HOMENAGEM

A história de Zé Alfaiate e do Sete Flexas é a nossa história

Mestre de um dos mais tradicionais caboclinhos de Pernambuco, Zé Alfaiate morreu nesta sexta (11)

Mateus Araújo especial para o JC
Cadastrado por
Mateus Araújo
especial para o JC
Publicado em 11/11/2016 às 19:38
Heudes Regis/JC Imagem
Mestre de um dos mais tradicionais caboclinhos de Pernambuco, Zé Alfaiate morreu nesta sexta (11) - FOTO: Heudes Regis/JC Imagem
Leitura:

O olhar de um pai brilha quando vê seu filho tomar para si uma herança que não se conta por dinheiro, mas por amor. Assim sendo, lá vai Paulinho tomar para si a história dele e do pai, a história deles, que é nossa. Lá vai Paulinho tomar para si, mais do que nunca, o Caboclinho Sete Flexas, a maior riqueza e o maior amor deixado por seu Zé Alfaiate, um dos mais importantes brincantes da cultura popular de Pernambuco, que morreu nesta sexta-feira (11).

A história de seu Zé e do Sete Flexas, que é a história de Paulinho e também parte da nossa, pernambucanos, foi erguida num sonho e na luta. Nascido em Pernambuco, filho de mãe viúva (o pai morreu quando ele tinha dois anos), seu José era apaixonado por Caboclinho – folguedo que fez parte da sua memória de infância e adolescência, mas que era realidade distante porque lhe faltava dinheiro para comprar uma fantasia.

O encanto levado por uma vida inteira só se concretizou mesmo aos 40 anos, quando ele se mudou para Maceió, Alagoas, em busca de trabalho como alfaiate. Por lá, numa visita a um centro de umbanda, fez um pedido ao caboclo Sete Flexas e foi prontamente atendido. Para agradecer à entidade espiritual, José criou a tribo e deu-lhe o nome do caboclo. Nasceu na religião – como nasceram tantas outras histórias emblemáticas do nosso povo – o Sete Flexas.

“No ano seguinte botei o brinquedo na rua, lá em Maceió. Foi tudo muito simples, as roupas eram camisas de meia e tênis. Ainda assim, ganhamos o prêmio de estandarte mais bonito. Em 1970, voltei para o Recife e registrei o Sete Flexas”, lembrou Alfaiate em entrevista ao especial Pernambuco Vivo, publicado pelo Jornal do Commercio em 2013.

SETE FLEXAS

Sete Flexas, caboclo forte, entidade guerreira na religião afro-brasileira, guiou Zé Alfaiate nesse mundo. Guiou o sonho e o amor do brincante, numa vida que respirava Carnaval todos os dias. “Conheço muito ele hoje. Sempre aparece para mim. É alto, tem cabeça comprida, rosto afilado, com expressão de um índio. Ele é um caboclo sozinho, não tem uma tribo. É um caboclo mestiço.”

Sete Flexas, caboclo fiel, acompanhou seu Zé no folguedo e nas máquinas de costura, como o alfaiate ergueu sua família. E com sua família chegou aos olhos de um dos maiores nomes da dança contemporânea mundial: Pina Baush.

Paulinho Sete, o menino-bailarino que fazia os olhos do pai brilharem, foi dançar para Pina. Foi encantar a bailarina cujos passos sempre foram norteados pelo coração. Desde menino Paulinho foi criado para Sete Flexas. Desde pequeno, foi criado, com amor, para o amor do seu pai.

E seu Zé, hoje, se foi. Se encantou para um mundo do eterno. E lá vai Paulinho, tomar para si uma herança que não se conta por dinheiro, mas por amor. Lá vai Paulinho tomar para si a história dele e do pai, a história deles, que é nossa.

Últimas notícias