A Primavera Árabe e o Brasil

Motivação para a explosão de insatisfação nos países árabes está centrada nas péssimas condições de vida da população
Francisco Nixon L. Frota*
Publicado em 23/04/2012 às 11:03
Motivação para a explosão de insatisfação nos países árabes está centrada nas péssimas condições de vida da população Foto: Foto: AFP


Primavera Árabe é como ficou conhecida uma onda de manifestações e protestos que assolou o mundo árabe, atraindo a atenção global em razão de suas implicações geopolíticas, inclusive para o Brasil. Iniciada, em dezembro de 2010, na Tunísia, expandiu-se no Norte da África, invadiu o Oriente Médio e outros países que faziam parte do Antigo Império Otomano, que se estendia do Magreb até parte da Ásia e da Europa.

De uma forma geral e em um primeiro momento, esses eventos apresentaram características comuns entre os países  atingidos, tais como a inexistência de lideranças, a falta de estratégia, a ausência da influência religiosa e o largo emprego da internet como eficiente ferramenta de comunicação, facilitando sobremaneira a mobilização.

Analistas de inúmeras nacionalidades apontavam como objetivo central dos protestos a derrubada de regimes autoritários e corruptos, descompromissados com o povo e com suas carências. Sob uma perspectiva socioeconômica, destaca-se que a região é responsável por aproximadamente 40% da produção de petróleo do planeta, o que tem atraído a atenção da China e da Rússia, além da histórica influência exercida pelos EUA e países da União Européia.

A motivação para essa explosão de insatisfação está centrada nas péssimas condições de vida da população. Os altos índices de desemprego, os baixos salários, a inflação, a pobreza, a fome e a concentração de renda ao longo dos anos parecem ter atingido o limite da paciência. Uma demanda reprimida que atingiu seu ápice sob a forte influência de uma crise econômica mundial. Assim, dessa insatisfação política e econômica floresceram ideais liberais, interpretados por muitos como um chamamento pela democracia.

Mas a Primavera Árabe não foi homogênea. Ela apresentou peculiaridades distintas em cada país, em razão de diferenças políticas, econômicas, sociais, religiosas, culturais, militares e geográficas.

Um claro exemplo dessa distinção, foi o apoio determinante do exército. Nos países onde os manifestantes receberam este apoio, o governo foi rapidamente derrubado, tais como na Tunísia e no Egito. Na Líbia, os rebeldes só obtiveram êxito graças a interferência da OTAN, quebrando uma longa tradição em apoiar ditaduras naquela região. Essa mudança, deixa claro a preocupação dos países ocidentais em garantir a estabilidade na região, favorecendo o sistema financeiro internacional.

Na Síria, onde o exército ainda apóia o clã que se mantém no poder, descartou-se, até o momento, uma intervenção pois os riscos são maiores, em razão da possibilidade de Irã, Líbano e outros países entrarem no conflito.

Mas o caso especial é Israel, única democracia da região, fazendo surgir o questionamento sobre qual objetivos dos manifestantes se já são uma democracia.

Então, entende-se que o cerne da Primavera Árabe não é discutir formas de exercer o poder, mas reivindicar melhores condições de vida, melhores salários, mais empregos, alimentação e liberdade. Prova que apenas a democracia não resolve os problemas sociais.

Assim sendo, não seria exagero afirmar que a Primavera Árabe é uma página do capítulo da Complexa Instabilidade do Oriente Médio, que por sua vez está inserido no livro da Geopolítica Energética, na qual o Petróleo é protagonista.

Passada a primeira década do século XXI, identifica-se um planeta em contínuo crescimento demográfico, que por si só já representa inúmeros problemas, somado a uma sedenta busca por melhor qualidade de vida, na qual o crescimento econômico e o consumo são essenciais. Isso provoca uma crescente demanda por recursos naturais, sobretudo energéticos e agricultáveis. Infelizmente, esses recursos são limitados, finitos e tornam-se mais constantes as pressões pela preservação e a proteção do meio ambiente, convertendo-se em verdadeiros obstáculos ao desenvolvimento.

Como resultante desse jogo entre demanda crescente e obstáculos contínuos, acredita-se que as disputas por recursos naturais deverão caracterizar os conflitos e guerras deste século.

Nesse contexto, os reflexos para o Brasil são claros. O País continental com substanciais riquezas minerais e hidrológicas, com notória capacidade energética e alimentar, deve se preocupar e se preparar para possíveis intervenções externas pela posse ou controle de recursos naturais.

As atuais Política de Defesa Nacional e Estratégia Nacional de Defesa identificam a necessidade de uma Defesa adequada e a intensificação do processo de integração da América do Sul como caminho para a auto-suficiência energética, defesa regional e autonomia política.

Ademais, nos últimos anos, o Brasil apresenta uma respeitável projeção no cenário internacional, sendo detentor do 6º maior PIB do globo e um integrante dos BRICS, que juntos detém quase a metade da população do planeta e 40% dos continentes. Tais índices têm motivado o País a pretender um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, o que o força a adotar uma estratégia de política externa coerente com sua realidade e intenções, a exemplo do provável aumento do número de Missões de Paz, visando pacificar ou estabilizar nações assoladas por conflitos semelhantes à Primavera Árabe.

* Mestrando em Defesa pela Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME); especialista em análise e operações de Inteligência e Contra-Inteligência; e associado da Academia Brasileira de Estudos de Defesa (ABED).

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