Acordo

Diplomacia francesa e a missão impossível de obter um acordo climático

A batalha estava longe de ser vencida de antemão já que a França é um dos países mais nuclearizados do mundo

Da AFP
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Publicado em 12/12/2015 às 17:23
Foto: FRANCOIS GUILLOT / AFP
A batalha estava longe de ser vencida de antemão já que a França é um dos países mais nuclearizados do mundo - FOTO: Foto: FRANCOIS GUILLOT / AFP
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Conseguir um acordo contra a mudança climática que conciliasse as posições de 195 países em um mundo multipolar era uma missão quase impossível que a França e sua diplomacia conseguiram cumprir com sucesso, segundo as delegações presentes na COP21.

"Habilidade para preservar a boa vontade de todas as partes para conduzir a um acordo": o elogio foi feita pela venezuelana Claudia Salerno, uma das negociadoras mais respeitas - e temidas - por seu antagonismo à posição francesa.

O elogio consagra Laurent Fabius, o chanceler francês a quem o presidente François Hollande confiou a missão de levar a um bom termo as difíceis negociações.

Fabius conteve com dificuldade as lágrimas quando apresentou o acordo para sua aprovação aos ministros de 195 países. Horas depois, dava o golpe de martelo que marcou o histórico momento. "É um martelo pequeno, mas acho que pode fazer grandes coisas", brincou, desencadeando uma salva de palmas no salão de Le Bourget.

A batalha estava longe de ser vencida de antemão. A França, um dos países mais nuclearizados do mundo, não goza de uma imagem particularmente verde, menos, em todo caso, que suas vizinhas Alemanha, Espanha ou Itália, mais adiantadas na conversão para energias renováveis.

As negociações arrastavam, além disso, o peso do fracasso da conferencia de Copenhague em 2009 para alcançar um acordo capaz de frear uma catastrófica mudança climática.

E este ano as três reuniões preparatórias em Bonn quase não produziu resultados: nada estava garantido para um acordo em dezembro, em Paris.


- Volta ao mundo climática  -

A França metodicamente mobilizou sua chancelaria a serviço da causa climática. Fabius realizou mais de cem viagens vinculadas ao tema e realizou cerca de 400 reuniões bilaterais em 18 meses.

Doze viagens a Pequim, quatro à Arábia Saudita e e outras tantas a Nova Délhi. Dias antes da COP, viajou de novo à Índia e visitou a África do Sul e o Brasil.

Nessa "volta ao mundo climática", o chanceler soube captar um movimento de esperança de todas as sociedades e dos governos, e também dos particulares e das empresas.

Ao contrário de Copenhage, o clima atual não era de guerra fria ou conflitos bélicos. E a França, com sua tradição universalista, acabou sendo um interlocutor legítimo na defesa de "uma causa comum".

 

- Como ouvir a todos -

Duas semanas antes do início da COP21, França sufreu o pior ataque terrorista em seu território desde a Segunda Guerra Mundial. O socialista Hollande declarou guerra ao terrorismo, decretou estado de emergência e ignoru o líder opositor de direita Nicolas Sarkozy para que adiasse a cúpula.

Hollande e a COP21 se beneficiaram do enorme movimento mundial que gerou essa adversidade. Os chefes de Estado e de governo, de Barack Obama a Vladimir Putin, fizeram da luta contra o terrorismo e a mudança climática uma causa comum.

Mas não foi suficiente: dois dias depois de iniciada a COP21, os obstáculos que há anos bloqueavam as negociações pareciam intactos.

Foi então que a estratégia negociadora francesa fez a diferença. Desde o princípio, os delegados ficaram sensibilizados a uma presidência de Fabius que se mostrava disposto a ouvir a todos.

Individualmente ou em grupos grandes e pequenos, Fabius e sua embajadora para el Clima, Laurence Tubiana, foram tecendo o rascunho e eliminando os colchetes sem dar a sensação de que alguns países ficavam pelo caminho.

Fabius usou a palavra zulu "Indaba" para designar as reuniões informais, um gesto simpático dirigido à África do Sul, geralmente à frente de um G77 confrontativo. Designou "facilitadores" à frente dos grupos de negociação diplomatas de países não necessariamente simpáticos à causa do acordo: a ministra brasileira do Meio Ambiente Izabella Teixeira ou a própria Claudia Salerno.

"É difícil para um britânico admitir, mas os franceses conduziram as negociações de maneira brilhante", admitiu Geoffrey Lean, jornalista decano das conferências COP. 

"Foi a diplomacia mais hábil que vi em mais de duas décadas nessa área", comentou, por sua vez, o ex-vice-presidente americano Al Gore, veterano da causa ambientalista.

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