65 anos de profissão. Angela Maria ­ A Eterna Cantora do Brasil, do carioca Rodrigo Faour (Editora Record) transcende à bioografada. É igualmente a história de quase sete décadas do show business brasileiro. De uma família extremamente pobre, Abelim Maria da Cunha nasceu, em 1929, num lugarejo chamado Conceição de Macabu, distrito de Macaé, na emblemática data de 13 de maio. "Sua avó paterna, Rita Maria, era negra vinda da África e ­ naturalmente ­ escrava (posteriormente liberta). Já o avô, Marcos José, era português. Por sua vez, o avô materno, Belizário, era neto de alemão e a avó, Idalina, índia".

Síntese desta salada étnica, só podia dar numa personalidade múltipla. Generosa, avarenta, contemporizadora, brigona, insegura e decidida, é o perfil que o autor traça no livro. Na citada entrevista, à Revista do Rádio, ela anunciava o afastamento lento e gradual da vida artística, para se dedicar ao lar e ao marido Rodolfo Valentino. Deixou o marido, numa separação que fez a festa da imprensa marrom. A menina criada na religião evangélica, trocou a vida de operária para ser crooner de dancings, onde foi descoberta para o rádio. Quase simultaneamente foi contratada pela Rádio Mayrink Veiga, e pela RCA ­Victor. Estourou no primeiro 78 rotações, e dois anos depois disputaria o título de Rainha do Rádio com Emilinha Borba. Ficou em segundo, e foi coroada Princesa do Rádio. Dois anos mais tarde seria eleita Rainha, com uma votação espantosa para a época: 1,4 milhão de votos.

Rodrigo Faour é demasiadamente minucioso, detalhista, ao transcrever de matérias a notinhas, das críticas de discos das revistas e jornais da época. Ocupa páginas inteiras com as participações de Ângela Maria nos diversos programas da emissora, o que era muito comum então. "Longe de ti/minha vida é um rosário de dor/é esperar, é sofrer, é chorar/ é um certo amargor", Vrsos de Eterno Amargor (Othon Russo/Paulo Marques), lado A do segundo 78 rotações da cantora, que entrou em cena em pleno apogeu do lacrimoso bolerão mexicano, e dolorido samba­canção. "Um dia ele me chegou com o Ninguém Me Ama, eu lhe disse me desculpe, mas essa música é muito moderna. Ai veio com Menino Grande, a mesma coisa. Perdi outro sucesso", confessa Ângela Maria sobre a recusa em lançar dois clássicos do recifense Antonio Maria. Ausência de critério que a levaria a gravar discos, sobretudo entre 1965 e 1969, o que ela própria lamenta ter feito.

Mas durante os anos 1950 foi a mais popular cantora do País, antenada com o gosto do povo. Dançarinas profissionais matavam-­se ouvindo Vida de Bailarina (Chocolate/Américo Seixas), lançada por Ângela Maria em 1953. "Em Copacabana, uma moça, bailarina, atirou­-se de um 10º andar. Quando a polícia chegou ao apartamento a vitrola tocava Vida de Bailarina". Outra bailarina, no Joá (hoje bairro nobre do Rio), bebeu soda cáustica escutando a mesma canção na voz da Sapoti que, confessa ao biógrafo que, até hoje, quando canta Vida de Bailarina fica triste, porque lembra das fatalidades para as quais a canção serviu de trilha.

(Leia matéria na íntegra na edição impressa do Jornal do Commercio) 

 

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