A discussão sobre a existência ou não de bolha imobiliária voltou forte. O foco, no entanto, mudou. Além da velha questão sobre o mercado residencial, onde os preços desaceleraram um pouco, o debate passou também para o mercado corporativo, de aluguel e vendas de salas comerciais.
Após um período de euforia do mercado, com a construção de vários empresariais no boom econômico brasileiro e local, especialmente por causa de Suape, corretores relatam uma desaceleração na demada. Mesmo assim, quem entende da área diz que não há bolha e sim uma mudança de ritmo de vendas: o retorno financeiro exigirá demora e mais paciência. Trata-se de um mercado forte, que sempre tende a se expandir com o crescimento econômico.
O JC buscou empresários, estudiosos e até a Caixa Econômica Federal para falar do assunto. Confira, a seguir, trechos da reportagem, com as diferentes visões de especialistas sobre o mercado imobiliário.
A íntegra da reportagem você confere na edição impressa do JC desta terça-feira (22).
CORRETORES
Gerente geral da DMC Imóveis, Inácio Junior constata uma maior vacância dos edifícios corporativos. “Mas está muito distante de uma bolha”, ressalta. “A questão é que o mercado viu uma lacuna e todo mundo correu para atender essa demanda. Vários prédios estão ficando prontos ao mesmo tempo e muita gente correu para esses imóveis pensando no aluguel”, observa.
Frederico Mendonça, da imobiliária Arrecifes, é autor de vários livros a respeito de temas da área, como avaliação de imóveis, e teve textos publicados até no México e Estados Unidos. “O que acontece no Brasil é muito diferente dos Estados Unidos, onde os financiamentos imobiliários correspondiam a quase 70% do Produto Interno Bruto (PIB). Por aqui, não chega a 10%”, diz ele. “Nós temos muita oferta de crédito, mas com uma liberação do dinheiro feita de forma muito responsável”, afirma.
No segmento residencial, diz Mendonça, há uma “gordura” nos preços. “Digamos que um imóvel valia R$ 100 mil e subiu para R$ 200 mil. Disso, R$ 30 mil é gordura, não valorização real”, afirma Frederico.
Quando ao segmento empresarial, relata, já existe dificuldade de negociação. “No Recife, os imóveis com mais dificuldade são os empresariais, que já estão sofrendo tanto para aluguel quanto para venda”, reforça Mendonça. “Não estou dizendo que quem comprou já perdeu dinheiro. Mas o retorno não vai ser como as pessoas acreditavam, compra em um dia, vende no outro. O retorno voltou a ser de longo prazo”, comenta.
POP
O economista Luis Carlos Ewald, famoso como o Senhor Dinheiro do programa Fantástico, acredita que este será o ano da queda do mercado imobiliário. “Meu conselho é que quem comprou seu imóvel durante a expansão trate de vender rápido. E quem não comprou imóvel, não compre agora. Espera, que depois da Copa o bicho vai pegar”, frisa. Ewald lembra que, em 2013, o Nobel de Economia Robert Schiller disse não ver motivos para a recente disparada nos preços de imóveis no Brasil. O Senhor Dinheiro comprou a ideia.
“Não existe nenhum ativo que possa aumentar 200%, 300% em quatro anos. Quando isso acontece, alguma coisa está errada”, defende.
E completa: “Só quem acha que o Brasil está bom para investir é a presidente da República, Dilma Rousseff. O estrangeiro não acredita mais nisso não”, avalia o economista.
PESQUISADORES
Os pesquisadores Mario Jorge de Mendonça e Adolfo Sachsida, economistas, há um ano e meio produziram um estudo para o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), do governo federal, intitulado “Existe bolha imobiliária no Brasil?”. Em resumo, eles acreditam haver indício de formação de bolha no Brasil. Procurados pelo JC, eles dizem manter o mesmo entendimento. “A experiência tem mostrado que recorrentemente as crises econômicas têm sua origem no crescimento excessivo do crédito bancário insuflado de alguma forma pelo governo”, comenta Mário Jorge.
A crise de 2008 nos EUA, explica o economista, ocorreu sobretudo por duas questões: longo período de juros baixos e um mercado pressionado para oferecer crédito à baixa renda com menores exigências. “O número desses contratos mais que dobrou entre 2001 e 2004. O castelo de cartas começou a desmoronar com o retorno da inflação”, relata Mário Jorge. Na época, os juros americanos saltaram de 1% ao ano, em 2004, para 5,25% ao ano, em 2006.
DIFERENÇA
Mas há uma diferença básica: o mercado imobiliário tem muito mais peso na economia americana do que no Brasil. Por outro lado, pondera o pesquisador, no Brasil o setor imobiliário foi induzido pelo governo federal a aumentar as apostas no setor.
Segundo Mário Jorge, somando incentivos e a realização da Copa e das Olimpíadas 2016 no Brasil, a consequência foi o “crescimento espantoso” de preços, que fez as pessoas passarem a comprar imóveis para revender mais caro. “No entanto, o contexto econômico atual é bem diferente do que existia no Brasil em 2008. Temos hoje um cenário de inflação conjugado com um baixo crescimento”, observa.
O resultado, diz ele, é o acúmulo de estoques, redução de lançamentos e um desempenho fraco das ações de construtoras. “Não há como prever até onde os preços vão subir. Acredito que devido à Copa o preço do imóvel poderá se sustentar ou até mesmo aumentar nas principais cidades-sedes dos eventos esportivos. Mas isso não pode persistir indefinidamente. Cedo ou tarde haverá o ajuste”, argumenta.
“Do lado do cidadão, meu conselho é que a compra do imóvel deve ser estar direcionada mais no sentido de servir como residência que do propósito de investimento. Ainda assim, deve ponderar se de fato vale a pena sair do aluguel”, opina o economista.
MERCADO
Presidente da Câmara Brasileira da Indústria de Construção (CBIC), Paulo Safady Simão reclama do retorno frequente ao debate sobre bolha imobiliária, uma discussão que ele considera esgotada. “É uma coisa tão clara. Temos um mercado rigorosamente sob controle, longe de níveis que possam sugerir uma bolha. Não vejo o menor sentido nessas previsões. Nosso mercado é muito saudável”, afirma Paulo Safady.
Longe de economias que tiveram problemas com bolhas imobiliárias, diz ele, o Brasil tem o equivalente a menos de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) em crédito imobiliário. Economias como os Estados Unidos, em 2012, tinham no crédito habitacional quase 70% do PIB.
“Além disso, no pós-bolha dos EUA houve um alerta geral no mundo. As instituições se protegeram”, enfatiza.
“Quando se falha em bolha, na verdade, há um desserviço ao mercado imobiliário”, critica.
O presidente da CBIC argumenta que preços altos, ao contrário do que reza a crença popular, não podem ser traduzidos imediatamente como sinal de problemas na saúde do próprio mercado.
“Em Brasília e Rio de Janeiro, por exemplo, houve superaquecimento de preços. Mas que inclusive já se realinhou. O próprio mercado corrige essas distorções de preços, evitando especulação”, detalha o presidente.
Ele diz que, também durante a crise iniciada em 2008 e 2009, grandes incorporadoras que fizeram sua abertura de capital (no mercado financeiro, o IPO), com seus bancos de terrenos para desenvolvimento futuro, também readequaram seu ritmo de vendas.
“Deveríamos combater não as pessoas, mas o argumento, a leitura de que temos uma bolha imobiliária no Brasil”, afirma Paulo Safady Simão.