Ao anunciar que aceitava o convite para o superministério da Justiça, o juiz federal Sergio Moro creditou a decisão à “perspectiva de implementar uma forte agenda anticorrupção e anticrime organizado”. Como chefe da Polícia Federal (PF) e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), responsável por atuar contra a lavagem de dinheiro, Moro leva o modus operandi da Operação Lava Jato, com o uso de inteligência e o lema “follow the money” (expressão em inglês que indica ser preciso seguir o dinheiro para encontrar o corrupto), para o comando de um robustecido aparato contra a corrupção. Enquanto pavimenta o caminho para a Esplanada dos Ministérios, o magistrado já se afastou de novas audiências, como a do ex-presidente Lula (PT), no próximo dia 14.
“Moro é expert em crimes financeiros e de lavagem de dinheiro. E vai levar essa experiência para o ministério. O Coaf é um órgão que a gente pergunta onde andou nos últimos anos, em que centenas de bilhões de reais foram movimentados para a corrupção em tantas empresas. Claro que o Coaf estava capturado. Então, o fato de sair do Ministério da Fazenda para a Justiça vai ser um grande avanço para essa política de combate à corrupção e aos crimes financeiros. O chamado follow the money. Moro já mostrou o que é imprescindível, que é a independência e a coragem. Ele, quando liderava a Lava Jato, deu exemplo disso. Não se pode dizer que ele é um super-homem. Outros atores já contribuíram muito com a apuração contra figurões, mas ele foi essencial nos últimos anos”, projeta Pedro Henrique Reynaldo Alves, ex-presidente da OAB-PE.
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Para Daniel Falcão, professor do Instituto de Direito Público (IDP) e da Universidade de São Paulo (USP), a ida de Moro para o ministério deve estimular o combate à corrupção, mas de forma indireta. “O ministro da Justiça não manda na PF. Não vem dele as principais ordens. A PF é uma instituição razoavelmente independente. Nesse sentido, a atuação dele talvez fosse mais importante como juiz, tocando os processos da Lava Jato. Moro vai ter outro papel, que é de estimular essas ações no sentido de trazer mais dinheiro, priorizando o orçamento do ministério para esse tipo de ação. Nisso ele vai poder atuar”, explica.
Nesse sentido, a Polícia Federal deve se tornar o principal órgão de destaque do novo ministério, aposta o procurador de contas de Pernambuco Cristiano Pimentel. “Hoje, nós temos força-tarefas da Lava Jato em Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. Sob a gestão de Moro, essa metodologia de trabalho focado em inteligência e na apuração da corrupção política vai ser expandida para quase todos os Estados. Os delegados têm reclamado de falta de recursos para fazer essas grandes operações. Você precisa gastar dinheiro com helicóptero, diárias, gasolina. Esses meios operacionais mínimos não vão faltar na PF”, acredita Pimentel.
E a segurança?
A criação do superministério, porém, significará que Sergio Moro será o responsável também pela área de segurança pública, uma das principais pautas do governo Bolsonaro. Para Luís Flavio Sapori, ex-secretário de Segurança Pública mineiro e professor da PUC-MG, a junção dos ministérios foi um retrocesso institucional. “A separação do ministério da Justiça e da Segurança Pública era muito importante. Significava na prática que o governo federal ia priorizar o combate ao crime e coordenar um programa nacional de segurança pública. Agora, ficamos em dúvida, dado que o Moro terá como uma grande prioridade o combate à corrupção. Que não deixa de ser importante, não há dúvida, mas vejo com certa preocupação. Em que medida crimes como homicídios, roubos, estupros, entre outros, vão receber atenção especial por parte do novo ministro?”, questiona.
Advogado de 17 réus em processos da Lava Jato que não estão sob a jurisdição de Moro, o criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o “Kakay”, diz que a decisão de assumir o ministério fortalece a hipótese de parcialidade contra a atuação do juiz. “Ao aceitar ser ministro da Justiça, ele deu um tapa na cara do Judiciário. Ele desqualifica um trabalho longo que foi feito com muito mérito. Não porque não tivesse qualidades para ser ministro. Mas não ao aceitar um cargo de um presidente que ele ajudou a eleger. O Judiciário tem que ser isento e parecer isento”, critica.
O criminalista Adib Abdouni lembra que Moro não é juridicamente suspeito. “O questionamento, mesmo que não tenha nenhuma razão, vai existir. Até por parte da defesa, que sempre vai querer encontrar algo para questionar a atuação dele. Ele ainda não assumiu, mas é um cargo político. Exige dele um certo cuidado para que não macule todo o trabalho que fez anteriormente”, assinala.