Bolívia garante que 'não rompe' negociações de gás com Brasil

Ainda no governo de Dilma Rousseff, os dois países chegaram a falar da necessidade de se iniciar uma renegociação sobre o preço do gás boliviano
Estadão Conteúdo
Publicado em 23/09/2016 às 14:46
Ainda no governo de Dilma Rousseff, os dois países chegaram a falar da necessidade de se iniciar uma renegociação sobre o preço do gás boliviano Foto: Heudes Regis/JC Imagem


O governo da Bolívia garante que, apesar da mudança de presidente no Brasil e dos protestos por parte de La Paz, o governo não irá romper com Brasília e muito menos no que se refere à renegociação de um acordo para a venda de gás natural. Quem garante isso é o chanceler boliviano, David Choquehuanca, de passagem por Genebra.

 No início da semana, a delegação boliviana foi uma das seis que, na Assembleia Geral da ONU em Nova Iorque, se retiraram da sala quando o presidente Michel Temer tomou a palavra para discursar. Tratava-se de um protesto contra o impeachment no Brasil. Assim que Dilma Rousseff foi afastada definitivamente, o governo boliviano mandou seu embaixador em Brasília retornar para La Paz

 Mas, gradativamente, o próprio chefe da diplomacia boliviana foi modificando o tom de suas críticas. Na semana passada, ele indicou que o retorno do embaixador em Brasília havia ocorrido apenas para que o diplomata explicasse o que estava ocorrendo no País.

 Agora, ele foi ainda mais taxativo sobre o fato de que as negociações com o Brasil serão mantidas. Segundo ele, "os ministérios correspondentes de energia devem estar coordenando essa agenda".

 Questionado pelo jornal "O Estado DE s. Paulo" se não há um rompimento, o ministro foi explícito: "Não, para quê?". "Não vamos romper", garantiu.

 Ainda no governo de Dilma Rousseff, os dois países chegaram a falar da necessidade de se iniciar uma renegociação sobre o preço do gás boliviano vendido ao Brasil. O acordo assinado em 1999 vence em 2019. Mas La Paz quer antecipar as negociações, com preços mais favoráveis. A queda no preço do barril do petróleo afetou o gás natural e, em março de 2016, a renda dos bolivianos com as vendas ao Brasil era 43% inferior ao que se praticava no início de 2015.

 Mas os bolivianos também temem que, com a produção do pré-sal, o novo acordo representa uma compra mais baixa por parte do Brasil Para a Bolívia, as exportações de gás natural para o Brasil e Argentina representam 36% do crescimento de seu PIB.

 As vendas, porém, também estão sob investigação. O gás é trazido ao Brasil pela TBG, empresa sob controle da Petrobras. A empresa também controla 2,6 mil quilômetros de gasoduto entre Corumbá (MT) e Canoas (RS). Mas, em 2014, o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Ministério Público abriram auditoria para examinar a suspeita de pagamento extra da Petrobras à YPFB em US$ 434 milhões.

 O chanceler acompanhava a visita oficial do presidente da Bolívia, Evo Morales, ao Conselho de Direitos Humanos da ONU. As declarações do chefe da diplomacia, porém, ocorreram apenas depois que a imprensa brasileira tentou em três ocasiões.

 Na primeira delas, David Choquehuanca deu a entender que não entendia a pergunta. Questionado se La Paz reconhecia o governo Temer diante de "confusões" sobre os sinais dados pelos bolivianos, ele se manteve em silêncio. Logo depois, respondeu: "Confusão para quem?", sem esclarecer.

 Na segunda tentativa, o chanceler simplesmente se manteve em silêncio e continuou caminhando. Um membro de sua delegação apenas comentou: "Viva Pelé", arrancando um sorriso do chanceler

 Na terceira tentativa, ele alegou que precisava ir ao banheiro. Mas, na quarta vez que foi abordado, finalmente se explicou. Nesta sexta-feira, Morales também cancelou uma coletiva de imprensa que havia agendado e se recusou a falar com a imprensa, alegando "falta de tempo". Para a imprensa brasileira, o presidente boliviano sugeriu: "Peçam uma entrevista".

Ausência

 Se a Bolívia não quer romper com o Brasil, o Itamaraty não enviou a embaixadora do País na ONU para presenciar o discurso de Evo Morales. Nesta sexta-feira, ele pronunciou um discurso de 45 minutos diante do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas.

 Numa sala lotada, Morales foi aplaudido de pé por algumas delegações e repleta de embaixadores. No caso do Brasil, a delegação foi representada apenas por dois diplomatas brasileiros, de escalão inferior. A embaixadora do Brasil na ONU, Regina Dunlop, não esteve presente. Contatada por telefone e mensagem, ela não respondeu.

 Numa outra reunião também na ONU organizada por Morales, o Brasil não foi convidado e o presidente boliviano explicou sua saga e seus projetos apenas a "países amigos".

 Na semana passada, o Itamaraty tampouco esteve presente na reunião do Movimento dos Países Não-Alinhados, numa cúpula organizada em Caracas e que marcou a posse de Nicolas Maduro como presidente do grupo. O Brasil é membro observador. Mas a única participação foi a do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que, numa mensagem de vídeo, demonstrou seu apoio a Maduro

 Durante seu discurso, Morales não citou a divisão entre grupos dentro do continente ou a crise brasileira. Seu ponto principal foi denunciar o governo chileno e o obstáculo criado por Santiago para garantir acesso ao mar.

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