Infraestrutura

BR-232: os risco e benefícios de uma PPP inédita

Ausência de pedágio não quer dizer serviço grátis. É preciso analisar bem o projeto

Giovanni Sandes
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Giovanni Sandes
Publicado em 04/10/2013 às 0:04
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A privatização sem pedágio que o Estado vai criar na BR-232, por sugestão do consórcio Odebrecht, Queiroz Galvão e Invepar, é inédita no Brasil, embora já exista em outros países. Como a ausência de pedágio não quer dizer serviço grátis, quando a consulta pública começar, na próxima segunda-feira, o importante será comparar riscos financeiros e benefícios do projeto.

O contrato será de 25 anos, uma parceria público-privada (PPP) do tipo concessão administrativa, com pagamento 100% em dinheiro público. Basicamente, a futura concessionária terá que recuperar e requalificar totalmente os 125 quilômetros da BR-232 entre Recife e Caruaru nos primeiros 2 anos e, no prazo restante, operar e manter a rodovia, além de prestar serviços como socorro mecânico, ambulâncias 24 horas e telefones de emergência na estrada.

O investimento será de R$ 495 milhões. Após os 2 primeiros anos de obras o Estado vai pagar R$ 8,9 milhões ao mês, R$ 2,456 bilhões no total.

Presidente da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), Moacyr Duarte diz que Pernambuco pode ter o primeiro projeto do gênero no Brasil. Sem criticar o modelo, ele diz que o exemplo mais conhecido no mundo é o de Portugal, que na crise global desistiu e pedagiou as estradas.

O coordenador do Observatório das Parcerias Público-Privadas (PPP Brasil), Bruno Pereira, afirma que, após todo o processo de decisão até a escolha do modelo, em geral com peso maior no benefício de oferecer à população uma estrada de elevado padrão de qualidade, a questão é analisar os riscos.

“Por exemplo, como o Estado vai calcular a receita da concessinária? Uma forma é criar uma praça de pedágio fictícia, uma câmera para contar os carros que passam. Outra é criar indicadores de desempenho, atribuindo uma nota, oito, sete, nove”, explica Bruno Pereira.

O governo diz que Minas Gerais e Ceará têm projetos similares em licitação. E que o estudo foi validado pela Projetec Consultoria, que atuou na fiscalização e desenvolvimento de projetos como a Adutora do Agreste, terrenos da Fiat, Centro de Convenções e em Suape.

Na BR-232, o governo diz que a Projetec analisou rentabilidade (Taxa Interna de Retorno), investimento (observando tabelas de custos e parâmetros de outras concessões) e custos da operação, em rodovias como BR-101 (BA) e BR-116 (MG).

PORTUGAL

Falar em concessão rodoviária sem pedágio leva técnicos, empresários e até o próprio governo a citar o caso de Portugal. O país europeu em 1997 criou as Scuts, estradas privatizadas sem cobrança aos motoristas. Porém, em 2011, 14 anos depois de implantadas, as Scuts foram extintas por serem caras demais para um governo atingido em cheio pela crise internacional.

Em 2011, último ano das Scuts, elas custaram a Portugal 1,94 bilhão. Eduardo Jordão, professor da FGV Direito Rio e especialista em direito administrativo, diz que esses contratos têm benefícios: manutenção da qualidade da rodovia e estímulo ao desenvolvimento e obras e serviços pagas no longo prazo pelo poder público. Mas há riscos econômicos e jurídicos.

“O fato é que, ainda que de forma diferida no tempo, o poder público terá que arcar sozinho com os custos da obra e isso poderá comprometer as suas finanças. Esta foi uma das principais razões das críticas que se fizeram em Portugal a este modelo. A certo ponto, os gastos com as rodovias não pedagiadas ultrapassavam metade do orçamento anual do Ministério dos Transportes”, conta Jordão.

Ele diz ser possível questionar o fato de que no pedágio, só quem usa paga, enquanto sem a tarifa todos os contribuintes bancam a conta. E como a lei tem um teto de gastos com PPPs, um contrato pode impedir a criação de concessões em tese mais úteis do que a concessão rodoviária.

Em nota, o governo diz ter buscado base na modelagem jurídica de experiências em Portugal e Inglaterra, “mas com variantes mais adequadas à realidade brasileira e evitando os problemas que ocorreram em algumas dessas concessões administrativas.”

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