Igor Maciel, da coluna Pinga Fogo*
Durante alguns anos, Caruaru investiu num resgate do carnaval para movimentar a cidade no período. Era o "Carnaval da La Ursa". A La Ursa, pra quem não conhece, consiste basicamente em um grupo de pessoas fantasiadas, batendo latas e cantando a frase típica da brincadeira: "A La Ursa quer dinheiro, quem não dá é pirangueiro". O prefeito de Caruaru na época era o atual deputado estadual Tony Gel (MDB). Tony, que além de político é um zabumbeiro dos melhores, deve ter lembrado do batuque da La Ursa ao ver entrar o bloco de projetos que o Governo do Estado enviou à Alepe, buscando, com certa pressa, recursos para os cofres.
Nos bastidores, a justificativa, que não estava nos textos dos projetos, era clara: precisa-se de dinheiro para pagar as folhas de novembro, dezembro e o décimo terceiro dos servidores. Em 2018, as três folhas juntas custaram R$ 2,5 bilhões. Não é uma conta fácil de pagar. Um dos projetos dá desconto de 70% para quem pagar o IPVA, à vista, até o fim de dezembro. Um componente importante do planejamento em gestão é administrar a linha entre o que pode ser cobrado e o que seu cliente consegue pagar. O IPVA, que teve um acréscimo prorrogado a partir de 2019, com alíquotas mais altas até 2022, é um exemplo. O percentual mais alto foi mantido e as pessoas não conseguiram pagar. Agora o governo propõe dar 70% de desconto no imposto, às pressas, para fazer caixa. Planejou mal. Além de tudo, é um péssimo recado ao contribuinte, dando a entender que vale a pena não pagar o IPVA e esperar que o governo, apertado, dê desconto depois.
Outro projeto, que mostra a preocupação do Estado para pagar as contas até o fim do ano, é o que autoriza o governo a reduzir multas e juros de uma dívida que a Petrobras tem com Pernambuco. Na prática, o governo briga há quase 12 anos para receber R$ 1,2 bilhão. Vai abrir mão disso pra receber pouco mais de R$ 440 milhões, desde que a dívida seja paga até o dia 20 de dezembro, a data também é o limite para o pagamento do décimo terceiro. Coincidência? Talvez. Mas há quem diga que a coincidência é o esconderijo preferido dos problemas reais. Fato é que esta gestão sempre se orgulhou de pagar salários em dia, apesar de isso ser uma obrigação básica, e até usou isso como um de seus motes de campanha. Atrasar seria muito ruim para a imagem do governo.
Com as medidas aprovadas, é bem possível que tudo se resolva por mais um ano. Mas chama atenção que, em 2018, para pagar o décimo terceiro, houve reclamação da deputada Priscila Krause (DEM) de que o Estado precisou antecipar a negociação sobre a gestão da folha de pagamentos com um banco. Recebeu antes o que estava programado para entrar só em dezembro de 2020. Agora, precisa abrir mão de parte do que tinha pra receber de uma dívida e de impostos, também para manter os salários. Não dá pra negar que o governo tem sido criativo e que o salário dos trabalhadores tem que ser sempre uma prioridade, sob qualquer aspecto. Mas a que custo e até quando?
*Igor Maciel é titular da coluna Pinga Fogo, no Jornal do Commercio
Leia mais comentários de Igor Maciel:
Ciro Gomes deve saber de coisas que ninguém sabe ou está só torcendo que o país dê errado
No Recife, Lula acena para Marília Arraes e João Campos
Em discurso, Lula chamou mais atenção pelo que não disse do que pelo que disse
Bancada precisa pensar mais em Pernambuco e menos nos próprios partidos
Novo partido põe em risco governabilidade e futuro político de Bolsonaro
Nova Constituição proposta por Alcolumbre é um disparate
O que o STF decide hoje, o próprio STF pode mudar amanhã