criminalidade

Entidade combate violência com ajuda de ex-criminosos nos EUA

Representantes da Cure Violence estiveram no Recife e explicaram como funciona o processo

Jorge Cavalcanti
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Publicado em 08/06/2014 às 8:24
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Representantes da Cure Violence estiveram no Recife e explicaram como funciona o processo - FOTO: Divulgação
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“A violência extrema também é um problema de saúde. E tem muitas características de qualquer outra epidemia. É preciso evitar a transmissão”, define Brent Decker, diretor internacional da Cure Violence, entidade norte-americana cujo único objetivo é reduzir os assassinatos consequentes das brigas entre gangues rivais. Na manhã da última quarta-feira, Brent explicou para estudantes da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) a filosofia e o método de trabalho da instituição idealizada em 2001, período considerado o mais violento desde que o gângster Al Capone (1899-1947), conhecido como Scarface, reinventou o mundo do crime nos Estados Unidos.

A Cure Violence (curando a violência, na tradução livre) surgiu no distrito de West Garfield, em Chicago. Os índices assustadores de homicídios incomodavam o médico epidemiologista Gary Slutkin. Em busca do antídoto, ele passou a analisar a criminalidade com o olhar do profissional de saúde. Até identificar e definir três estágios do fenômeno que precisariam ser alcançados: interrupção da transmissão da doença; redução dos riscos e mudança de normas comunitárias.

A partir daí, Gary concebeu a figura dos “interruptores”, pessoas nascidas e criadas nos próprios guetos, com histórico conturbado, como ex-presidiários, mas que decidiram mudar de lado. E agora são imprescindíveis na tarefa de quebrar o ciclo da violência, por fim à transmissão epidêmica. Funcionam como a imunização contra os homicídios desde que passaram a trabalhar como mediadores entre as gangues inimigas.

Ironicamente, quanto mais extensa a ficha criminal do interruptor, maior é a sua credibilidade diante dos membros dos bandos. “É a chave do sucesso. Eles têm a autoridade para evitar tiroteios e dizer que a violência ali, naquele momento, não é aceitável”, garante Brent.

Além de evitar a guerra do tráfico de drogas, aos interruptores também é colocado o desafio de conter os homicídios motivados por vingança. “Há lugares inseguros por causa da luta pelo domínio do território para a venda de drogas, como heroína e metanfetamina. Mas também há muitos locais onde a violência tem fatores culturais, não estão vinculados ao tráfico. Quando um grupo perde algum membro, um amigo ou parente, quer provocar baixas também no outro lado”, explica o diretor da organização.

Tentando buscar um paralelo com a realidade pernambucana, os homicídios por vingança citados por Brent são movidos pela mesma lógica que alimentou a guerra entre as famílias Ferraz e Novaes em Floresta, no Sertão. O combate foi deflagrado em 1913, com a disputa pelo poder político da cidade. E atingiu o ápice na década de 1990, já sem um objetivo claramente delineado, a não ser lavar a honra com sangue.

Mediar para conter a batalha iminente é só o primeiro – e o mais importante – estágio proposto pela Cure Violence. Paralelamente, a organização desenvolve atividades com os moradores para atingir as duas outras etapas: redução dos riscos e mudança das normas comunitárias. Basquete, churrasco e palestras são algumas delas.

A Cure Violence é financiada por convênios com entidades privadas e poder público. E hoje tem centenas de interruptores pelo mundo. Quinhentos e vinte apenas nas cidades de Chicago e Nova Iorque. Todos recebem salário, como um funcionário de uma empresa, com a diferença de que não possuem horário de trabalho fixo. Estão sempre de prontidão para cessar um tiroteio ou evitar uma vingança.

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