Decoração

Ambientes na passarela

Moda e decoração nunca gozaram de tanta intimidade. E a maior prova disso é que não faltam estampas e cores que migraram do armário para enfeitar ambientes no desfile de tendências da Casa Cor 2012

Manuella Antunes
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Manuella Antunes
Publicado em 19/11/2012 às 14:03
Cláudio Barreto/divulgação
Moda e decoração nunca gozaram de tanta intimidade. E a maior prova disso é que não faltam estampas e cores que migraram do armário para enfeitar ambientes no desfile de tendências da Casa Cor 2012 - FOTO: Cláudio Barreto/divulgação
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Muito se fala sobre a influência da arquitetura na moda. Na edição de março da São Paulo Fashion Week, por exemplo, o estilista Reinaldo Lourenço levou às passarelas vestidos inspirados na Catedral de Notre Dame. Mas e ao contrário? Como essa relação funciona? Como as tendências do mundo da moda interferem na criação de projetos arquitetônicos e na decoração de ambientes? É possível achar algumas dessas respostas espalhadas nos 34 ambientes da Casa Cor Pernambuco que, com o tema Moda. Estilo. Tecnologia, abriu suas portas para o público na semana passada. O ditado do ovo e da galinha cabe nesse cenário. Nem mesmo arquitetos, produtores de moda e acadêmicos da área sabem qual área influencia primeiro a outra. Consenso é que ambas seguem tendências globais de resgate de memória, sustentabilidade e estética.

É só chegar no casarão onde já funcionou o Instituto Psiquiátrico Luiz Inácio, na Boa Vista, para dar de cara com um dos primeiros pontos de interseção entre moda e arquitetura: a busca pela exclusividade. No lounge de entrada da Casa Cor o arquiteto André Carício montou uma espécie de galeria. “A proposta foi criar uma passarela invertida. Nesse espaço comprido, de aproximadamente 130 metros quadrados, o público pode desfilar entre peças assinadas por designers muito importantes no mercado.”

O ambiente, que conta com duas esculturas de Abelardo da Hora e uma cadeira de Oscar Niemeyer, é um grande showroom. “Daqui, é possível tirar ideias para vários espaços em apartamentos, casas de campo e até estabelecimentos comerciais.”

ONDA RETRÔ - Quem for visitar a mostra vai perceber que outro aspecto de destaque no ambiente de André Carício é o uso de objetos vintage e retrô. Assim como acontece nas passarelas, a arquitetura também caminha no sentido de resgatar memórias. A superpopular Oh, Boy! reitera a ideia. Na última Fashion Rio, a grife apareceu cheia de inspirações sixties.

No mundo real, fora das passarelas e da Casa Cor, esse traço também se faz cada vez mais presente. Na casa da estilista e produtora de moda Carol Azevedo, quase tudo é antiguinho. “Essa história de retrô, de garimpar, tem tudo a ver comigo. Me fascina, sabe? Traz a possibilidade de reaproveitar, de transformar.”

A poltrona (de poá, claro) ela achou no lixo. “Restaurei. Cobri de bolinhas porque considero a estampa um clássico.” A estante da sala, comprou por R$ 15 num brechó fora do Recife. Já o móvel da televisão, ela mesma transformou. Pintou de vermelho. Carol gosta de cor. Das combinações, da harmonização. Tudo em sua casa tem história. Até mesmo as almofadas. Todas feitas por ela (ou por familiares). “Transformo roupas antigas em almofadas.”

TONS DA VEZ - E por falar em cores e tecidos, vale lembrar que é justamente a escolha desses materiais a característica que relaciona o terraço da Casa 2 da mostra com o universo da moda. “Usamos muito linho e linhão, que são tecidos mais rústicos e estão super em alta”, conta a arquiteta Elza Mendonça que criou o espaço ao lado das sócias Lorena Pontual e Giuliana Zirpoli.

Por lá, pousaram também outros detalhes. Ou melhor: pousaram vários pássaros. Cacatuas de porcelana azul-royal e 30 miniquadros do artista Antônio Mendes evidenciam a aposta no tema. “A estamparia usando animais já virou febre nas araras das lojas e esses elementos são uma forma de trazer isso pra cá,” conta Elza.

CLÁSSICO - No escritório de 20 metros quadrados, o mote é ser clássico. Recursos tecnológicos de iluminação com LED realçam uma antiga máxima quando o assunto é estética: menos é mais. O responsável pelo projeto foi o arquiteto Mario Baô, que buscou no pretinho básico a inspiração para criar uma ambiente atemporal.

“Apostei numa tendência minimalista. Preto, branco e cinza. Apenas detalhes em vermelho para destacar o espaço”, conta. Curiosamente, ele faz referência a dois itens do ambiente: a cadeira do interlocutor e a escultura no alto da estante. Ambas vermelhas. “Quando vejo essas peças, associo a silhuetas de modelos. São esguias. Lembro das passarelas.”

Outra tendência destacada por Baô foi o uso de revestimento de fibra que propicia uma sensação tridimensional. “As estampas 3D estão sendo amplamente utilizadas. Essa é outra referência da moda aqui dentro. Ou vice-versa, não é?”

Para esclarecer a movimentação entre arquitetura e moda, a arquiteta e professora do Centro de Ciências e Tecnologia da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) Clarissa Duarte gosta de usar a palavra tendência. “Existe uma relação histórica entre essas áreas de criação”, adianta.

Clarissa explica que ambos os setores caminham de forma semelhante. “A questão da personalização, por exemplo, está em voga. É cultural. É só notar: as pessoas querem se vestir de maneira única, assim como querem que suas casas tenham um toque extremamente pessoal.”

Personalidade percebida, por exemplo, num sofisticado lustre de cristal e numa parede revestida com patchwork de ladrilhos brancos que, aos olhos mais românticos, remetem às rendas. Está lá na sala de estar da primeira casa da mostra recifense. Ambiente assinado pela arquiteta Ana Paula Cascão.

SUSTENTABILIDADE - Outro ponto de interseção entre as áreas apontado por Clarissa é a preocupação com o sustentável. Conceito vivido, de fato, pela consultora Germana Uchôa. No seu apartamento, em Casa Forte, praticamente não há móveis comprados. Tudo, por lá, foi restaurado, reaproveitado. “Minha casa é um grande laboratório. E moda, pra mim, é tudo aquilo que resgata. Tento fazer com que épocas conversem na decoração do apartamento. Resgato o tempo e a história da minha família a partir do momento que transformo, por exemplo, uma passadeira de mesa da década de 50 em capas para almofadas.”

O uso de tecidos de teste, bolsas antigas enfeitando as paredes e sofás revestidos com patchwork de estampas são outras referências – até mais diretas – à moda por lá. No meio da sala, um colorido centro de mesa da pernambucana Estúdio Zero. No alto, um lustre feito de garrafa PET. Elementos que completam um ambiente lindo. Cheio de cor e com cara de vida. Impossível entrar e não perceber que, quando bem harmonizados, os mundos fashion e décor são, na verdade, o mesmo.

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