De morador de rua em hotel a descontos para vacinados, João Campos precisa discutir melhor as ideias antes de anunciá-las
O prefeito do Recife tem feito anúncios que acabam quase inviabilizados por falta de diálogo com os setores inseridos nas ideias, como restaurantes e hotéis. Ideias boas precisam ser executáveis.
Há uma frase histórica "de Garrincha" que, ao receber instruções em um jogo contra a URSS, para driblar todo mundo e tocar pro gol, como se fosse algo de simples execução, teria dito ao técnico: "já combinou com os russos, professor?".
Há ideias que são boas, há ideias que são bem intencionadas, há ideias que são até geniais. E nada disso significa que elas são executáveis, que são possíveis e bem fundamentadas.
O prefeito João Campos (PSB), por exemplo, em junho surgiu com uma ideia: iria utilizar hotéis do Recife para dar um teto a moradores de rua da cidade durante a pandemia. É bem intencionado, tem lógica, mas "faltou combinar com os russos".
Dois dias após o lançamento, a Associação de Hotéis declarou que o projeto era inviável e só alguém que estivesse pronto para fechar seu estabelecimento aceitaria algo assim.
Independente de dar certo ou não, chama atenção que o prefeito tenha, na época, feito um anúncio sobre os hotéis sem combinar com os hotéis.
Agora, a ideia anunciada foi um programa de benefícios e descontos em estabelecimentos comerciais para quem está vacinado. Dessa vez, cuidou de conversar antes com a Associação de Bares e Restaurantes e com a Associação de Hotéis.
O problema é que o anúncio foi feito ainda sem nada fechado, porque faltou combinar com os donos de restaurantes e hotéis, além das associações.
Não há nenhum incentivo fiscal para os comerciantes. A representante dos restaurantes correu pra explicar que "ninguém é obrigado a participar", poucas horas após o anúncio.
Não é porque uma ideia é boa que ela deve ser anunciada, antes de o projeto estar bem fundamentado. É preciso combinar com todos os envolvidos antes.
Mesmo nessa era das redes sociais, em que se corre para agitar seguidores e animar uma militância virtual, diariamente, anúncios oficiais precisam ser melhor elaborados antes de irem a público, sob risco de serem inviabilizados e morrerem no berço.
A frase de Garrincha, por sinal, nunca foi dita por Garrincha, mas por um ponta-esquerda bem menos famoso, do Corinthians, chamado Pipi, em 1946, num jogo que não tinha nenhum russo.
A ideia de dizer que a piada foi do ponta-direita de pernas tortas da Seleção Brasileira é muito melhor.
Só não é bem fundamentada.