DEBATE

Privatização da Eletrobras: é preciso pensar em preço e qualidade

Ideologia à parte, é preciso ter em mente que se não houver a venda, as empresas quebram. É hora de pensar em tarifa e qualidade

SAULO MOREIRA
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SAULO MOREIRA
Publicado em 28/08/2017 às 7:15
Foto: Wilton Júnio /Estadão Conteúdo
Ideologia à parte, é preciso ter em mente que se não houver a venda, as empresas quebram. É hora de pensar em tarifa e qualidade - FOTO: Foto: Wilton Júnio /Estadão Conteúdo
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Quando se fala em privatização, sempre haverá polêmica. Trata-se de um saudável espaço para a apresentação de argumentos, muitos construídos no terreno da ideologia. Em matéria de setor elétrico, não é diferente. Mas as reações negativas à proposta de privatização do Grupo Eletrobras, convenhamos, estão bem tímidas. É como se o caráter técnico prevalecesse ante a realidade nua e crua de que as estatais do setor elétrico brasileiro estão à beira da falência. Para o bem do País, o debate daqui para frente deve mirar três frentes.

Antes de mais nada, temos que ficar atentos ao modelo que será adotado para a desestatização. Muito provavelmente o governo ficará com uma fatia das companhias, deferente do que foi feito como Sistema Telebrás, em 1998.

Digamos que a fatia oficial seja de 40%. O governo, desta forma, terá poder de voto e de veto em decisões estratégicas. O cuidado que se precisa ter neste quesito é com os outros 60%. O pedaço privado do bolo deve ser pulverizado entre várias empresas, de maneira que um controlador não se sobreponha aos demais nem fique livre para exercer gestões predatórias, prejudiciais ao consumidor. O ideal, num raciocínio rudimentar, seria seis empresas fortes com 10%, cada. Estruturas societárias muito pulverizadas, porém, criam o risco do mais forte abocanhar os minoritários. Encontrar o equilíbrio é fundamental.

O segundo grande desafio tem caráter histórico e político. É preciso evitar que a regulação seja vulnerável à ingerências políticas. Vale lembrar que a Aneel hoje é dominada por gestores ligados ao PMDB. No governo Lula, era gente do PT. No de Dilma, fragilizado pelas própria ações, o setor foi entregue a Edison Lobão, do PMDB. Agências reguladoras são essenciais para o bom funcionamento das empresas. São elas que avaliam se os reajustes são justos, se o serviço está sendo prestado corretamente, se o nível de investimento é suficiente e por aí vai. É crucial, portanto, que sejam geridas por técnicos e não por pessoas indicadas por partidos.

O último desafio diz respeito diretamente ao bolso do consumidor: tarifas. Mas aqui é preciso um preâmbulo. Hoje, o governo usa um modelo chamado regime de cotas. É subsidiado, mas embute o risco hídrico. Toda vez que a chuva atrasa, a energia fica mais cara. Este sistema foi imposto por Dilma com a famosa Medida Provisória 579, a mesma que retirou da Chesf o poder sobre usinas antigas (menos Sobradinho). Assim, desde 2013, o custo deste risco hidrológico tem se somado ao preço subsidiado, onerando fortemente a conta de luz do consumidor. O valor da cota, portanto, não é apenas os R$ 40 o MWh, como é divulgado. Considerando prestação de serviço e o custo hidrológico, a cota vai a mais de R$ 100, o MWh.

Para completar, em 2015, Dilma, reeleita e sem saber como administrar o caos do setor elétrico, assinou outra MP, aumentando ainda mais o custo ao consumidor, incluindo não somente as cotas, mas toda a energia hídrica comprada pelas distribuidoras. A conta estimada apenas neste segundo semestre de 2017 é de R$ 20 bilhões, segundo a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). Resumindo: se no atual processo de privatização o governo, ao fazer a descotizacão, eliminar o risco hidrológico ao consumidor e equilibrar a repactuação, o preço da energia deverá cair. Caso contrário, vem tarifaço depois do leilão.
Nos próximos dias, muitos destes desafios serão encarados pelo governo e especialistas do setor. O brasileiro tem que ficar de olho porque o País está diante de uma oportunidades que não mais se repetirá.

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