Crise humanitária

Mais de 300.000 rohingyas fugiram para Bangladesh diante de 'limpeza étnica'

Repressão violenta do exército de Mianmar contra os muçulmanos rohingyas tem gerado o número alto de refugiados para Bangladesh

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Publicado em 11/09/2017 às 22:42
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Repressão violenta do exército de Mianmar contra os muçulmanos rohingyas tem gerado o número alto de refugiados para Bangladesh - FOTO: K.M. ASAD / AFP
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O número de muçulmanos rohingyas que se refugiaram em Bangladesh para escapar da violência em Mianmar superou a barreira de 300.000 em pouco mais de duas semanas, estimou nesta segunda-feira a ONU, denunciando um "exemplo clássico de limpeza étnica".

Neste contexto, o Dalai Lama em pessoa pediu à líder de fato de Mianmar, a prêmio Nobel da Paz Aung Sang Suu Kyi, que encontre uma solução para os rohingyas, a comunidade apátrida mais importante do mundo com um milhão de pessoas.

O Conselho de Segurança da ONU analisará a situação na quarta-feira a pedido do Reino Unido e da Suécia, anunciou em Nova York a delegação da Etiópia, que exerce a presidência de turno do órgão executivo das Nações Unidas.

"Calculamos em 313.000 o número de rohingyas que entraram em Bangladesh desde 25 de agosto", afirmou à AFP Joseph Tripura, porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur).

A Casa Branca, por sua vez, se declarou "profundamente preocupada" com a crise envolvendo os rohingyas, mas não questionou o governo de Aung San Suu Kyi.

O fluxo de rohingyas fugindo a pé, enfrentando lama e chuva, parece ter diminuído nos últimos dias, após um pico na semana passada. Mas Bangladesh enfrenta agora uma crise humanitária, com campos de refugiados superlotados.

No total, se forem incluídos os rohingyas que foram obrigados a deixar seu lares pelas explosões de violência anteriores, teria ao menos 600.000 rohingyas em Mianmar, estimativas difíceis de confirmar com precisão, adverte a ONU.

Tudo começou em 25 de agosto com ataques de rebeldes rohingyas a postos policiais, o que desencadeou a repressão do Exército. Ao menos 500 pessoas morreram, a maior parte dessa minoria muçulmana, segundo o Exército. A ONU evoca o dobro de mortos, povoados incendiados e violência.

Os rebeldes declararam no domingo um cessar-fogo unilateral de um mês, mas o governo birmanês respondeu que não negociava com "terroristas".

"Como Mianmar rejeitou o acesso aos investigadores de direitos humanos, a situação atual não pode ser completamente avaliada, mas a situação parece ser um exemplo de livro didático de limpeza étnica", declarou, na abertura da 36ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU em Genebra, o Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Zeid Ra'ad Al Hussein.

- "Execuções extrajudiciais" -

"Recebemos múltiplas informações e imagens de satélite que mostram as forças de segurança e as milícias locais incendiando vilarejos rohingyas, assim como informações coerentes que citam execuções extrajudiciais, incluindo tiros contra civis em fuga", completou.

Testemunhos neste sentido também foram recolhidos pela AFP.

O Alto Comissariado pediu ao governo birmanês "que acabe com a sua cruel operação militar" e com "as discriminações generalizadas" das quais os rohingyas são objeto.

O Dalai Lama, líder espiritual dos tibetanos e admirado por Aung San Suu Kyi, urgiu que seja instaurado "um espírito de paz e reconciliação" em seu país, em uma carta que a AFP pôde ler.

Por enquanto, Aung San Suu Kyi, criticada a nível internacional por sua frieza sobre o tema, não reagiu.

As Forças Armadas birmanesas, comandadas por ex-responsáveis da junta que se autodissolveu em 2011, tampouco facilitam a tarefa.

O serviço de imprensa de Aung San Suu Kyi se contentou nesta segunda-feira em anunciar a intervenção da polícia no domingo à noite no centro do país para dispersar 400 pessoas que jogavam pedras em um açougue muçulmano, no que é o primeiro incidente de violência intercomunitária registrado após os ataques dos rebeldes muçulmanos no fim de agosto.

Em 2012 explodiram violentos confrontos no país entre budistas e muçulmanos que deixaram cerca de 200 mortos, principalmente muçulmanos.

Aung San Suu Kyi também está sujeita ao poderoso movimento de monges nacionalistas que consideram que os muçulmanos representam uma ameaça para Mianmar, país onde mais de 90% da população é budista.

Os rohingyas, tratados como estrangeiros em Mianmar, são vítimas de múltiplas discriminações: trabalho forçado, extorsão, restrição à liberdade de movimento, regras de união injustas e confisco de terras.

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