Cena Política

O enigma Renata Campos para as eleições 2022. As cartas estão sobre a mesa

O tamanho da influência de Renata Campos no PSB é chave para entender movimentações internas do partido e indefinição sobre nome do candidato ao Palácio em outubro.

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Igor Maciel

Publicado em 04/01/2022 às 12:17 | Atualizado em 04/01/2022 às 19:04
Análise
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Ser discreto não é relevante. Já o que se faz sob o manto da discrição é essencial para entender a relevância de qualquer figura. Depois que Eduardo Campos morreu, em 2014, Renata Campos já foi apontada como "figura oculta do governo a quem todos se reportavam".

Em conversa com este colunista, um deputado de um partido aliado, no primeiro governo de Paulo Câmara, desabafava, irritado, que fazia acordos com o governador e alguém, que ele acreditava ser a viúva do ex-governador, mandava desfazer.

Mas, existe também o outro extremo. Há quem defenda, sob a mais sólida convicção, que Renata é alguém vivendo para a família e que não se envolve em nada relacionado à política e ao partido.

A discrição carrega uma bagagem da qual o discreto não se livra: a virtual incompetência para o meio termo. Pouca gente acha que alguém discreto é equilibrado.

Ou se é a "mente mais maquiávelica do planeta" ou se é alguém "alheio ao mundo". É porque a discrição suscita imaginação e, se é pra imaginar, por que pensar em algo chato como um meio termo?

A mãe do prefeito do Recife, João Campos (PSB), pode estar nessa posição mediana dentro do xadrez socialista. Ela não manda em tudo e em todos (talvez não mais), como alguns gostam de fantasiar, mas também não está alheia e, sim, ainda tem bastante influência no grupo, principalmente no PSB de Pernambuco. A prova é a disputa silenciosa (as vezes não tanto) que ela e Paulo Câmara estariam travando pela indicação do próximo candidato ao governo do Estado. Paulo quer cuidar da própria sucessão, indicando o auxiliar Zé Neto. Renata estaria tentando encaixar o deputado Tadeu Alencar (PSB) na disputa.

Se ela não fosse relevante, nem se tocaria no assunto.

A disputa entre o governador e a viúva de Eduardo fica mais evidente e toma outra proporção quando João Campos aproveita eventos públicos para elogiar Geraldo Julio (PSB), ex-prefeito do Recife. Há quem entenda como provocação. Ou apenas como uma maneira de manter a espada sobre o pescoço de Paulo enquanto nada se resolve. Geraldo está ali e, mesmo sem a intenção de concorrer, pode criar um problema, já que o próprio Paulo chegou a admitir que ele seria o candidato natural.

Outro indício de que há uma disputa interna entre um grupo mais tradicional do partido e o grupo sob influência de Paulo é o vai e vem em relação a Lula (PT). Hoje, a aliança com Lula é a principal carta do governador de Pernambuco. De "técnico que não servia para a política", como o ex-presidente petista já o classificou, o governador passou a ser o principal elo com a federação entre as duas siglas. Ele já foi apontado como vice e como ministro. O argumento é que, sendo Lula presidente outra vez, o PSB pode se prejudicar muito se ficar à margem. No acordo, acredita-se, Lula viria a Pernambuco fazer campanha e pediria votos para quem Paulo indicasse.

Por isso, toda semana, algum membro diferente desse grupo mais antigo do PSB dá uma entrevista declarando que "a eleição não está decidida e Lula não é tão favorito assim". Ou surge alguém dizendo que "Ciro Gomes (PDT) seria uma opção melhor". Por isso, também, apesar de Paulo afirmar que o nome do PSB sairá em janeiro, sempre surge alguma outra voz interna indicando que o nome só será conhecido perto do fim do prazo de desincompatibilização, em março.

Acreditando ou não nisso tudo, objetivo de todos é enfraquecer a posição de Câmara no xadrez interno. O que prova que ele está forte e é extremamente relevante neste momento.

Ambos os lados dizem que, no fim, o PSB irá unido. Mas há quem duvide e, não por acaso, aliados cresceram o olho na cabeça da chapa majoritária, como o PT.

Diferente do PT, que tem um líder bem definido e pode apenas fingir democracia interna, o PSB precisa passar a ideia de união sem disputas, ou pode acabar como o PSDB, que cometeu o erro de se dividir publicamente para vender uma democracia que, no fim das contas, foi resolvida com a influência financeira do governo de São Paulo sob João Doria (PSDB).

Cabe ressaltar que a diferença de opiniões entre Paulo e Renata é diversa da situação entre Paulo e Geraldo Julio (PSB), por exemplo. Enquanto o primeiro caso é um desencontro de visões sobre o futuro da sigla, o segundo envolve brigas, mágoa e afastamento. Não se pode comparar.

É válido lembrar também que Renata já teve mais influência no governo e no PSB, mas essa presença foi enfraquecendo ao longo desse segundo mandato de Paulo. Nos primeiros quatro anos havia uma série de acordos partidários e políticos que Eduardo Campos tinha firmado e que era necessário fazer cumprir.

Parece algo lógico, mas não é. Sabe-se que, logo após a morte do ex-governador, houve um "princípio de rebelião" no PSB com algumas figuras tentando tirar Paulo da disputa e até mudar completamente o palanque.

Não foi fácil sustentar. E a figura forte de Renata, apesar da tragédia, foi essencial para isso. O secretariado formado em 2015, por exemplo, estava totalmente comprometido com o projeto do ex-governador para o estado quando escolheu Câmara como seu sucessor. Na ausência precoce do único líder do grupo, muitos recorriam a ela.

Com o passar dos anos, essa influência diminuiu porque novos acordos políticos foram sendo feitos e o fiador, a essa altura, já era Paulo. Após a reeleição, essa ascensão do governador se consolidou. Geraldo perdeu espaço e as pessoas mais ligadas à família Campos também foram perdendo espaço. A vitória de João na prefeitura não foi uma aclamação, como se imaginava que poderia ser. Pelo contrário. A campanha precisou recorrer aos bolsonaristas, atacando o PT num apertado segundo turno, para conquistar a prefeitura. Hoje, o prefeito é a principal esperança de retomada e renovação do partido. Tem feito um bom trabalho e é aprovado, mas ainda não tem idade para ser candidato a governador. E isso tem sido visto como oportunidade para outras forças dentro da sigla.

Independente do escolhido, o PSB vai vender isso como a "escolha unânime, desde todo o sempre", embora se saiba que não é. O nome que for para a urna, na verdade, deverá definir muito sobre o futuro do PSB em Pernambuco, vencendo a eleição ou não.

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