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Incoerentes, palanques dão adeus às ideologias para vencer eleição

Garantia de mais tempo de TV, fundo partidário e outros benefícios estão por trás do quebra-cabeça das alianças políticas

Kevin Paes LUISA FARIAS E MARÍLIA BANHOLZER
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Kevin Paes
LUISA FARIAS E MARÍLIA BANHOLZER
Publicado em 16/09/2018 às 9:26
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Garantia de mais tempo de TV, fundo partidário e outros benefícios estão por trás do quebra-cabeça das alianças políticas - FOTO: Foto: JC Imagem
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A tentativa de muitos candidatos de se colar à popularidade do ex-presidente Lula (PT) e as coligações formadas este ano têm gerado um cenário político confuso para as eleições em Pernambuco. A situação lembra um trecho do poema Quadrilha, de Carlos Drummond de Andrade: “João amava Teresa, que amava Raimundo, que amava Maria (...) que não amava ninguém”.

As alianças políticas, por vezes consideradas incoerentes por especialistas e eleitores atentos, são formadas, principalmente, para garantir maior tempo na propaganda eleitoral de TV e rádio, mais verba do Fundo Eleitoral, além de um verdadeiro exército de cabos eleitorais. 

O cientista político e professor da UFPE Ernani Carvalho ressalta que o candidato que possui maior tempo de TV tem mais chances de vencer e eleição. “Quando você amplia suas alianças, vai ter mais pessoas trabalhando pela sua campanha, multiplicando as formas de apoio em termos de estrutura”. 

Segundo ele, esse jogo de apoios não tem relação apenas com o que se ganha de vantagem durante as eleições. Unir esforços agora pode significar benefícios futuros: “As alianças também estão ligadas com indicações a cargos e uma série de recursos que um presidente (ou governador) eleito pode oferecer à sua chapa majoritária”, avaliou.

Em Pernambuco, há sete postulantes à vaga do Palácio do Campo das Princesas. Quatro deles estão inseridos em coligações: Paulo Câmara (PSB), Armando Monteiro (PTB), Maurício Rands (PROS) e Dani Portela (PSOL). Os demais estão em chapas puras: Julio Lossio (Rede), Simone Fontana (PSTU) e Ana Patrícia Alves (PCO).

Na teoria, as alianças políticas se originam a partir das mesmas convicções e ideologias semelhantes entre os partidos que fazem as coligações, como explica o cientista político e professor da PUC-Rio Ricardo Ismael: “É necessário ter uma afinidade ideológica, senão não há um entendimento da sociedade, e a aliança fica confusa e até sem credibilidade.” 

Para a advogada especialista em direito eleitoral Karina Kufa, o eleitor tem todo direito de ficar confuso. “Existem partidos de direita, esquerda e os de centro. Quando um de direita se une a um de esquerda, é natural que o eleitor fique confuso. O PSDB é um caso claro. É de centro-direita, mas tem se aliado à esquerda.”

Um bom exemplo é formação da parceria entre Jarbas Vasconcelos (MDB) e Humberto Costa (PT), candidatos ao Senado que são rivais históricos, mas que agora pedem voto casado na coligação Frente Popular. A chapa é encabeçada pelo candidato à reeleição Paulo Câmara (PSB) e tem como candidata a vice Luciana Santos (PCdoB). O grupo é formado por 13 partidos coligados, que, considerando as alianças nacionais, dão apoio a seis presidenciáveis. 

A candidatura do ex-presidente Lula, no entanto, era uma bandeira defendida pela chapa majoritária. Exceto por Jarbas, que vota em Geraldo Alckmin (PSDB), mesmo tendo Henrique Meirelles (MDB) como o presidenciável do seu partido. Segundo a cientista política Priscila Lapa, em Pernambuco, há uma cultura muito forte de deslocamento da eleição nacional em relação à estadual: “Se tivessem partidos muito fortes, essas alianças (confusas) não se consolidariam”, avalia.

Mas Lula é um caso à parte. Mesmo preso por corrupção desde 7 de abril, o petista figurou na pesquisa JC/Ibope/TV Globo, divulgada no dia 22 de agosto, com a esmagadora vantagem de 62% das intenções de voto no Estado. Ainda que não seja mais oficialmente o candidato do PT, a sua popularidade tem relação com o fato de muitos candidatos pernambucanos se mostrarem seus apoiadores.

Armando Monteiro (PTB), que encabeça a coligação Pernambuco Vai Mudar, declarava apoio a Lula, enquanto o seu candidato a vice Fred Ferreira (PSC) está neutro e os seus postulantes ao Senado, Bruno Araújo (PSDB) e Mendonça Filho (DEM), apoiam Geraldo Alckmin (PSDB). Com a saída de Lula, Armando ainda está indeciso em qual candidato a presidente dará palanque, embora seu partido esteja aliado a Alckmin. A coligação do senador conta com 13 partidos e seis presidenciáveis diferentes. 

Em um cenário sem Lula, o PCO, partido da candidata Patrícia Alves, também deixou de apoiar o PT e orientou os filiados de todo o País a votarem nulo. A coligação O Pernambuco que Você Quer – formada pelo PROS, Avante e PDT – é encabeçada por Maurício Rands (PROS). Esse declarou apoio a Ciro Gomes (PDT) para presidente, ao contrário da orientação do seu partido no âmbito nacional, que está aliado a Fernando Haddad, o agora candidato do PT ao Palácio do Planalto. 

Fugindo das “incoerências”, a coligação A Esperança Não Tem Medo, liderada pela psolista Dani Portela, é formada pelo PSOL e PCB. Todos os candidatos da chapa majoritária apoiam Guilherme Boulos (PSOL) para presidente.

INFIDELIDADES 

As divergências nos palanques não se resumem às eleições presidenciais. Casos em que o partido não vota fechado na chapa majoritária da sua coligação não são novidade em Pernambuco. Por exemplo: o PP, partido da Frente Popular, decidiu apoiar Bruno Araújo (PSDB) para senador. Já o prefeito de Serra Talhada, Luciano Duque (PT), anunciou recentemente o apoio à candidatura de Armando. Em resposta, o diretório estadual do PT decidiu abrir um processo disciplinar contra o prefeito por “infidelidade partidária”.

“Se a afronta for considerada grave, o candidato pode ser penalizado, ser expulso do partido, e ficar impossibilitado de concorrer ao pleito. Isso não tem tanto peso para prefeitos, que não dependem de ligação com um partido para manter seus mandatos”, avaliou a especialista em direito eleitoral Karina Kufa.

"Essas alianças são conjunturais, sim. Se ainda existia máscaras para esse comportamento, na eleição deste ano, em Pernambuco, isso ficou bem evidente”, Priscila Lapa, cientista política

"Às vezes, é difícil explicar por que há quatro anos os partidos brigavam e agora estão juntos. O eleitor também não entende, por não ser bem justificável”, Ricardo Ismael, cientista político

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