PEC

Servidor vive instabilidade

Nesta semana o Governo Federal encaminha proposta de reforma administrativa ao Congresso Nacional

ANNA TENÓRIO E RENATA MONTEIRO
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ANNA TENÓRIO E RENATA MONTEIRO
Publicado em 03/11/2019 às 7:28
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Nesta semana o Governo Federal encaminha proposta de reforma administrativa ao Congresso Nacional - FOTO: EBC
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Passada a corrida pela aprovação da reforma da Previdência no Congresso Nacional, a equipe econômica do presidente Jair Bolsonaro (PSL) prepara-se para entregar à Câmara dos Deputados, na próxima terça-feira (5), um pacote de reformas que teria como eixo principal uma série de mudanças na gestão dos funcionários públicos do País. A realização dos ajustes seria necessária porque os gastos com pessoal representam atualmente a segunda maior despesa da União, ficando atrás apenas dos custos do Executivo com o pagamento de aposentadorias e pensões. No Orçamento de 2020, o governo prevê um gasto de R$ 336,6 bilhões com servidores.

De acordo com André Marques, coordenador do Centro de Gestão e Políticas Públicas do Insper, a urgência pela implantação de uma reforma administrativa se dá principalmente pela situação de crise na qual todas as esferas do Executivo se encontram, o que acaba por impedir que eles se ajudem entre si. “Hoje, União, Estados e municípios passam por uma crise muito forte. Diferentemente de anos anteriores, quando o governo federal conseguia socorrer os demais entes federados quando esses precisavam de socorro fiscal, agora ele também enfrenta uma situação muito crítica. Ao analisarmos as razões que levaram a esse quadro, vemos que parte significativa dessas despesas ou são obrigatoriedades constitucionais ou são gastos com pessoal, sejam eles ativos ou inativos. Por essa razão, a realização de uma reforma administrativa é primordial para o equilíbrio das contas do País”, declarou.

Em ascensão desde os governos do presidente Getúlio Vargas, o funcionalismo público sofreu um boom após a Constituição de 1988, quando foram criadas a maior parte das regras que regem o setor até hoje. Estabilidade, altos salários e boas aposentadorias em muitas posições, grande número de carreiras e vários outros atrativos fizeram com que muitas pessoas cultivassem o sonho de entrar no serviço público, seja no âmbito federal, estadual ou municipal.

Com 219.662 servidores ativos, inativos e pensionistas, Pernambuco gasta, por mês, R$ 856 milhões com folha de pagamento, segundo a Secretaria de Administração. Quando questionado a respeito da posição do Estado sobre a reforma administrativa, o Palácio do Campo das Princesas informou que “o governo de Pernambuco não recebeu informações oficiais sobre a proposta do governo federal e que não pode se posicionar enquanto não existir nada oficial”. É provável que, caso seja aprovada no Congresso, as mudanças no funcionalismo valham também para Estados e municípios.

“Em todos os lugares do mundo, as pessoas que seguem a carreira pública chegaram até lá porque queriam se envolver, resolver problemas sociais, e não porque sonhavam com um emprego público, como ocorre com muitos dos melhores alunos que estão concluindo cursos superiores hoje. Essa ideia de que alcançar o sucesso no Brasil é passar em um concurso público tem um efeito nocivo para todos, pois você pega as pessoas mais capazes e direciona para setores em que a produtividade é baixa”, opinou o professor de economia e finanças da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) Luiz Maia.

Informações divulgadas até o momento pelo Palácio do Planalto indicam que o governo deve sugerir ao Congresso mudanças no modelo de contratação de servidores – passando a adotar o regime da CLT –, redução de salários, fim da estabilidade, diminuição no número de carreiras, entre outras ações. Na última semana, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que a maior parte das alterações não afetará quem já está no serviço público, sobretudo a estabilidade.

Atuais servidores poderão, contudo, sofrer reduções de benefícios como auxílio-moradia e ser obrigados a passar por avaliações e reciclagens.

Resistência

A reforma administrativa ainda nem chegou no Congresso Nacional e já está enfrentando o discurso de resistência dos parlamentares. Com previsão de ser encaminhada ao legislativo nesta semana, a nova Proposta de Emenda Constitucional (PEC) a ser sugerida pelo Poder Executivo é pautada em um ambiente político mais desgastado que o de fevereiro deste ano, quando a Reforma da Previdência foi entregue.

Na última quarta-feira (30), o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM), se mostrou empolgado em abraçar – mais uma vez – a pauta governista. “O texto do governo vem com o objetivo de nos orientar e sinalizar qual deve ser a reforma de interesse do governo, para que a gente possa se organizar aqui e construir maioria”, disse Maia.

Desta vez, a oposição à pauta deve vir da organização da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público, que na Câmara é presidida pelo deputado Professor Israel Batista (PV-DF). O grupo foi organizado ainda no primeiro semestre deste ano, quando o governo já tinha alertado que uma reforma no funcionalismo público poderia contribuir com a redução de gastos do governo.
O grupo contou com o endosso de 235 deputados, que assinaram para legitimar a criação da Frente. Além disso, 7 senadores e 23 partidos já se manifestaram favoráveis à criação do grupo. “Qualquer reforma que tenha como princípio o corte de custos, por si só, já começa errada. Acredito que o caminho a ser construído deve partir do princípio de tornar o serviço público qualificado, eficiente e de excelência, com isso, a redução de custos será uma consequência”, defende o deputado Professor Israel.

Ainda de acordo com o parlamentar, a Frente também elaborou um estudo para contrapor os dados apresentados pelo Banco Mundial, que recomenda que Brasil limite salário de servidor e reduza contratações. “Observando-se a trajetória do gasto global com pessoal na União, chega-se à conclusão de que, em relação ao passado, o gasto atual, medido em proporção do PIB, está próximo da média histórica sem apresentar tendência alguma à explosão ou descontrole. Em 2018, as despesas com pessoal e encargos na União, incluindo-se civis, militares, ativos, aposentados e pensionistas, somaram 4,4% do PIB, o mesmo percentual verificado duas décadas atrás e menor do que a cifra alcançada em 2000, 2001, 2002, 2003, ou 2009”, aponta um trecho do levantamento.

De acordo com Ernani Carvalho, cientista político e professor da UFPE, apesar da divergência política constante entre os poderes executivo e legislativo, não é o Congresso quem deve atrapalhar a evolução da discussão da pauta. “Sempre o Congresso é um elemento de dificuldade para reforma de grande porte. Mas o que a gente tem visto nesse governo do presidente Jair Bolsonaro é que um grau de dificuldade maior tem sido gerado dentro do próprio cerne do governo. Tem que saber se o governo vai estar unido e caminhando para uma proposta de reforma administrativa realmente crível, e qual vai ser a capacidade do governo de interagir no Congresso”, avalia.

Ainda de acordo com o especialista, “o congresso sempre trabalha com a lógica eleitoral”, por conta disso, “obviamente que isso vai ser politizado e, se possível, esticado até a beira das eleições municipais no ano que vem, para potenciais ganhos da oposição e perda do governo”.

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