ELEIÇÕES 2018

Decisivo no 2º turno, Nordeste pouco aparece nos planos de governo de Bolsonaro e Haddad

Para além do discurso raso, os candidatos têm um leque de compromissos essenciais se quiserem conquistar os nordestinos

Angela Belfort
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Angela Belfort
Publicado em 09/10/2018 às 8:02
Foto: Tatiana Fontes/O Povo e Ricardo Stuckert/Divulgação
Para além do discurso raso, os candidatos têm um leque de compromissos essenciais se quiserem conquistar os nordestinos - FOTO: Foto: Tatiana Fontes/O Povo e Ricardo Stuckert/Divulgação
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O Nordeste quase não é citado nos programas de governo dos presidenciáveis Fernando Haddad (PT) e Jair Bolsonaro (PSL), embora os votos da Região tenham sido decisivos para levar o País ao segundo turno da eleição, no próximo dia 28. No programa do petista, o nome 'Nordeste' só é escrito uma vez, citado no Plano Nacional de Homicídios, mostrando que a violência é grande em algumas capitais nordestinas. No plano de Bolsonaro, algumas capitais nordestinas também são citadas no contexto de altos índices de assassinatos, e o nome Nordeste aparece quatro vezes, num mesmo parágrafo, se referindo a uma nova matriz de energia limpa e renovável, que terá como matéria-prima os ventos e o sol. A proposta não é novidade, tendo em vista que os ventos já são responsáveis por quase 50% da energia consumida nos Estados nordestinos e há pelo menos metade de uma década os consultores do setor falam que haverá uma expansão desses dois tipos de energia. Depois disso, o candidato não volta a falar de projetos que tenham maior peso para a região;.

A região tem 28% da população brasileira e é responsável por 14% de todo o Produto Interno Bruto (PIB) do País. O PIB indica as riquezas produzidas num determinado lugar. “Essa proporção vem se mantendo há cerca de 50 anos. Houve avanços no País e na região em números absolutos, porque ambos cresceram”, comenta o sócio-diretor da consultoria Ceplan e economista Jorge Jatobá. “As pessoas do Nordeste continuam com 50% da renda per capita média das do Sudeste”, argumenta. A renda domiciliar per capita média do País ficou em R$ 1.268 em 2017, sendo R$ 1.712 em São Paulo; R$ 597 no Maranhão; e R$ 852 em Pernambuco, segundo informações da PNAD Contínua elaborada pelo IBGE. Esse cálculo soma os rendimentos recebidos por moradores de uma residência e divide o valor pelo total de habitantes do domicílio.

Para Jatobá, essas diferenças regionais só diminuem com políticas públicas e instrumentos para fazer as mesmas saírem do papel. O desenvolvimento regional é citado somente no programa de Haddad, que diz ser fundamental a elaboração de uma Nova Política Nacional de Desenvolvimento Regional e Territorial (PNDR). Mas descreve algumas iniciativas que podem ser adotadas sem identificar propriamente os locais e de onde virão os recursos a serem empregados.

Ainda no programa petista, há a intenção de concluir a transposição de águas do Rio São Francisco, um projeto que consiste na construção de dois grandes canais: os Eixos Norte e o Leste, que vão abastecer cidades de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará.

O Eixo Leste está pronto desde março do ano passado, enquanto o Eixo Norte ainda está inconcluso. Em construção há 11 anos, esse projeto é muito importante porque vai dar segurança hídrica para 390 municípios do Nordeste. 

O plano de governo de Haddad também diz que serão “retomadas as ações de revitalização do Velho Chico e repactuados com os Estados beneficiados”. Isso significa que será feita a cobrança da água aos Estados. Também está previsto, no programa petista, a implantação de um saneamento básico na bacia do São Francisco, sem explicar propriamente onde. A área da bacia abrange 634 mil quilômetros quadrados. O rio começa na Serra da Canastra, em Minas Gerais, e vai até a divisa de Alagoas e Sergipe.

Os programas de governo dos dois candidatos, consultados pela reportagem do JC, são públicos e foram registrados pelo PT e PSL no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). As assessorias de imprensa de Haddad e Bolsonaro foram acionadas, mas não responderam à reportagem até o fechamento desta edição.

O que ficou de fora

“A área de desenvolvimento regional ficou fora do debate das eleições deste ano com todos os candidatos. Não há uma visão sistêmica, coerente e propositiva para o desenvolvimento regional. Uma política de desenvolvimento regional deve ter objetivos e instrumentos para que as mesmas sejam executadas”, resume Jatobá. Nesse caso, instrumento pode ser por exemplo um órgão para implantar essas ações.

Com relação às políticas de desenvolvimento regional, o cientista político e professor da PUC-Rio Ricardo Ismael afirma que não é uma questão de olhar para uma região ou não. “O que está acontecendo é que o primeiro turno discutiu pouco os temas econômicos, de desenvolvimento. Ficou em segundo plano, assim como a discussão de propostas. Os ataques – seja por parte do Bolsonaro, com o antipetismo, ou do PT, com o antibolsonarismo – estão pautando as campanhas”, diz.

O especialista acredita que não haverá uma mudança da noite para o dia. “A dinâmica eleitoral é que está tirando espaço de debater os problemas do País e, evidentemente, do Nordeste. O que está faltando é o debate mais propositivo, de soluções para os problemas do País, mas não sei se vai ter esse espaço não, pois o programa todo é muito concentrado em ataques. A maneira de convencer os outros não é falando de propostas, é atacando. Sou pernambucano, estou no Rio, que viveu uma crise imensa nos últimos quatro anos, mas não tem nenhuma proposta para se resolver os problema do Rio ou de São Paulo. Essas propostas não estão vindo e não sei se elas virão no segundo turno”, concluiu Ricardo Ismael.

*Colaborou Renata Monteiro

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