Lá onde eu moro

Rosarinho e Encruzilhada: vizinhos que se completam

O primeiro tem a praça; o segundo, abriga o mercado. Juntos, bairros formam uma parte peculiar do Recife

Manuella Antunes
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Manuella Antunes
Publicado em 06/08/2012 às 18:15
Flora Pimentel/JC Imagem
O primeiro tem a praça; o segundo, abriga o mercado. Juntos, bairros formam uma parte peculiar do Recife - FOTO: Flora Pimentel/JC Imagem
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Há muitos anos, o músico Herbert Lucena trocou o bairro do Rosário, onde morava, em Caruaru, pela vida na capital pernambucana. Coincidência ou não, hoje ele vive no Rosarinho e avisa logo: “Faço pouca coisa a pé. Meu único exercício é o levantamento de copo, mas perambulo um bocado em alguns redutos daqui e da Encruzilhada.” E foi justamente por isso que ele conduziu o passeio pelos dois bairros vizinhos. Ambos pequenos, mas nem por isso desinteressantes, como Herbert prova nesta edição da série Lá onde eu moro.

O passeio começa na própria casa de Herbert. Da varanda do 25º andar, onde mora, ele mostra os limites do bairro. “O Rosarinho é pequeno. Ainda tem pouca estrutura aqui, pouco serviço. E logo ali já é a Encruzilhada.” A verdade é que a visão que o músico desfruta é privilegiada. Do alto do seu apartamento, vê-se quase tudo. Do Estádio José do Rêgo Maciel até uma pontinha do mar. A grande vantagem, ele diz logo: “É muito central. Daqui chego fácil em qualquer canto.”

Vista contemplada devidamente, a reportagem seguiu de carro para a Rua Santos Dumont (no trecho após o cruzamento com a Avenida Norte). É lá que nosso cicerone mostra um dos lugares que mais gosta do Rosarinho, a Casa de Seu Jorge – bar que promove apresentações musicais nos fins de semana. “Acho massa. É legal demais. Como o espaço não é muito grande, o público fica perto do artista. Eu venho sempre. É atrás de casa, não tem nem que se preocupar com blitz”, diz.

Bem pertinho, de lá, está a Praça Phaelante da Câmara. Mais conhecida também como Praça do Rosarinho, ela foi revitalizada em 1998. De frente para a Avenida Norte, o local é cheio de árvores, tem uma fonte charmosa e uma brisa pra lá de gostosa.

Escorrego, balanço e gangorra. Área para correr e bater uma bolinha. Não tem como: é o recanto da criançada residente no bairro. O oásis dos pequenos. E dos que precisam de táxi, lembra Herbert. “Esse ponto nunca falha. Hora nenhuma do dia ou da noite”, brinca. No Natal, o espaço vira uma referência na cidade. A praça fica tomada de enfeites e ainda conta com a colaboração das casas ao redor, que também entram no clima.

Da praça, é só atravessar a rua que logo se vê um dos estabelecimentos mais tradicionais do bairro: a Padaria Rosarinho. “É o único lugar onde costumo ir andando. Sempre venho lanchar ou comprar algo para comer em casa.” Do lado, na calçada, fica a banca Rosarinho. “É onde compro meu jornal no fim de semana”, completa o artista.

Segundo consta no livro Recife e seus bairros, a pesquisadora Zilda Fonseca conta que no antigo Sítio do Rosarinho havia a Igreja de Nossa Senhora do Rosário. Toda a área pertencia ao Coronel de Milícia Francisco Casado Lima Júnior, também proprietário de outros sítios nas redondezas. Por volta de 1850, a propriedade foi vendida e loteada, ficando a capela, responsável pela origem do nome do bairro, abandonada até ser demolida por ocasião das reformas que originaram a Avenida Norte.

De volta ao carro, o passeio segue. Destino: Encruzilhada – bairro cuja origem do nome é mais romântica do que se imagina. Mário Sette, no livro Maxambombas e maracatus, escreveu: “Vinham apitando de longe os trens do Recife, Olinda e Beberibe e ali se cruzavam. Era um espetáculo curioso e agradável o encontro dessas três composições.”

E é no ponto em que antes havia uma interseção entre as linhas dos trens de Limoeiro com as maxambombas de Olinda e de Beberibe que, hoje, se cruzam as Avenidas Norte e João de Barros. Encruzilhada, portanto, continua sendo um nome pertinente.

Juntos, Encruzilhada e Rosarinho têm população residente menor que a maioria dos bairros da Região Metropolitana. Somam 16.017, segundo dados do Censo 2010 do IBGE. Desse total, 11.940 são relativo ao primeiro e o restante, 4.077, ao segundo.

BARES
Na Encruzilhada, Herbert tem destino certo. O mercado público – fundado em dezembro de 1950 –, que tem a frente virada para a Rua Dr. José Maria. “Encontro de tudo aqui. Faço compras de frutas e verduras. É ótimo. A movimentação dessa área me lembra o interior. O jeito dos vendedores e a maneira que cada um encontra para cativar os clientes é peculiar.”

Do mercado para o bar. “Vocês têm que conhecer o bar de Marquinhos. Chama Acalanto. Mudou de lugar duas vezes, mas agora tá no melhor canto. Bem perto de casa”, brinca Herbert. E é Marquinhos quem recepciona o amigo e a reportagem. Confortável, o músico senta, troca um dedo de prosa com o pessoal que já está lá. O bar fica na Rua Amaro Coutinho e é recanto de boêmios. Ótima opção para ouvir música boa às sextas. São os próprios clientes que tocam.

Em frente ao estabelecimento fica a Praça do Baobá, que funciona como um girador. Em um dos cantinhos que arrodeiam a árvore, está instalada a Banca do Bigode, mais precisamente na Rua Pedro Alves, 104. Por lá, “compra-se, vende-se e troca-se revistas e livros”, conforme está escrito no cartão de visita do dono, o Sr. Bigode. Mas dá, ainda, para consertar fogão e conseguir os trabalhos de eletricista, encanador, marceneiro e pintor. Bigode desenrola tudo.

O passeio com Herbert segue tarde afora. O carro agora passa em frente ao veterano restaurante Tepan. “Venho muito aqui. Adoro.” Mas destino certo, de todos os domingos, é comer um bom bode no Caprino’s. “Vocês gostam de carne de bode? Se não gostam é porque não se acostumaram”, brinca. “Tenho uma sobrinha que dizia que não queria comer. Depois que a levei lá, todo fim de semana ela pede: ‘Tio, a gente vai comer bode?’”, conta, rindo. E ele acata. Muito provavelmente, enquanto você lê a reportagem, o músico saboreia um bode assado no melhor estilo nordestino.

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