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Fernando Tordo lança seu primeiro disco gravado no brasil

Ele, depois de 50 anos de carreira em sua terra, trocou Lisboa pelo Recife

JOSÉ TELES
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JOSÉ TELES
Publicado em 21/07/2016 às 15:17
foto: JC Imagem/Fernando da Hora
Ele, depois de 50 anos de carreira em sua terra, trocou Lisboa pelo Recife - FOTO: foto: JC Imagem/Fernando da Hora
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Há dois anos e meio o cantor e compositor português Fernando Tordo veio morar no Brasil. Bastante conhecido em seu país, com 50 anos de carreira, vários prêmios, e muito sucesso, ele não hesitou em recomeçar num país onde é um ilustre desconhecido. Desde então, manteve­se num quase anonimato. Fez uma discreta apresentação no Gabinete Português de Leitura, na Rua do Imperador, um mês depois que aportou no Recife. Ontem, apresentou­-se no navio ­escola português Sagres, que atracou no porto da cidade, a caminho do Rio, onde permanecerá durante as Olimpíadas. Amanhã, finalmente, Tordo faz, no Teatro de Santa Isabel, o primeiro concerto oficial no Brasil, com banda e participações especiais, entre estas a da cantora Thais Gullin.

Juntos cantarão Canção para Thaís, composta especial para a catarinense que ficou famosa como a namorada de Chico Buarque. Além dela, participam também a venezuelana Zacha Greige e a Banda Poética, dirigida pelo violonista Percy Marques, formada por músicos pernambucanos, segundo ele, com talento para tocar em qualquer lugar do mundo. Tordo, por sua vez, é exímio no violão e na viola caipira. No geral, o repertório enfatiza canções compostas desde sua chegada em Pernambuco, acrescentando clássicos que semeou na música do seu país nas cinco décadas em que lá atuou.

Ele faz parte de uma geração que equivale, no Brasil, à de Chico Buarque, Edu Lobo, Sidney Miller e Geraldo Vandré. Foi um dos pioneiros na música de protesto portuguesa e ganhador dos festivais de música popular, assim como aqui, muito celebrados nos anos 60 e 70. Com o letrista e poeta laureado José Carlos Ary dos Santos (1937/1984) marcou a música do seu país com canções feito Tourada, Estrela à Tarde, Cavalo à Solta, ou Novo Fado Alegre. Tem uma discografia portuguesa de mais de duas dezenas de álbuns.

Ele acrescenta agora mais dois à sua obra, o primeiro deles, Outros Cantos, dá nome a um dos CDs: "Fui compondo,surgiram as canções e o que seria apenas um CD acaba por serem dois. Um com textos meus e outro com músicas minhas e letras de poetas brasileiros. Foram feitas todas cá, no Brasil", diz Fernando Tordo, que musicou nomes como Ariano Suassuna (Meu sangue do Pragal das Altas Beiras), Carlos Drummond de Andrade (Confronto, Infatigável), Cacaso (Jogos Florais), Mário Quintana (Da Paginação), Castro Alves, Manuel Bandeira (Rondó do Capitão, Rondó dos Cavalinhos, Acalanto para John Talbot), Mauro Motta (A Flauta), e Vinícius de Moraes (Soneto de Fidelidade).

Tordo confessa que desconhecia que o Rondó do Capitão tinha uma versão com os Secos & Molhados (1973): "Alguns meses depois de ter feito a musiquinha para o pequeno e significativo poema, vim a saber que ele já tinha sido musicado por uma banda famosa do Brasil. Mantive a canção no CD porque este texto relata de forma muito bela e sutil a colaboração ­ apesar da neutralidade na Segunda Guerra Mundial ­ do Brasil com os Aliados", explica.

EXÍLIO

A mudança de Fernando Tordo para o Brasil deveu­se à discordância com os rumos que Portugal tomava na época. Nosso país era, então, uma ilha de tranquilidade, mas logo virou barco a navegar em mar revolto,situação que comenta, diplomaticamente: "Evidentemente que acompanhei os acontecimentos enquanto cidadão. Acabei sendo testemunha dessas situações muito especiais, muito raras. Foi uma coincidência, mas aqui sou um trabalhador estrangeiro, devidamente legalizado, vejo as coisas, ouço, mas não tenho opinião. A experiência que tenho de Portugal é diferente, as daqui são matérias que não conheço bem".

Famoso em sua terra, onde recebeu algumas das maiores honrarias do país, Tordo acostumou­se a ser visto e tratado como uma pessoa comum, ainda por cima um estrangeiro. Mas diz que considera a situação fascinante. O que estranha é ligar o rádio do carro e não achar a música brasileira de cantores e compositores que admira: "A gente entrar num carro e ouvir o que ouve não é agradável. Antonio Carlos Jobim, Bethânia, Hermeto Pascoal, ou Ivan Lins, de quem sou amigo há muito anos, não tocarem em seu próprio país, incomoda. Mas não me surpreende, porque em Portugal é rigorosamente a mesma coisa".

Fernando Tordo sabe que trilhará uma estrada tortuosa se quiser ser mais conhecido no Brasil, até porque o brasileiro, acentua, desconhece quase que totalmente a música portuguesa: "A maior parte das pessoas não sabe rigorosamente nada sobre a música em Portugal. A culpa não é delas, mas por falta de divulgação. Aqui se criou a ideia de que Portugal é o fado. Minha geração de compositores, durante 40 anos, ajudou o fado a ser patrimônio imaterial da humanidade. Eu sou um famoso compositor de fado em Portugal, mas o fado não é a minha música. No show canto dois ou três fados. Mas a música portuguesa não é só isso".

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